Apesar da atuação do BC, dólar fecha em alta com tensão eleitoral e crise argentina

O dólar comercial fechou em alta de 0,78%, mas longe da máxima do dia, cotado a R$ 4,1443 para compra e a R$ 4,1463 para venda, com máxima a R$ 4,2155 e mínima a R$ 4,1197.

O mercado desacelerou a alta após registrar a máxima de R$ 4,2155 no começo da tarde. A turbulência nos mercados emergentes serviu de pano de fundo para o novo solavanco contra o real, que já enfrenta uma postura mais cautelosa dos investidores diante de incertezas com a política no Brasil.

Na máxima do dia, a moeda ficou a alguns centavos da maior cotação, em termos nominais (R$ 4,2484 no dia 24/09/2015), registrada no Plano Real.

A disparada do dólar para acima de R$ 4,20 obrigou o Banco Central a atuar extraordinariamente no mercado de câmbio, o que aliviou a pressão de alta, mas não impediu que a moeda norte-americana renovasse a segunda maior cotação do Plano Real.

Uma combinação de cautela com o quadro eleitoral e preocupações com a situação da Argentina puxaram a moeda norte-americana em uma sessão extremamente volátil.

“Não havia nenhuma demanda genuína pelo dólar a R$ 4,20, era apenas efeito manada”, disse o diretor de Tesouraria de um grande banco estrangeiro.

O BC, percebendo o movimento, não perdeu tempo. Anunciou leilão de até 30.000 contratos de swap cambial tradicional, equivalente a US$ 1.5 bilhão, mas só conseguiu completar a venda em uma segunda oferta, minutos depois.

Essa atuação extraordinária, no entanto, pode não ter passado dum movimento pontual, sem necessariamente se manter nos próximos pregões, avaliaram especialistas ouvidos pela Reuters.

A última vez que o BC tinha feito oferta adicional de swaps,-numa atuação conjunta com o Tesouro Nacional, foi em junho deste ano, depois que a greve dos caminhoneiros acabou levando a uma reprecificação dos ativos.

A autoridade já havia concluído mais cedo a rolagem do lote de swaps que vence em setembro, totalizando US$ 5.255 bilhões.

Em outubro, segundo dados do site do BC, vencem US$ 9.801 bilhões em contratos de swap e há uma expectativa no mercado de que o BC, a exemplo do que fez com a linha (venda de dólares com compromisso de recompra), também possa anunciar após o fechamento do mercado sua intenção de rolar integralmente esse volume, para evitar qualquer especulação.

Na terça-feira, o BC anunciou leilão de US$ 2.15 bilhões para sexta-feira para rolagem dos contratos que vencem em 5 de setembro.

O mercado brasileiro captou hoje o turbilhão que atingiu os emergentes, resultado do fortalecimento global do dólar e da piora das crises na Turquia e na Argentina.

Apesar dos solavancos hoje, o economista-chefe do banco Safra, Carlos Kawall, não vê riscos relevantes de que as crises na Argentina e na Turquia se estendam para o Brasil. “É preciso separar o movimento de moedas emergentes que estão refletindo o quadro de dólar mais forte, que vem desde abril. Isso tem um impacto nas emergentes como um todo”, disse o especialista. “Num outro extremo, estão os países com situação complicada com balanço de transações correntes e déficit elevado. É o caso da Argentina que teve uma desvalorização de 50% no peso em 2018”, ressaltou.

Para Kawall, a dinâmica do mercado brasileiro tem sido ditada nas últimas semanas pelas incertezas eleitorais. Não se trata do mesmo problema de Turquia e Argentina, mas o fator eleitoral pesa no mercado principalmente diante da necessidade de ajustes fiscais. “Eu não vejo o Brasil indo para caminho de Argentina e Turquia”, disse o especialista, ao destacar também os índices de inflação ainda contidos no Brasil.

“A Argentina foi a cereja do bolo hoje”, disse o diretor de operações da Mirae, Pablo Spyer, ao comentar o cenário nervoso desta quinta-feira.

Embora os especialistas comentem que o quadro doméstico é diferente do argentino, por exemplo, com nossas contas externas muito mais saudáveis, o mercado acaba promovendo ajustes generalizados em suas carteiras de emergentes quando há preocupação em algum dos lugares em que investem.

A pesquisa DataPoder360 divulgada de madrugada não trouxe um cenário muito diferente dos outros levantamentos, com Lula liderando a disputa e Geraldo Alckmin (PSDB), o candidato do mercado, sem decolar.

Mas mostrou que se Lula tiver que abrir mão da candidatura para Fernando Haddad, este teria potencial de receber 8% de votos “com certeza”, enquanto 26% “poderiam votar” nele no caso de ser apoiado pelo ex-presidente. Ou seja, seriam grandes as chances de um segundo turno com a presença de um petista.

“Se esses números forem reais, a chance do candidato do PT chegar ao segundo turno são grandes. Triste perspectiva para o mercado financeiro, que trabalha em um ambiente de alta volatilidade, pressão e especulação com o atual cenário eleitoral”, indicou a Advanced Corretora em comentário.

É por essa razão que a possibilidade de julgamento na sexta-feira pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) da participação de Lula na propaganda de rádio e televisão está sendo acompanhada de perto pelos investidores e ajuda a trazer cautela nos negócios.

O TSE também pode vir a decidir na sexta-feira sobre as impugnações ao registro de candidatura de Lula. O petista está preso desde abril no âmbito da Operação Lava Jato.

A pauta da sessão do TSE de sexta-feira divulgada nesta quinta-feira, no entanto, não prevê qualquer processo ligado à candidatura de Lula, embora possa ser alterada até uma hora antes do início previsto para a reunião, que é 14h30 de sexta-feira. Quando a sessão foi convocada, na quarta-feira, no entanto, havia a expectativa do julgamento de Lula.

Fonte ouvida pela Reuters disse que houve uma avaliação de que julgar o registro do Lula no dia seguinte ao prazo de apresentação da defesa dele às impugnações, nesta quinta-feira, poderia passar a impressão de pressa.

No mercado internacional, por volta das 18h (Horário de Brasília), o Dollar Index estava em alta de 0,19%, cotado aos 94,64 pontos, enquanto o euro estava em baixa de 0,34%, cotado a US$ 1,1667.

Argentina

O Banco Central da República Argentina (BCRA) elevou a taxa de sete dias das Lelics, que recentemente adotou como juro básico da economia, em 15%, para 60%, em reunião extraordinária.

Segundo a autoridade monetária, a decisão é “uma reposta à conjuntura cambial atual e ante o risco de que isso implique um maior impacto sobre a inflação doméstica”. A autoridade se comprometeu ainda em não diminuir os juros pelo menos até dezembro.

O BC argentino também elevou o compulsório bancário para os depósitos em peso em 5%. Segundo a autoridade, aumentar o controle de liquidez segue sendo fundamental para reforçar o compromisso anti-inflacionário.

Ontem (29), o presidente da Argentina, Mauricio Macri, já havia solicitado ao Fundo Monetário Internacional (FMI) a liberação antecipada de recursos da linha stand-by de US$ 50 bilhões aprovada para o país.

Juros futuros sobem com escalada do dólar e risco de alta da Selic

A disparada do dólar trouxe de volta às mesas de operação a discussão sobre a necessidade de o Banco Central voltar a subir os juros ainda este ano. Embora economistas e parte do mercado acreditem que o BC não tomará nenhuma atitude até ter uma maior definição do panorama político brasileiro, os juros futuros já reagiram a esse risco. Hoje, a curva de juros fechou a sessão precificando um aumento de 0,31% na reunião de setembro do Comitê de Política Monetária (COPOM), 0,51% na de outubro, e mais 0,60% na de dezembro. Movimento que ganha força na medida em que o dólar sobe.

Para Marcos De Callis, estrategista de investimento da asset do Banco Votorantim, a permanência do dólar acima dos R$ 4,00 reforça a dúvida sobre qual deve ser a postura da autoridade monetária nas próximas reuniões. “Com o câmbio na faixa de R$ 4,20, dificilmente os modelos do BC não vão apontar para inflação acima da meta em 2019”, disse.

Já para Jankiel Santos, economista-chefe do Haitong Banco de Investimento do Brasil, o comportamento dos juros de curto prazo reflete a dicotomia entre a visão do mercado e a visão dos economistas. Segundo ele, hoje os investidores colocam prêmio nos contratos por conta das incertezas decorrentes do processo eleitoral, mas o BC não deve mudar o rumo da estratégia da política monetária antes da escolha popular do próximo presidente.

“Claro que quando o BC colocar o dólar a R$ 4,20 nas suas simulações, as projeções de inflação devem mudar. Mas o efeito deve ser de curto prazo, focado em 2018, e por isso ele vai entender como consequência da incerteza eleitoral”, disse.

O economista-chefe para a América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, também não vê motivação para alta de Selic nos próximos meses. “Não vejo razão para entrar em pânico. O BC deve entender como saudável que o câmbio reflita a incerteza política”, disse.

O movimento recente do câmbio, que tem gerado pressão na curva de juros, está ligado ao panorama político local, com o fortalecimento do PT nas pesquisas eleitorais, e ao exterior. Hoje, o dia começou com os ativos já pressionados depois da divulgação da pesquisa do DataPoder360, que indica um potencial de transferência de votos do ex-presidente Lula para Fernando Haddad, ambos do PT, de 34%. O índice foi obtido pela soma dos entrevistados que disseram que votariam com certeza (8%) e os que poderiam votar (26%) em Haddad. Esse potencial de transferência de votos tem preocupado os agentes do mercado.

Argentina

Foi apenas no meio da manhã, no entanto, que o clima piorou na esteira do noticiário envolvendo a Argentina. O Banco Central do país sul-americano aumentou em 15% o juro básico, passando a taxa para 60%. A decisão levou à forte depreciação do peso e puxou para baixo os demais emergentes.

O evento influenciou os ativos brasileiros por três motivos, segundo Ramos, do Goldman. O caso do país vizinho mostra como a estratégia de ajuste fiscal gradual tem um risco muito significativo e esse tem sido o ritmo de ajustes no Brasil. “Fica como lição os riscos desse processo”, afirma. Além disso, a Argentina é hoje um parceiro comercial relativamente importante e essa turbulência deve limitar o potencial de exportação das mercadorias brasileiras e, por fim, contribuiu para deteriorar sentimento em relação aos mercados emergentes.

Para De Callis, do Votorantim, a reação dos demais mercados emergentes reflete a vulnerabilidade de cada país ao cenário de menor liquidez global. “Os países que são principal alvo de preocupação do mercado são aqueles com alguma fragilidade no setor externo, seja déficit de conta corrente maior, dependência de fluxo de capital e rolagem de dívida no mercado internacional. O Brasil não está mal nessa fotografia, mas tem outras fragilidades que acabam preocupando o mercado, como a fiscal”, disse.

Essas dúvidas acabam sendo aumentadas com a indefinição política por aqui. Callis compara o Brasil com a Argentina e lembra que, no par sul-americano, um presidente reformista foi eleito e não conseguiu aprovar as reformas necessárias, o que acabou levando o país para a situação atual. No Brasil, o caso pode ser semelhante.

“Sabemos o que o país precisa fazer, mas isso precisa acontecer. Se depois das eleições o presidente conseguir passar as reformas e tiver responsabilidade fiscal, o Brasil fica blindado e vai passar melhor pelo cenário de baixa liquidez global. Se não houver essa execução, vamos no mesmo caminho da Argentina.”

Ao fim da sessão regular, às 16h, o DI janeiro/2020 terminou com taxa de 8,79% (8,45% no ajuste anterior), o DI janeiro/2021 estava cotado a 9,95% (9,59% ano ajuste anterior) e o DI janeiro/2025 fechou com taxa de 12,35% (12,01% no ajuste anterior).

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