Parte das indústrias processadoras de carnes de frango e suínos do Brasil precisará comprar mais milho no exterior a partir do mês que vem, diante do alto patamar de preços internos da principal matéria-prima do setor. A estimativa é da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e de outros participantes do mercado.
A importação poderá ter origem na Argentina e Paraguai, tradicionais fornecedores quando a oferta aperta no Brasil, ou mesmo nos Estados Unidos.
O preço do milho no mercado físico superou R$ 60,00 a saca de 60 kg na semana passada, maior cotação nominal da história, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), após o País começar o ano com baixos estoques depois das exportações recordes em 2019.
“Monitoramos o mercado e o termômetro nos indica a necessidade de importação já em maio. A primeira safra (2019/2020) foi muito ruim por causa da seca, a oferta está baixa e os preços muito elevados”, disse o presidente da ABPA, Francisco Turra.
No momento, o País colhe a primeira safra de milho, mas uma frustração pelo clima no Rio Grande do Sul ajudou a sustentar os preços no Brasil, que terá de aguardar a produção da segunda safra chegar ao mercado, somente em meados de junho.
A produção do cereal de inverno é a maior do País, respondendo por 75% da colheita total, estimada em cerca de 100 milhões de toneladas.
O milho importado da Argentina e Paraguai chega a ter preços competitivos para algumas indústrias do Sul do Brasil, em relação ao produto vindo do Centro-Oeste, devido ao custo de transporte, mesmo com o câmbio oscilando a níveis recordes.
A divisa norte-americana acompanha um movimento de alta global, diante de evidências crescentes de que o mundo já está em uma recessão de grande magnitude. O dólar à vista fechou cotado a R$ 5,2918 para venda e tem oscilado perto de máximas históricas em sessões anteriores.
Turra explicou que, como as moedas da Argentina e Paraguai estão ainda mais fracas que o real em relação ao dólar, o preço do milho se manteve atraente para o comprador brasileiro, que já importou o grão em anos anteriores.
“(Com este câmbio) é complicado importar milho dos Estados Unidos. As indústrias do Nordeste sempre precisam trazer alguns volumes de lá. Nesse ano ainda não fizeram, mas esta possibilidade não está descartada para breve, principalmente se a safrinha não vier cheia.”
O analista da consultoria Agrifatto, Yago Ferreira, alerta que o vencimento maio/20 do milho na Bolsa de Chicago atingiu US$ 3,28 dólares o bushel nesta segunda-feira, o que, segundo ele, representa R$ 40,60 por saca, cotação abaixo dos R$ 48,79 por saca que o cereal está sendo cotado na BM&F atualmente, para o vencimento maio.
“Isso por si só já justificaria o fato de que a importação deveria ser posta em pauta pelos consumidores internos”, disse Ferreira.
Ele ressaltou que a segunda safra de milho do Brasil, que está no campo, só chega ao mercado em meados de junho. Ainda que a produção seja boa, deixa um hiato de oferta e demanda entre abril e maio, em algumas regiões do país com baixa oferta na primeira safra.
Em linha com as estimativas do mercado, a Agrifatto espera que o País colha 73 milhões de toneladas na safrinha de 2019/2020, com queda de 3,31% em relação a safra passada.
O agrometeorologia da Rural Clima, Marco Antônio Santos, previu na segunda-feira que uma frente fria provocará chuvas em regiões produtoras do grão da safrinha no Brasil, neste mês, que devem beneficiar as lavouras.
Sobre a importação de milho norte-americano, o analista da Agrifatto considera a hipótese viável, pois a primeira safra brasileira, provavelmente, não será suficiente para reduzir o preço interno a ponto de deixá-lo mais competitivo que o milho que está nos estoques dos EUA.
“Com o problema de demanda nos EUA (quarentena e crise do petróleo), o esmagamento de milho tende a ter uma forte redução, ou seja, abre mais espaço para (a importação do) milho norte-americano”, afirmou Ferreira.
Compras externas
Somente no primeiro bimestre de 2020, as importações de milho do Brasil aumentaram cerca de 235% em relação ao mesmo período do ano passado, para 283.730 toneladas, com o Paraguai respondendo quase pela totalidade do cereal importado, segundo dados do Ministério da Agricultura.
A JBS, detentora da Seara, que atua nas áreas de aves e suínos, foi uma das companhias do setor de carnes que contribuiu para a aquisição deste montante.
A empresa informou à Reuters que negociou cerca de 100.000 toneladas de milho argentino com escala de recebimento em três cargos mensais, sendo o terceiro previsto para maio de 2020. “Os altos custos do milho brasileiro verificados nos últimos meses têm exigido a adoção de medidas alternativas de aquisição do cereal no mercado externo.”
A decisão da JBS está baseada na melhor competitividade apresentada na importação do cereal argentino em relação ao custo atual do grão no Brasil, acrescentou a empresa em nota.
Além das 100.000 toneladas que chegarão para a JBS até maio, outras 100.000 toneladas foram importadas pela companhia anteriormente e estavam previstas para chegarem ao País até março, disse uma fonte com conhecimento sobre o assunto, sob condição de anonimato.
A BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, ainda tem mantido as negociações de compra de forma regular e não houve quebra no fornecimento de insumos no Brasil, segundo manifestação da empresa na última semana.
Apesar de não ter optado pela importação neste ano, a BRF não descarta totalmente esta possibilidade. Monitora constantemente as condições de preço do mercado e pode optar pelo o que for mais competitivo para a empresa, disse à Reuters outra fonte que não quis se identificar.
Reuters