Por Fernando Lamas *
Não existe qualquer tipo de dúvida que os desafios postos à agricultura somente serão superados com a adoção de tecnologias modernas. Essas tecnologias deverão garantir a segurança alimentar em perfeita sintonia com a conservação ambiental.
Quando se fala em segurança alimentar refere-se à disponibilidade de alimentos, produzidos em bases sustentáveis, levando em conta a qualidade do alimento e como esse alimento produzido é essencial. A qualidade terá cada vez mais peso na hora do consumidor decidir sobre o que ele vai consumir. Também deve-se considerar, além da qualidade intrínseca do alimento, a forma como ele foi produzido, ou seja, a rastreabilidade é algo que não é mais fictício.
A tecnologia é fundamental para o aumento da produção, via aumento da produtividade, e para se fazer a gestão de todos os processos envolvidos com a produção de um produto alimentício. E isso independente da escala de produção.
Tecnologia não deve ser confundida com algo fora da realidade. Na agricultura, a época de semeadura, a quantidade de sementes por unidade de área, a população de plantas, dentre vários outros, são exemplos de itens que interferem na produtividade, na qualidade do produto e no custo de produção. São tecnologias, simples, às vezes de custo zero.
O mundo passa por um momento cujas transformações se dão em velocidade muito alta e isso devido, dentre outras coisas, à capacidade de geração de conhecimento pelas instituições de pesquisa, à mobilidade e conectividade das pessoas. Muitos dos conhecimentos gerados em um centro de pesquisa rapidamente são transformados em tecnologias e incorporados aos sistemas de produção, constituindo-se em inovação de impacto positivo.
Resultados de pesquisa realizada na metade Sul de Mato Grosso do Sul e de São Paulo e na metade Norte do Paraná, pelo Rally da Safra (2017), apontam resultados preocupantes do ponto de vista de tecnologia agrícola. Na amostra realizada, em 83% dos casos não foi constatada a existência de terraços; e em 63% dos casos, a semeadura de soja e milho não era realizada em nível.
Práticas de controle de erosão, como o plantio em nível e uso de terraços, são tecnologias muito importantes quando se pensa em sustentabilidade da produção. Essas tecnologias são antigas, de custo relativamente baixo e proporcionam resultados extremamente importantes, pois controlam a erosão dos solos agrícolas, grave problema da agricultura brasileira.
Controlar efetivamente a erosão é uma das estratégias para manter o potencial produtivo do solo. E para que a agricultura possa continuar desempenhando seu papel, produzindo alimentos, fibras e energia, é fundamental a adoção de tecnologias modernas, que assegurem o aumento da produtividade, a redução dos custos de produção e a oferta de alimentos com qualidade.
As instituições de pesquisa buscam continuamente desenvolver processos e/ou produtos que possam contribuir para a melhoria da produtividade e da qualidade dos alimentos, para a redução dos custos de produção, para o aprimoramento dos processos de gestão. Esses são cada vez mais necessários quando se pensa na melhoria do processo como um todo.
Segundo dados gerados a partir Censo Agropecuário do IBGE, em 2006, a tecnologia foi a responsável por quase 70% do crescimento da produção de grãos, enquanto em 1996, ela era a responsável por 50% do aumento da produção de grãos.
Esses dados não deixam a menor dúvida sobre a importância da tecnologia no aumento da produção e isso se dá, fundamentalmente, por meio do aumento da produtividade.
Ao mesmo tempo em que a tecnologia é fundamental para o aumento da produção, é preciso que os usuários tenham conhecimentos para que possam protegê-las. A vida útil de uma tecnologia pode ser muita curta, se ela não for utilizada de forma adequada.
No Brasil, de acordo com dados publicados recentemente, vem crescendo o uso de herbicidas em áreas cultivadas com soja resistente ao glifosato. Em comparação ao ano de 2015/16, houve um crescimento de 55% no uso de herbicidas complementares ao glifosato, na cultura da soja no ciclo agrícola de 2016/17.
Esses dados revelam que alguma coisa não está certa. É provável que a tecnologia não está sendo utilizada de forma adequada, o que tem contribuído para o surgimento de espécies de plantas daninhas resistentes a vários herbicidas.
A tecnologia é a grande aliada do homem na produção agrícola. No entanto, para que possa ser utilizada de forma adequada, em beneficio do homem, cada vez mais se faz necessário o conhecimento. Somente pelo conhecimento seremos capazes de utilizar de forma correta as tecnologias que são disponibilizadas a todo instante.
Hoje, já temos plantadeiras que são “autopropelidas”, ou seja, não precisam mais do trator para tracioná-las. As sementes, insumo da maior significância para o campo, estão sendo comercializadas tendo como referencial de mensuração não mais “saco”, mas sim o número de sementes.
Poderíamos, aqui, enumerar centenas de tecnologias, sem esquecer que estamos na era da agricultura digital. Em recente evento realizado no município de Não-Me-Toque, no Rio Grande do Sul, sobre agricultura de precisão, temas ligados à agricultura digital tiveram destaque.
“Como a transformação digital vai afetar a agricultura?” foi um dos temas do 11º Congresso Brasileiro de Agroinformática (SBIAgro 2017), realizado de dois a seis de outubro, na Universidade Estadual de Campinas (SP).
Para que possa ser disponibilizado para a população alimentos, fibras e energia em quantidade e com a qualidade exigida, serão necessários sistemas de produção integrados e dinâmicos, fundamentados em ciência e tecnologia, tendo como fundamento a economia de escopo.
Estamos na era da quarta revolução tecnológica na agricultura: a agricultura 4.0, baseada em um forte conteúdo digital e conectada.
Felizmente, temos muitas tecnologias disponíveis e em desenvolvimento. São tecnologias que, com certeza, irão contribuir para a melhoria de todo o processo de produção agrícola. No entanto, não podemos de forma alguma desconsiderar aquelas tecnologias, tidas como antigas por alguns, mas indispensáveis para assegurar níveis de produtividade dentro dos padrões almejados, especialmente quando estiver em jogo os recursos não renováveis, como é o solo.
Dadas as dimensões e as diversidades existentes no Brasil, não podemos deixar de considerar os esforços necessários para que todos tenham acesso às tecnologias disponíveis.
* Fernando Mendes Lamas é engenheiro agrônomo, pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste, mestre em Fitotecnia (Produção Vegetal – Manejo do Algodoeiro) e doutor em Agronomia (Produção Vegetal – Reguladores de Crescimento)
Fonte: Embrapa Agropecuária Oeste (MS)