O café é uma das bebidas mais populares do mundo, sendo consumida em 50 países. Mas quem são esses clientes, o que desejam e como satisfazê-los? De maneira geral, tem havido mudanças no perfil dos consumidores, relativas à qualidade do produto final e origem do café. Estas alterações representam novas exigências e mais oportunidades.
Essa nova conjuntura tem promovido uma revolução no campo, na manutenção dos esforços para a obtenção de bons índices de produtividade e no investimento em tecnologias visando à melhor qualidade. O cenário da cafeicultura passou — e continua passando — por uma grande transformação, que vem impondo alterações nos padrões de produção, na comercialização e no comportamento de todos os atores da cadeia produtiva.
Como parte das mudanças na conduta dos cafeicultores, está a necessidade de ampliação de sua visão relativa à atividade, nos âmbitos abordados a seguir:
- Seu território: histórico, localização em relação a centros consumidores, meios de transporte e comunicação, características da região que possam agregar valor ao produto final.
SUA PROPRIEDADE E SEU PATRIMÔNIO:
- Ambiente/clima: solo, exposição do terreno, reserva ambiental, presença de mananciais etc.
Instalações, máquinas, implementos e veículos. Com relação a esses itens, é recomendável a realização de um inventário periódico para dimensionamento das necessidades de ampliação, renovação ou reparos. - Seu entorno: aprofundar seu conhecimento sobre os vizinhos, fornecedores, parceiros comerciais e clientes, conservando o que é bom, contornando os problemas, e estabelecendo novas parcerias.
- Seus colaboradores: sejam eles empregados ou membros da família, suas competências e necessidades profissionais e pessoais devem ser analisadas para que seja constituída uma equipe de trabalho.
OPORTUNIDADES
Embora a cafeicultura brasileira esteja começando a emergir de um longo período de crise, em alguns setores foram identificadas algumas oportunidades que representaram evoluções importantes. Entre elas estão a expansão do processo de exportação do café torrado e moído; a exploração de nichos ou segmentos de mercado (gourmet, expresso, orgânico e certificado); o processo de diferenciação (selo, classificação, regionalização); o processo de integração (associações e união de cooperativas); o processo de profissionalização do produtor, entre outras.
QUALIDADE BRASILEIRA
Recentemente, tem-se observado um grande reconhecimento do valor do café brasileiro, principalmente do produto de boa qualidade. Uma das possíveis causas desta valorização é a conjuntura colombiana. A Colômbia tem sido, historicamente, fornecedora do café considerado de qualidade superior, com uma produção média de 11 a 12 milhões de sacas anuais. Em 2008/2009 e 2009/2010 viu sua produção ser reduzida para 8 a 9 milhões de sacas, passando de segundo produtor mundial para terceiro, sendo ultrapassada pela Indonésia.
A persistência dos fatores que provocaram a queda de produção colombiana, entre eles o ataque de pragas e doenças, gerou uma situação de pânico entre os agentes do mercado de café de qualidade, temerosos do risco de desabastecimento de um café com elevado conceito no mercado internacional; fama, em parte, decorrente de grandes e bem sucedidos esforços promocionais.
Aquela valorização também é consequência de um outro fato: durante um período de quinze anos, torrefadoras que testaram crescente introdução do café Robusta (Conilon) em suas ligas, experimentaram estagnação no consumo. Já as torrefadoras que privilegiaram os cafés finos, mantiveram taxas crescentes de consumo.
Finalmente, devemos considerar que, no ciclo de valorização das commodities no período/safras 2003–2009, o café Arábica não foi beneficiado. Já no ciclo atual de valorização das commodities, houve um alinhamento do café Arábica com o restante do conjunto do mercado, liderando-o com uma alta de 34% entre 2009 e 2010.
FERRAMENTAS PARA A MELHORIA DA QUALIDADE DA CAFEICULTURA
Entre as ferramentas para a melhoria da qualidade da cafeicultura estão o estabelecimento e adoção de programas de Boas Práticas em toda a cadeia produtiva: Programa de Boas Práticas Administrativas e Gerenciais; Agrícolas e de Processamento; Armazenamento e Transporte etc.
Boas práticas nada mais são que um conjunto de procedimentos simples e eficazes que possibilitam um ambiente de trabalho mais satisfatório, otimizando, assim, todo o processo produtivo. Sua realização possibilita a entrada do produto final nos mercados mais sensíveis a essa agregação de valor e com crescente exigência de qualidade.
CAFEICULTURA MODERNA
As boas práticas constituem o núcleo da moderna cafeicultura ao integrar, sob um só conceito, as exigências agronômicas e as do mercado. Um exemplo é o fato de que ao mesmo tempo em que reduzimos o custo de produção, por meio do uso racional de insumos, atendemos aos anseios do mercado comprador de adquirir produtos obtidos de maneira mais sustentável.
As boas práticas são, portanto, um componente de competitividade, que permitem ao produtor rural diferenciar seu produto dos outros ofertados, com todas as demais implicações econômicas (maior qualidade, acesso a novos
mercados e consolidação dos atuais, redução de custos etc).
CERTIFICAÇÃO
Outra ferramenta de melhoria da qualidade da cafeicultura é a certificação, que reúne um conjunto de atividades desenvolvidas por um organismo independente da relação comercial, com o objetivo de atestar — publicamente e por escrito — que determinado produto, processo ou serviço está em conformidade com os requisitos especificados.
Entre as vantagens da certificação está o processo de fidelização do comprador que se preocupa com a procedência, o respeito às normas de produção — ambientais e trabalhistas. A certificação pode atrair novos negócios, em um mundo que consome cada vez mais com base em critérios rígidos.
Existem vários tipos de certificação (Fairtrade, Orgânico, Utz kapeh, Rainforest Alliance etc) e a escolha dependerá de vários fatores, entre eles, a estrutura da propriedade e o mercado que se pretende atender. Em comum, as diversas certificações possuem as dimensões ambiental, social e econômica, com diferenças na frequência e intensidade de suas abordagens nos Códigos de Conduta que regem os diferentes sistemas.
Existem ainda alguns aspectos relevantes no conjunto de fatores que condicionam o sucesso e, portanto, a qualidade da cafeicultura, que precisam ser consideradas:
- O respeito às exigências climáticas da cultura, pois a história nos mostra o exemplo das severas geadas, às quais os cafeeiros e a própria atividade não sobrevivem.
- O respeito ao próprio clima, já que a história recente demonstra que áreas que não possuíam um regime de chuvas bem distribuídas, passaram a exigir a aplicação de recursos de irrigação, resultando em elevação de custos.
- A adoção criteriosa de medidas de conservação dos solos, pois conhecemos o legado de devastação decorrente do uso predatório dos mesmos.
- A proteção de nossas lavouras contra o ingresso de doenças e pragas exóticas. Prejuízos causados com a entrada da broca-do-café (1910) e da ferrugem (1970) repercutem sobre a cafeicultura até hoje.
- Não devemos, sobretudo, desafiar as leis de mercado, insistindo em aumentar o fornecimento de café de baixa qualidade ou de qualidade não diferenciada, diante de uma demanda mundial por um produto de boa qualidade.
Nosso aprendizado provém, portanto, dos erros e acertos do passado — e assim evoluímos. O futuro será escrito e dependerá, em grande parte, de nossas ações. Profissionais, produtores, trabalhadores rurais, agentes financeiros, empresas privadas, enfim, todos os atores envolvidos na missão de zelar pelo futuro da cafeicultura brasileira.
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Fonte: Revista A Lavoura – Edição nº 699/2014