O mercado exportador de grãos do Brasil se prepara para meses de uma virtual paralisação nos negócios fechados com produtores, com o País perdendo competitividade diante da queda do dólar e do recuo nos preços internacionais, que praticamente tira vendedores do mercado.
Dessa forma, a comercialização do que resta da safra passada e os negócios da futura devem ficar travados até o final do ano, disse um operador de grãos em São Paulo.
“Já comprei passagens de férias para setembro em função disso”, afirmou ele, pedindo para não ser identificado.
O operador ressaltou que terá muito mais trabalho em janeiro, quando começa a colheita da nova safra brasileira.
O Brasil é o maior exportador de soja do mundo e na temporada passada foi o segundo maior de milho. Mas deverá enfrentar grande concorrência dos Estados Unidos nos próximos meses, com produtores norte-americanos esperando colher safras recordes, o que já se reflete nos contratos futuros da bolsa de Chicago, referência global.
Com o mercado em baixa, o produtor acaba optando por esperar, comentou o diretor da corretora Confiança Agrícola, Vanderlei Angonese, de Sinop (MT), importante região de soja e milho de Mato Grosso, o maior produtor brasileiro de grãos.
“Pode dar um pico (de preço) em novembro, dezembro, de repente em 10 dias faz um volume monstruoso (de vendas), mas tudo indica que não vai ocorrer esse pico”, acrescentou ele, ressaltando que os preços oferecidos aos produtores despencaram.
Segundo o corretor, há algumas semanas os negócios com soja disponível na região de Sinop (safra 2015/16) ocorriam na faixa de R$ 83,00 e R$ 84,00 por saca. Atualmente, as ofertas são para R$ 63,00, com baixíssimo interesse dos vendedores.
Para negócios de venda antecipada da soja da safra 2016/17, as ofertas estão entre R$ 57,00 e R$ 58,00 por saca, para entrega em fevereiro e março de 2017.
“Mas a grande maioria dos negócios já fechados foi entre R$ 68,00 a R$ 70,00”, disse ele, referindo-se a contratos fechados em meados do primeiro semestre, quando as exportações brasileiras foram volumosas.
No acumulado do ano até julho, o Brasil exportou 44.5 milhões de toneladas de soja, alta de cerca de 10% em relação ao mesmo período de 2015, ajudado pelo câmbio no início de 2016 — as projeções da indústria apontam para exportações anuais de 53 milhões de toneladas, com recuo de mais de 1 milhão ante a temporada passada.
Concorrência dos EUA
Agora, as cotações no mercado interno têm sofrido pressão dupla, da queda do dólar e de recuos do milho e da soja na bolsa de Chicago, em antecipação à grande safra norte-americana a ser colhida nos próximos meses.
O dólar tocou nesta quarta-feira a menor cotação desde julho de 2015, a R$ 3,11, em linha com o exterior e após a aprovação no Senado da continuidade do processo de impeachment contra a presidente afastada Dilma Rousseff.
Já a soja vem sendo negociada abaixo de US$ 10,00 em Chicago, acumulando uma perda de mais de 15% desde o início de junho, quando chegou oscilar perto de US$ 12,00 o bushel. Já o milho é negociado perto da mínima de 22 meses no mercado norte-americano.
“No caso da soja, se confirmando as projeções de safra dos EUA, não haverá necessidade de o importador pagar prêmio forte aqui, se a soja nos EUA poderá custar mais barato”, disse um operador da mesa de originação de soja de uma trading asiática no Sul do Brasil.
No caso do milho, acrescentou ele, a situação é semelhante. As indústrias locais estão pagando um alto preços pelo produto neste momento, após uma grande quebra de safra no Brasil. Isso não deixa competitivas as tradings que trabalham para a exportação.
Governo e consultorias estão revisando para baixo as projeções de embarques de milho do Brasil, após muitos volumes negociados anteriormente para o exterior estarem migrando para o mercado local.
Dados da consultoria França Júnior ilustram a lentidão do mercado de soja. A comercialização da safra 2015/16 pelos produtores chegou a 85% em 5 de agosto, avanço de apenas 2% em um mês, mas em linha com a média dos últimos cinco anos para esse período.
Já as vendas antecipadas da soja de 2016/17 estão em 20% do total esperado, com evolução de 3% ao longo de julho, e abaixo do percentual de 26% verificado 12 meses atrás, segundo França Junior.
Fonte: Reuters