Produtos de beleza, alimentícios e de limpeza. Essas são apenas algumas das utilidades da macaúba, uma palmeira nativa que pode atingir até 15 metros de altura, encontrada em diversos estados do Brasil
A procura por ela é grande por conta do palmito e da polpa do fruto que ela produz, que contém vitamina e propriedades antioxidantes, que beneficiam a pele e a saúde. O que muitos ainda não sabem é que, além de tudo isso, a macaúba tem potencial para se tornar combustível renovável, uma iniciativa gerenciada pelo Programa Nacional de Produção e Uso de Biocombustível (PNPB), do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
“Qualquer projeto de exploração da macaúba deve ser muito bem planejado e desenhado, o que exige um conhecimento detalhado da sua cadeia produtiva”, conta o engenheiro Marcelo Moreira Araújo, 42 anos, sócio-diretor da empresa de pesquisa e tecnologia Paradigma Óleos Vegetais.
A empresa é situada na região do Alto Parnaíba, em Minas Gerais, onde Marcelo desenvolve um projeto piloto de implantação da cadeia produtiva da macaúba. Ele e sua equipe pretendem criar um polo de produção de óleos vegetais no local. “O processo de beneficiamento já está implantado, a partir das tecnologias e know how desenvolvidos pela empresa, adquiridos durante sete anos de pesquisas e aplicação em escala industrial, utilizando-se dos frutos de macaúbas nativas”, explica. A empresa, que tem mais de 500 agricultores familiares cadastrados, é pioneira no desenvolvimento de projetos desse tipo e na produção de óleo da macaúba com potencial para alimentos, produtos de beleza e de higiene e de biocombustível.
No estado vizinho, em quatro regiões do Território Rural da Cidadania do Pontal de Paranapanema (SP), estudiosos do núcleo de pesquisas do campus de Piracicaba da Universidade de São Paulo (USP) desenvolveram, com o apoio do MDA, um projeto sustentável com dez famílias assentadas da reforma agrária, apostando na produção de biodiesel com foco na macaúba, por meio de sistemas agroflorestais e da agroecologia.
O engenheiro florestal João Portella, 28 anos, foi um dos pesquisadores e relata que o andamento e o resultado dos quase três anos do projeto, iniciado em 2008, foram positivos. “Está mais do que provado que os sistemas agroflorestais e a agroecologia são a direção e a base tecnológica para a consolidação da agricultura familiar.” Durante a execução do projeto, as famílias receberam serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) da equipe. “Era uma presença constante da nossa parte nos serviços de Ater. Isso foi a fortaleza do nosso projeto.”
O esquema com a macaúba deu tão certo que João revela a execução da segunda fase dele, já aprovada, por meio de chamada pública do MDA. “Pretendemos ampliar o número de famílias para trabalhar o biodiesel na agricultura familiar, ainda no Território de Pontal”, detalha. Ele espera trabalhar com 50 famílias assentadas, durante pouco mais de 12 meses, na produção de biodiesel por meio da oleaginosa.
Potencial para biodiesel
Para o coordenador-geral de Biocombustíveis do MDA, André Machado, os benefícios da macaúba para a produção do combustível renovável são enormes. “O óleo da polpa da macaúba tem características muito boas para o processamento industrial. Além disso, tem um bom balanço energético, com alta produtividade de óleo, podendo chegar a cinco toneladas por hectare”, afirma.
As vantagens não param por aí. André cita, ainda, que há um enorme potencial de ocupação de mão de obra e geração de renda para agricultores familiares e comunidades de extrativistas. “É uma cultura perene, e, portanto, menos intensiva em mecanização, e menos agressiva no uso do solo e na emissão de gases do efeito estufa”, completa.
Marcelo Araújo, da Paradigma Óleos Vegetais, lembra que a produção de macaúba para a utilização no biodiesel ainda é escassa. “Não existem, no Brasil, cadeias produtivas para a produção de oleaginosas que possam atender a demanda de biocombustíveis. As demais matérias-primas utilizadas possuem alguns problemas para o uso nessa produção”, diz. Ele ressalta que, enquanto outras oleaginosas produzem de 500 a 2,5 mil litros por hectare, a macaúba pode render cerca de cinco mil litros.
“Tínhamos uma ideia do potencial da macaúba, mas não uma perspectiva produtiva dela. As primeiras grandes implantações estão sendo feitas agora, de um ano para cá, mais ou menos. Daqui para quatro anos, poderão trazer uma contribuição para a cadeia do biodiesel. Hoje, não temos escala de óleo para o uso”, salienta João Portella, pesquisador da USP.
Agricultura familiar
Em Catanduva, município do interior de São Paulo, o engenheiro agrônomo Lídio Pereira Junior, 41 anos, é o responsável pelo Departamento de Originação da Fertibom, empresa produtora de biodiesel detentora do Selo Combustível Social. Há 11 anos, a empresa levantou a possibilidade de trabalhar com combustível renovável, e em 2005, deu-se início à produção de biodiesel com oleaginosas, entre elas a macaúba. “Do mesmo modo que transformamos matérias-primas em produtos de alta qualidade, sabemos da responsabilidade que temos com o futuro. Por isso, trabalhamos em harmonia com o meio ambiente”, observa Lídio.
Ele enfatiza que o projeto é uma forma de melhorar a vida dos agricultores familiares que atuam no processo. Atualmente, eles trabalham com cooperativas de Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. “Promovemos o desenvolvimento regional por meio de geração de empregos e renda para os agricultores familiares de vários estados. Nossa equipe assessora os agricultores familiares dos diversos arranjos produtivos que estão organizados em forma de cooperativa, associações ou individuais”, realça Lídio, que presta serviços de Ater para elas.
A Associação Comunitária de Pequenos Produtores Rurais de Riacho Dantas e Adjacências, de Montes Claros (MG), é uma das assessoradas nesse processo e conta com 64 associados – que eles chamam de sócios. A Associação compra a macaúba de 350 famílias extrativistas de quatro municípios mineiros (Montes Claros, Mirabela, Brasília de Minas e Coração de Jesus) para trabalhar com o óleo da polpa da fruta e vendê-lo para a indústria. “Estamos gerando renda para essas 350 famílias”, orgulha-se o presidente da associação, Agnaldo Fonseca, 46 anos. Além de presidente, Agnaldo é o tesoureiro da Cooper Riachão, marca dos produtos comercializados que tem os mesmos associados. “A associação trabalha mais com a parte produtiva e a cooperativa, com a parte de comercialização”, diferencia.
Parte do óleo extraído da polpa é utilizada na confecção de sabão em barra. “A macaúba tem várias linhas. Utilizamos o óleo para algumas finalidades, mas também vendemos a semente com óleo comestível, que é muito nobre, fazemos ração e com o endocarpo é possível fazer carvão, com um poder calorífero maior que o do carvão feito de madeira.”
Agnaldo é agricultor familiar e casado com Luzia Silva Costa, 42, com quem tem três filhos, com idades entre 14 e 20 anos. Em um espaço de 30 hectares, na região conhecida como Fazenda Santa Cruz, o agricultor e sua família criam gado e plantam mandioca e cana, além da produção de macaúba, sua maior fonte de renda. “Tudo aqui ajuda um pouquinho, seja o bezerro que a gente vende ou a mandioca que a gente planta”, considera o agricultor.
O agricultor participou, também, do projeto elaborado pela equipe da USP, no Pontal de Paranapanema (SP). “Foi um projeto muito bom. Como já temos alguma estrutura, trocamos muitas experiências lá. Vimos que eles estão interessados e passamos a eles o pouco que sabemos”, diz.
A macaúba
A palmeira é encontrada em muitos estados do País. Ela engloba mais de 20 espécies e sua aparição se estende do México a Argentina, embora o Brasil seja um dos países com maior ocorrência. Em estados como o Amazonas e o Pará, a macaúba é conhecida, também, como mocajá, macujá ou bacaiúva. Minas Gerais é o estado com a maior concentração da espécie.
A macaúba pode ser aproveitada de forma ampla. A estirpe, que é a raiz da planta, é utilizada no meio rural na confecção de calhas e ripas, por exemplo. As folhas são usadas como matéria-prima na obtenção de fibras, destinadas à produção de linhas, cordas e redes. Do pecíolo da folha, que é o que a prende ao tronco da árvore, podem ser feitos cestos, balaios e chapéus. Os espinhos servem como alfinetes para as mulheres rendeiras, por serem duros e resistentes. E até mesmo as flores da planta têm utilidade: são usadas na decoração de árvores de natal.
Porém, a procura maior pela palmeira é por conta do palmito e da polpa do fruto, que contém vitamina A e betacaroteno, um antioxidante que, entre outros benefícios, previne o envelhecimento, aumenta a imunidade e a elasticidade da pele e atua no metabolismo de gorduras do corpo. Em média, uma macaúba contém 550 frutos por cacho. Os frutos podem variar de tamanho, de acordo com a espécie.
Podem ser feitos da macaúba cosméticos, produtos de limpeza e alimentícios, como sorvetes, margarinas e tortas. A polpa do fruto pode ser utilizada, ainda, como ração animal, na engorda de suínos. A macaúba tem potencial para produção do biocombustível, por ser uma fonte de energia mais limpa e renovável.
Fonte: Portal do Agronegócio