Produtores rurais de Sacramento, em Minas Gerais, Marli Leite e o marido, José Leite, percorreram um longo caminho até conquistarem a regularização para venda do queijo artesanal feito a partir de leite cru. Da produção informal na fazenda da família, passando pela habilitação sanitária até vencer o Prêmio Superouro, em um festival na França, em junho passado, foram exatamente 25 anos.
“Começamos a produzir queijo artesanal em 1992, mas foi somente em 1998 que começamos o primeiro processo em busca da habilitação sanitária. Na época, quase ninguém tinha conhecimento sobre a legislação”, lembra a produtora, conhecida em sua cidade, Sacramento, em Minas Gerais, como a “Mulher do Queijo”.
Entre 2002 e 2006, a Fazenda Caxambu pertencente à família Leite passou por um rigoroso processo de adequação da queijaria, principalmente a partir das boas práticas em campo preconizadas pelas instituições representativas do setor: Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas (Emater-MG), Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) e Instituto Mineiro da Agropecuária (IMA).
“Foi uma luta intensa, uma troca de conhecimentos entre todos os envolvidos, que resultou na conquista da nossa habilitação sanitária em 2006”, relata a produtora, em entrevista à equipe SNA/RJ.
Das 17 peças iniciais por dia, hoje, a Fazenda Caxambu produz, em média, 50: “Ainda é difícil elevarmos esse número, porque o queijo minas artesanal feito de leite cru, que é nosso caso, exige todo um processo de maturação até estar em conformidade com a legislação para ser comercializado. Mas nossa meta é chegar a 200 peças diárias”.
Após a superpremiação na França, que trouxe visibilidade para a propriedade da família Leite em todo o Brasil, a queijaria passou a vender seus produtos para boutiques de queijo da capital de Minas, Belo Horizonte, além dos Estados de Santa Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Rio Grande do Sul e do Norte, e Espírito Santo.
“Gostaria que esse prêmio internacional pudesse ajudar a todos os produtores de queijo artesanal de Minas e do país, melhorar nossa legislação e oferecer maior visibilidade do Brasil lá fora”, comenta a “Mulher do Queijo”.
LEGISLAÇÃO
Atualmente em Minas Gerais, a legislação estadual que determina as regras sanitárias para a produção de queijo artesanal de leite cru é mais conhecida, o que tem reduzido o tempo de habilitação no maior Estado produtor de queijo do Brasil. Apesar dessa percepção, em números, a médica veterinária e gerente de Inspeção do Instituto Mineiro da Agropecuária, Patrícia Barros Reis Fonseca, diz não ser possível estimar uma média de tempo entre o pedido e a liberação do produto para fins comerciais, dentro da região.
“Podemos apontar quais são os principais erros cometidos, tais como construção das queijarias sem aprovação prévia de um projeto, o que pode fazer com que o produtor tenha de readaptar as instalações ou até mesmo reconstruí-las; falta de profissionais da área que saibam elaborar um projeto; além das falhas de documentação”, enumera Patrícia em entrevista à equipe SNA/RJ.
Outro entrave apontado pela gerente é a inexistência da unificação de uma legislação brasileira: “Temos uma legislação em Minas e outra vigente fora do Estado que se diferenciam, dificultando a comercialização do queijo artesanal para outras fronteiras. Precisamos unificar tudo em um documento só”.
CONSULTA PÚBLICA
O IMA, em parceria com a Emater e Epamig – os três órgãos vinculados à Secretaria Estadual de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa) – anunciou, durante o 1º Festival do Queijo Minas Artesanal de Leite Cru, realizado entre os dias 28 e 30 de julho, em Belo Horizonte, a proposta de promover uma consulta pública sobre a legislação vigente.
“O documento, já elaborado com o aval do Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), também deve contar com a opinião do setor produtivo de queijo artesanal”, defende Patrícia.
No festival em BH, foi repassada uma estimativa (não validada oficialmente pelo IMA e por outros órgãos competentes) de que, só em Minas Gerais, existam em torno de cinco mil produtores de queijo. Mas conforme a gerente técnica, apenas 278 queijarias são cadastradas e seis registradas pelo Instituto.
“Queijos provenientes de estabelecimentos não habilitados podem ser apreendidos no trânsito e nos pontos de venda”, alerta Patrícia.
HABILITAÇÃO SANITÁRIA
Ela explica que a habilitação sanitária é uma obrigação legal de qualquer produtor de Produtos de Origem Animal (POA): “Já o processo chamado de ‘certificação’ é complementar, não obrigatório, e está mais relacionado à agregação de valor ao produto”.
De acordo com a gerente, essa habilitação do queijo minas artesanal pode ser feita de duas formas: pelo cadastro, com base na Lei Estadual n° 20.549, Decreto Estadual n° 44.864/2008 e as exigências da Portaria IMA n° 818/2006; e pelo registro da queijaria, que considera as mesmas legislações anteriores, além da Portaria IMA n° 1.305/2013 e a Instrução Normativa do Mapa n° 30/2013. No primeiro caso, a venda se restringe a Minas Gerais; e o segundo, em conjunto, a todo o território nacional.
PASSO-A-PASSO
Para auxiliar o produtor de queijo artesanal em Minas, ainda não habilitado, Patrícia indica um passo-a-passo para obtenção do cadastro ou registro da queijaria, junto ao Instituto Mineiro da Agropecuária (IMA):
1º – Requerimento para vistoria do terreno;
2º – Aprovação do terreno;
3º – Apresentação dos documentos necessários para aprovação de projeto de construção, conforme relação descrita no site www.ima.mg.gov.br;
4º – Aprovação do projeto;
5º – Construção da queijaria, de acordo com o projeto aprovado pelo IMA;
6º – Solicitação do registro da queijaria, por meio da complementação da documentação e entrega da documentação para registro dos produtos.
7º – Por fim, diante de um parecer favorável do IMA, o produtor receberá a emissão do certificado de cadastro/registro da queijaria e dos produtos.
“Esse passo-a-passo serve apenas para a habilitação no IMA e não para todo o país. Isso porque cada órgão de inspeção (estadual) pode definir seu processo de registro/cadastro”, ressalta a gerente de inspeção do Instituto.
Por equipe SNA/RJ