Se tudo continuar como se espera, 2017 será bom para a agricultura. Ao menos dentro da porteira. A produtividade foi recuperada, o clima está favorável e a safra nacional de grãos deverá ser recorde.
O problema é que as incertezas que vêm de fora da porteira ainda são grandes para o setor. Analistas dizem que será um ano de volatilidade nos preços externos e, consequentemente, nos internos.
O próximo ano poderá ser marcado também pelo início da volta do protecionismo, impulsionado pelas políticas do novo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Os estoques mundiais estão elevados, podendo achatar o preço das commodities.
Os juros começam a reagir nos EUA, o que fará com que os fundos de investimentos deixem as commodities em busca de aplicações financeiras. Se isso ocorrer, os preços das commodities cairão.
Internamente, haverá uma escassez de crédito e o custo do dinheiro será elevado.
Muita Atenção
Diante desses problemas fora da porteira, os próprios produtores já tomam consciência que 2017 será um período que poderá ser rentável, mas vai exigir muita atenção, principalmente com a hora certa de negociar.
Daniel Latorraca, presidente do IMEA (Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária), diz que uma safra recorde, e concentrada em um período menor de colheita, vai aumentar os problemas de logística. Pode haver também alta de custos e redução de preços.
“E esse será um ponto que vai exigir muita atenção do produtor”, disse Latorraca.
Fábio Silveira, sócio-diretor da MacroSector Consultoria, afirma que os produtores voltados para o mercado externo vão ter mais êxito no próximo ano. O dólar deve ajudar nas vendas e na formação dos preços.
Já os produtores voltados apenas para o mercado nacional, como os de arroz e feijão, vão passar por “apuros”, devido à recessão econômica e às quedas da renda e da demanda interna.
Para Silveira, as carnes que estiverem no cardápio das exportações também vão ter sustentação de preços e de demanda, principalmente pelo apetite chinês nesse setor.
Já Daniele Siqueira, analista da AgRural, vê 2017 como um ano de volatilidade nos preços, provocada, em boa parte, pelo comportamento dos fundos de investimentos.
Está difícil prever o comportamento deles. Antes havia uma faixa de atuação, o que deixava claro para o mercado a hora que iam sair das commodities, disse Siqueira.
Para mostrar a dificuldade atual em avaliar os fundos, ela cita o exemplo atual da soja. O cenário para 2017 é de recomposição de estoques, safra mundial recorde e, mesmo assim, os fundos ainda mantêm em mãos um volume do produto correspondente a 10% da safra mundial.
Os juros nos Estados Unidos ainda são baixos, mas o risco é esses fundos se desfazerem das posições de compras e buscar outros investimentos, depreciando os preços, avalia a analista.
Efeito Trump
Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura, coloca um novo ponto nessa discussão: “a incógnita Trump”.
Pouco ele pode fazer a curto prazo, mas a tendência é que a atitude dele, seguida por outros países, leve a um protecionismo global.
Mas algumas ações prometidas por Trump podem auxiliar o agronegócio brasileiro. Ele deve reduzir impostos e elevar os juros, favorecendo alta do dólar, o que é favorece as exportações brasileiras.
Outro ponto positivo ao Brasil é a prometida saída dos EUA do TTP (Tratado Transpacífico, acordo comercial entre EUA e mais 11 países).
Se concretizada, essa saída dará mais espaço para as exportações brasileiras de produtos como açúcar, café, carnes e soja, avalia Rodrigues.
Mas além de prováveis problemas externos, o país deverá enfrentar os internos, tanto político como econômico.
No cenário político, uma das perguntas que Rodrigues faz é quão longe vai o governo de Michel Temer? Na área econômica, quão longe vai o desemprego?
Para ele, o cenário de 2017 não é ruim para a agricultura. Inclusive, vários setores deverão andar bem, mas o mercado sempre antecipa eventuais problemas que virão.
Mudanças
Será um período de desafios, principalmente na busca de recursos para custeio e novos investimentos. Governo e produtores terão de ser criativos, segundo João Henrique Hummel, do IPA (Instituto Pensar Agro).
Mas o próximo ano será também um período de definições. Na avaliação dele, alguns assuntos pendentes há muitos anos deverão ser definidos pelo governo e pelo Congresso em 2017.
Entre esses temas, estão demarcações de terras indígenas, definição conceitual sobre abrir o mercado para o capital estrangeiro e novas regras para o setor de defensivos agrícolas.
Por Mauro Zafalon
Fonte: Folha de S. Paulo