Cansados de ficar à mercê da Rumo, concessionária que opera cerca de 13.000 quilômetros de malha ferroviária no país, os governos do Paraná e de Mato Grosso do Sul apresentarão oficialmente, na semana que vem, uma proposta para a construção de um novo ramal para ligar grandes polos de grãos desses estados ao porto de Paranaguá, o segundo maior em movimentação de cargas agrícolas no país.
Com os processos burocráticos de concessão já adiantados, autoridades locais e portuárias chegarão a São Paulo na terça-feira para detalhar o projeto a interessados em ativos de infraestrutura no Brasil, notadamente fundos de investidores nacionais e estrangeiros. A ideia é atraí-los para duas concessões: o trecho entre Dourados e Guarapuava e o de Guarapuava a Paranaguá (ver mapa).
No total serão mil quilômetros de trilhos sob nova concessão, a maior parte dentro do Paraná, a um custo inicial estimado em R$ 10 bilhões.
A ferrovia atenderia integralmente o agronegócio. Potencialmente, transportaria não apenas a carga de parte do Paraná e do Mato Grosso do Sul, mas também de produtores paraguaios. Dessa forma, o investimento elevaria o transporte ferroviário de grãos da região das atuais 400.000 toneladas ao ano para mais de 14 milhões de toneladas, transportadas hoje por rodovia. A economia de frete seria da ordem de 30%.
“É uma ferrovia importante, tendo em vista que o volume de grãos movimentado pela Rumo vem caindo por falta de manutenção”, disse ao Valor o presidente da Ferroeste, João Araújo.
Concedida pelo governo federal em 1989, por 90 anos, a Ferroeste, que tem o governo do Paraná como maior acionista, hoje opera apenas o trecho de Cascavel a Guarapuava. De lá até o porto de Paranaguá, seus vagões seguem pelos trilhos da Rumo, por meio do chamado direito de passagem, pelo qual a Rumo permite, conforme a grade de movimentação de sua carga, que a concorrência usufrua da infraestrutura.
“Condições operacionais ruins e uma geografia difícil, permeada de montanhas e penhascos, faz a velocidade média dos trens despencar no trecho final para o porto de 27 km/h para 11 km/h a partir de Guarapuava”, disse Araújo. A falta de ferrovias alternativas até o porto também arranca críticas de tradings.
Segundo Luiz Henrique Dividino, presidente da Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (APPA), a nova extensão férrea pretendida é crucial para potencializar os investimentos realizados no porto nos últimos anos e elevar a competitividade do agronegócio no Sul.
“Estamos com o gigante verde e amarelo algemado no caminhão”, disse Dividino. “Esforçamos-nos para acabar com fila de caminhão, para reduzir a espera de navio e em infraestrutura portuária para, no final, conseguirmos uma redução de custo de US$ 2,00 por tonelada. Só que, se falta um caminhão no interior, o custo de transporte da tonelada (de grãos) sobe US$ 10,00 num único dia. Não tem sentido”.
Dividino, que estará em São Paulo na semana que vem, cita o descompasso entre os modais nos portos do Sudeste: “Em Santos, 40% da carga (agrícola) chega por trem. Em São Francisco do Sul (SC) são 50%. Em Paranaguá, somente 17%”.
As concessões são vistas como importantes também para absorver a oferta do oeste do Paraná, uma região ainda desatendida pelos trilhos e onde estão as taxas mais altas de produtividade no campo. “A Coamo, maior cooperativa do País (sediada em Campo Mourão), ainda manda 100% da produção ao porto de caminhão”, disse Araújo, da Ferroeste.
Aos investidores, as autoridades vão explicar os benefícios do negócio. Idealmente, um único investidor assumiria os dois trechos. Por razões práticas, os lotes serão licitados separadamente. O trecho operado pela Ferroeste seria repassado ao novo operador, que assumiria de Dourados a Guarapuava.
O primeiro passo é o lançamento de um Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI), edital público de chamamento destinado a empresas interessadas no Evetea, o estudo técnico, econômico e ambiental para a construção e exploração de serviços ferroviários. A expectativa é que o edital saia só em 2019.
A concessão ferroviária até Paranaguá chegou a constar dos dois primeiros programas de investimentos em logística do governo federal. No terceiro, foi substituído pela Ferrogrão, projeto capitaneado pelas tradings para escoar a safra do Centro-Oeste pelo Norte.
Rumo rebate críticas
Procurada pelo Valor, a Rumo rebateu, em comunicado, as críticas que recebeu da Ferroeste: “Desde a fusão com a ALL, a Rumo vem realizando um trabalho de revitalização e expansão logística de grande impacto em suas malhas. Já foram investidos R$ 2 bilhões somente na Malha Sul, com a aquisição de material rodante e melhorias significativas na via permanente”.
Esses investimentos permitiram um crescimento de 60% no volume de grãos transportado até o Porto de Paranaguá nos três primeiros trimestres de 2017 em comparação com o mesmo período de 2016. Entre 2015 e 2016, houve uma redução de 35% no número de acidentes na Malha Sul. Portanto, a operação ferroviária da Rumo na região Sul do País não se encontra defasada.
Existe uma restrição de capacidade no trecho Guarapuava-Ponta Grossa. O projeto de recapacitação desse trecho prevê a injeção de R$ 1.7 bilhão por parte da Rumo. É importante ressaltar, contudo, que responsabilidade do transporte entre Cascavel e Guarapuava é da Ferroeste, que mantém uma frota de locomotivas e vagões obsoleta, inviabilizando o atendimento da demanda da região.
Além disso, o projeto da construção de uma ferrovia ao lado de uma já existente se mostra inviável. Levá-lo adiante demandaria grandes investimentos e um longo tempo de construção, além de entraves para obtenção de licenciamento ambiental.
A Rumo já tem um plano robusto de expansão de sua malha, que permitirá atender toda a demanda do Paraná com prazo e custos menores. A companhia segue investindo na operação ferroviária, criando novos empregos, gerando desenvolvimento, garantindo o escoamento da safra agrícola e colaborando para a Balança Comercial”.
Fonte: Valor Econômico