Preocupado com o abastecimento e com os elevados preços do café no mercado interno, o governo vai leiloar 693.300 sacas de produto de seus estoques até dezembro deste ano. E, caso seja necessário, outras 679.400 sacas de café dos estoques oficiais serão ofertadas em leilões no ano que vem. A medida, no entanto, deve ter pouco impacto, avaliam fontes da cadeia produtiva.
O primeiro leilão acontece amanhã e outros nove ocorrerão até dezembro, quinzenalmente. O produto a ser leiloado está estocado nos armazéns da Conab nos Estados de Minas Gerais, São Paulo e Paraná. A maior parte dos cafés ofertados é da safra 2009/10, mas também há produto da safra 2013/14 e uma quantidade pequena de cafés do ciclo 2002/03.
O governo decidiu vender café dos estoques oficiais – que têm um volume total de 1.489 milhão de sacas, principalmente arábica – numa tentativa de aliviar a escassez de oferta no mercado em plena colheita da safra 2016/17. A menor disponibilidade está relacionada sobretudo à quebra da safra 2016/17 do café conilon no País, em decorrência da seca no Espírito Santo.
Esse cenário elevou a disputa entre os torrefadores pela matéria-prima, já que o conilon é usado tanto pela indústria de solúvel como pelo setor de torrado e moído nos blends com arábica. Além da menor oferta de conilon, as chuvas entre o fim de maio e início de junho afetaram a colheita de arábica no Sudeste, atrasando a entrada de café no mercado. As indústrias consideram ainda que os estoques privados de passagem de café no País são baixos. Segundo a Conab, em 31 de março deste ano, eles somavam 13.589 milhões de sacas.
Diante da menor oferta, os preços da matéria-prima subiram no último ano. Conforme acompanhamento da Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC), o café conilon subiu 38,8%, para R$ 458,00 a saca e o arábica, 43%, para R$ 455,00, em termos nominais, entre 1º de julho de 2015 e 26 de julho deste ano.
A autorização para os leilões de café já havia sido dada pelo Conselho Interministerial de Estoques Públicos de Alimentos (CIEP), em resolução de maio deste ano, que fixou o Preço de Liberação de Estoques (PLE) em R$ 401,39 por saca. Como os preços de mercado estão acima desse valor, o Ministério da Agricultura resolveu apressar as vendas dos estoques.
O secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Neri Geller, disse ao Valor que o elevado patamar dos preços dos cafés arábica e conilon vem preocupando o governo, e a ideia é “derrubar um pouco os preços”. O plano é vender grãos “velhos”, de safras antigas do grão. “Temos café estocado em armazéns da Conab em Minas Gerais há pelo menos 12 anos, por exemplo”, afirma Geller. “Vamos atuar com esses leilões até o fim do ano, quantas vezes for preciso”.
Pela programação do Ministério da Agricultura, o primeiro leilão será amanhã, quando serão ofertadas 67 mil sacas de arábica. Os preços de abertura do leilão de amanhã variam de R$ 385,83 a R$ 430,97 por saca. No dia 11 de agosto, haverá oferta de 66.300 sacas e no dia 25, serão leiloadas outras 70.000 sacas. A partir de setembro, a Conab deve leiloar 140.000 sacas de café por mês.
Nathan Herszkowicz, diretor-executivo da Abic, observou que “o governo atendeu ao pedido da cadeia produtiva” após a “constatação evidente” de que “a indústria passa por dificuldades de abastecimento”. Mas, segundo o dirigente, os leilões “devem influenciar pouco o abastecimento e as cotações” do café, já que o volume disponível para venda é pequeno. Ele lembrou que o Brasil consome cerca de 4.5 milhões de sacas do grão por mês, sendo 1.5 milhão no mercado doméstico e 3 milhões para exportação. Assim, disse, “[O volume total do estoque do governo] representa apenas uma semana e meia de consumo”.
O presidente do Conselho Nacional do Café (CNC), Silas Brasileiro, afirmou que “se em plena safra, o governo precisa fazer leilão, significa que os estoques [de café] são baixos”. Pelas estimativas do CNC, aliás, os estoques são menores do que o calculado pela Conab e estavam entre 10 milhões e 11 milhões de sacas.
Ele também avaliou que os leilões devem ter pouco impacto no mercado. Mas apoiou a decisão do governo de leiloar café dos estoques. “O governo não quer que a inflação suba. O CNC tem o compromisso de garantir a remuneração do produtor [de café], mas também tem de ajudar o governo a combater a inflação”, disse.
A oferta retraída de café trouxe à tona, mais uma vez, discussões sobre a importação de produto pela indústria nacional. Brasileiro voltou a criticar a possibilidade, pois haveria, segundo ele, risco de a importação trazer pragas para os cafezais do País.
Fonte: Valor