Pandemia e queda do petróleo vão reduzir exportações

O impacto negativo resultante do avanço do Coronavírus e da queda do preço do petróleo deve reduzir as exportações brasileiras em 2020, encolhendo também o superávit comercial projetado inicialmente para este ano.

Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior, lembra que já se esperava para 2020 uma queda de superávit em relação ao saldo positivo de US$ 48 bilhões do ano passado. Com o agravamento do cenário internacional, a queda deve ser ainda maior que a projetada no início do ano.

José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), diz que não descarta a possibilidade de déficit comercial em 2020, caso a crise se estenda além do primeiro semestre. A AEB já projetava superávit considerado conservador para este ano, de US$ 26 bilhões.

As estimativas ainda não foram revisadas porque a duração da crise e a magnitude de seus efeitos sobre preços e volumes de exportação são consideradas ainda incertas. A mais recente edição do Focus, boletim divulgado pelo Banco Central com as expectativas de mercado, indica projeção de US$ 36.4 bilhões de superávit comercial para 2020, na mediana.

A exportação de commodities, diz Barral, deve sofrer forte impacto neste ano, em razão de queda tanto de preços quanto de volume. “A quebra do acordo entre Rússia e Arábia Saudita traz um risco adicional ao quadro, dada a participação cada vez maior do petróleo na pauta de exportação brasileira.”

Segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), de 2009 para o ano passado, a participação de soja, petróleo e minério de ferro, as três principais commodities exportadas pelo Brasil, subiu, no conjunto, de 22,12% para 32,37% do valor total embarcado.

A fatia do petróleo avançou em velocidade maior que os outros dois produtos, de 5,99% para 10,74% do embarque total em igual período. O dado, diz Barral, representa importante diferença entre os possíveis efeitos da desvalorização cambial na década de 80 e os de hoje. Naquele período, a desvalorização alavancou as vendas externas, segundo ele, mas a representatividade das commodities na exportação era muito menor.

Castro tem opinião semelhante. Ele destaca que os dados da balança da primeira semana de março já mostram queda de preços de exportação de petróleo e soja, e tudo indica que isso vai se intensificar. “O minério de ferro ainda apresenta aumento de preços, mas as quantidades deverão ser afetadas”, observa Castro.

Mesmo em relação aos manufaturados, o câmbio não deve contribuir tão positivamente, diz Barral. Segundo ele, num ambiente de grande oscilação, é muito difícil ao exportador estabelecer os preços porque não se sabe até quando o nível do dólar se sustentará.

Barral lembra que em produtos com ciclos de produção mais longos esse problema se acentua. “O exportador vai estabelecer o preço dele para daqui a um ano com dólar a R$ 4,40 ou R$ 4,50 e não R$ 4,80 ou mais, porque o risco é muito grande.”

Com a queda de demanda esperada, afirma Castro, haverá também aumento de concorrência no fornecimento de produtos industrializados, com natural redução de preços. Além disso, ressalta ele, os mercados tradicionais do Brasil para produtos manufaturados, os países da América Latina, também são exportadores de commodities.

Ou seja, serão da mesma forma afetados pelo cenário global de queda de preços e volumes e terão menor capacidade para absorver importações. E para a Argentina, mais especificamente, não há perspectiva de recuperação econômica a curto prazo, algo que fica mais dificultado ainda com o atual agravamento do cenário internacional.

A queda nas importações, porém, dependendo da magnitude, poderão neutralizar o efeito de redução das exportações no saldo comercial do ano.

O economista Silvio Campos Neto, da Tendências, informa que a consultoria revisou os dados de balança na semana passada. As exportações foram reavaliadas em razão do Coronavírus, mas ainda não está contemplada a queda de preços de petróleo desta semana.

Segundo Campos Neto, o choque de demanda em razão do Coronavírus deve afetar volumes embarcados e principalmente reduzir preços de exportação. Com isso, a projeção de exportação da consultoria para 2020 caiu de US$ 222.8 bilhões para US$ 218.8 bilhões.

As importações, explica o economista, também foram revisadas, principalmente porque indicadores têm revelado recuperação econômica mais lenta este ano do que inicialmente se esperava.

A projeção da Tendências de elevação de PIB para o ano foi reduzida de 2,10% para 1,60%. “A demanda doméstica por compras externas pode sofrer impacto adicional em razão da desvalorização cambial”, diz Campos Neto.

A estimativa das importações brasileiras para o ano foi reduzida de US$ 185.4 bilhões para US$ 180.7 bilhões. Como houve redução nas duas pontas e um pouco maior no caso das importações, afirma Campos Neto, a estimativa de superávit comercial para este ano aumentou, de US$ 37.4 bilhões para US$ 38.1 bilhões.

 

Valor Econômico

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