Os custos da produção da atividade leiteira no Brasil tiveram um aumento significativo ao longo de 2016 e acumulam, até agora, uma elevação de 19%, conforme dados da Scot Consultoria. Faltando pouco mais de dois meses para o final do ano, há poucos sinais de melhora. Se houver recuperação, só em 2017.
O maior problema para o setor de lácteos está relacionado aos gastos produtivos impulsionados pela alta de preços do milho e do farelo de soja no mercado interno, principais insumos na composição do concentrado para ração dos animais, que corresponde a 40% destes custos.
De acordo com o diretor da Sociedade Nacional de Agricultura Alberto Figueiredo, representante da SNA na Câmara Setorial da Cadeia do Leite, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), para o rebanho não ficar desnutrido, até porque não houve investimento prévio em pastagens destinadas à alimentação, o produtor de leite acaba gastando mais com rações.
“Embora saibamos, desde os tempos de escola, que os ruminantes possuem quatro divisões no estômago, para possibilitar a transformação de fibras existentes nos capins, que formam as pastagens em nutrientes, a grande maioria dos produtores acaba abandonando esta fonte de alimentos mais baratos, para não deixar o rebanho morrer de fome. Por isto, o pecuarista acaba comprando milho e soja caros no mercado”, ressalta Figueiredo.
O diretor da SNA acredita que, para reverter a situação, “o investimento em pastagens – e mais do que isto, nos sistemas integrados de produção, consorciando pastagens, lavouras e florestas – parece ser o caminho mais adequado para produzir a custos menores”.
MIGRAÇÃO
Ele atesta que os custos de produção da atividade leiteira no Brasil, com base no sistema mais tradicional de alimentação, aumentaram mais do que o valor do leite comercializado pelo produtor.
Diante de um cenário não muito promissor, o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) indica que muitos produtores da pecuária de leite estão migrando para a pecuária de corte, que vive um momento melhor no País, principalmente por causa da abertura de novos mercados externos à carne brasileira, ao longo de 2016.
“Essa migração para a pecuária de corte se justifica para aqueles produtores que não têm tradição na pecuária leiteira e que veem, nos preços altos da carne, uma oportunidade de melhores rentabilidades. Mas isto nem sempre ocorre”, pondera o diretor da SNA.
LEITE EM PÓ IMPORTADO
Para facilitar parcialmente a vida do pecuarista de leite, o governo federal publicou no Diário Oficial da União (DOU), do último dia 21 de outubro, a Instrução Normativa (IN) nº 40 do Mapa. Ela proíbe a reconstituição do leite em pó importado pelas indústrias localizadas na área de abrangência da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), uma região bastante afetada pela seca. Pelo texto, fica determinado que somente o leite em pó nacional pode ser utilizado para produzir leite UHT e pasteurizado.
Na opinião de Figueiredo, como resultado de uma demanda do setor de lácteos, principalmente das cooperativas de leite, “esta medida é uma decisão corajosa do ministro Blairo Maggi (da Agricultura); agora, esperamos que realmente haja fiscalização para surtir o efeito esperado”.
“É muito difícil intervir no mercado privado, principalmente quando os diferenciais de preços, muitas vezes decorrentes de subsídios na origem, ou até de produtos impróprios para o consumo, próximos da data de vencimento, ou até adulterados, sinalizam para lucros maiores por parte dos envolvidos.”
QUEDA NA PRODUÇÃO NACIONAL
Conforme o próprio Ministério da Agricultura, a produção nacional de leite é de quase 35 bilhões de litros por ano. Na última década, o segmento vinha crescendo 4% anuais, com destaque para a região Sul, com alta de 7% no mesmo comparativo. Nos dois últimos anos, porém, houve uma queda na produção, principalmente no Nordeste.
Figueiredo explica que a queda da produção de leite se deve a dois fatores principais: o primeiro está relacionando ao aumento do custo de produção, principalmente para os produtores com sistema dependente de insumos comprados; e o segundo diz respeito à queda do poder aquisitivo da população urbana, que reduziu a compra de produtos lácteos e impediu o repasse do aumento dos custos de produção para o consumidor final.
“Não podemos descartar um terceiro, e não menos importante fator, que é o da desorganização da cadeia produtiva, permitindo que o sistema varejista se aproprie de margens de comercialização, muitas vezes, exageradas”, critica o diretor da SNA.
LEITE URUGUAIO
No início de outubro, foi realizada uma reunião para discutir as dificuldades enfrentadas pelo setor lácteo brasileiro, na Comissão de Agricultura do Senado Federal. Representantes dos ministérios da Agricultura e das Relações Exteriores debateram algumas opções que possam corrigir possíveis distorções na relação de compra do leite uruguaio.
Sem nenhuma solução concreta até o momento, nas próximas semanas o governo federal deverá observar mais de perto os números de importação de lácteos do Uruguai, com o objetivo de buscar um acordo baseado no “bom senso”. Isto porque, segundo os produtores de leite, as exportações anteriormente direcionadas à Venezuela vêm sendo escoadas ao mercado do Brasil.
“Diante da opção normalmente adotada pelo Brasil, a de participar do livre mercado, qualquer intervenção protecionista pode acarretar represálias, até legais. Consideramos difícil essa medida, a n não ser que seja pelo lado da qualidade, envolvendo problemas sanitários ou de validade, adulterações, etc. Se existe um produto mais barato no mercado, e não é originário de fortes subsídios ou dumping, é difícil interferir.”
Por equipe SNA/RJ