A cena política do Brasil é nitroglicerina pura. As turbulências se agravam, as notícias não são boas para o governo e as incertezas são cada vez maiores para todos os setores da economia nacional. Assim, para o agronegócio não é diferente. Mas, quanto os produtores rurais já perderam com os últimos desdobramentos dessa crise política?
No noticiário internacional, um dos destaques do analista Michael Cordonnier é: “turbulência política no Brasil não traz boas notícias para a agricultura brasileira”. Embora um dos mais respeitados profissionais internacionais entenda que a instabilidade traga complicações ao agronegócio nacional, ele considera as mudanças que poderiam vir adiante são importantes e decisivas para um futuro mais promissor da atividade.
“Depois que tudo isso ficar para trás, o Congresso Nacional e a possibilidade de um novo presidente poderiam trazer uma concentração de esforços na busca de uma saída da economia nacional de uma das suas piores recessões. Ainda não sei se é uma suposição realista, mas o mercado reage dessa forma, pelo menos agora”, disse.
Neste domingo, 13 de março, mais de 6 milhões de pessoas, segundo organizadores do evento, e mais de 3 milhões pela contagem da Polícia Militar, foram às ruas de Norte a Sul do Brasil protestar contra o governo do PT. Os efeitos das manifestações, no entanto, começam a ser avaliados agora.
Dólar
A Operação Lava-Jato continua se desenvolvendo e, em uma de suas últimas fases concluídas, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi conduzido coercitivamente pela Polícia Federal para prestar depoimento e, nesse dia 4 de março, o dólar chegou a perder mais de 3%, devolveu parte das baixas e encerrou os negócios caindo 1,09% e valendo R$ 3,76. A queda semanal de 5,93% foi a maior desde 2008.
Embora esse tenha sido um momento expressivo para o andamento da moeda norte-americana, a crise política no país já vinha pressionando a taxa cambial há algumas semanas e o movimento se estendeu ainda para o dólar futuro. De 22 de fevereiro a 9 de março, a divisa já acumula uma queda de 6,84%.
Soja
O impacto desses números foram sentidos imediatamente pelos preços dos produtos do campo. A soja, principal item da pauta agrícola exportadora do Brasil foi um dos itens que sentiu a maior pressão, e as baixas registradas pelas cotações no mercado nacional passaram de 9% nas principais praças de comercialização. O impacto na Balança Comercial do País, portanto, é imediato também.
“Em 2015, a receita com as vendas de soja em 2015 subiu 11,9% e a de milho, 7,3%. Os ganhos registrados pela agricultura brasileira vieram, principalmente, da significativa desvalorização da moeda brasileira. E esses benefícios não deverão ser observados novamente em 2016”, acredita Cordonnier.
Com um dólar mais alto, os produtos brasileiros ficaram também mais competitivos para os importadores, o que possibilitou um espaço ainda maior para o País no mercado internacional. Agora, com a moeda norte-americana buscando seu ponto de equilíbrio, essa situação pode mudar. Neste período, as vendas externas de milho explodiram e alcançaram níveis recordes, entres outros itens.
O comportamento da taxa de câmbio para o agronegócio brasileiro é, portanto, uma faca de dois gumes. Depois da queda expressiva do dólar, a comercialização de soja no Brasil que já vinha travada – afinal, mais de 60% já foi concluída para a temporada 2015/16 – reduziu ainda mais seu ritmo. Muitos produtores apostam na soja, por exemplo, mais como um ativo financeiro, em que vale mais a pena mantê-la para realizar suas vendas em momentos oportunos, do que vendê-la e guardar seu dinheiro que, nesse momento, rende menos.
Projeções para economia
Além disso, a perspectiva do mercado é de que, em 2016, a economia nacional retraia 3,54%, de acordo com os últimos números do Boletim Focus. Já a estimativa do IBGE é de que essa retração se aproxime dos 4% e fique em 3,8%. Ao mesmo tempo, a inflação segue em alta, o desemprego tem níveis elevados e segue aumentando, enquanto a taxas de juros passa de 14%.
Daqui para frente, e já na temporada 2016/17, os primeiros efeitos desse quadro deverão vir em forma, principalmente, de uma redução dos investimentos por parte dos produtores, segundo explicam analistas de mercado. E a culpa é, invariavelmente, da incerteza e da instabilidade crescentes.
“Se olharmos no horizonte mais distante, as incertezas inibem investimentos e a produção tende a ter acréscimos menores ou até redução, como vem acontecendo com os demais setores da economia. Se olharmos o PIB do último ano, o agronegócio foi o único setor que cresceu. Mas, tende a passar por problemas pela frente, notadamente com corte nos investimentos”, acredita o economista e analista Camilo Motter, da Granoeste Corretora de Cereais. “Acredito que os investimentos são os mártires desta instabilidade toda”.
Custos de Produção e Planejamento
Planejamento será a palavra de ordem para o agronegócio brasileiro, orientam os analistas e consultores de mercado. “Em tempos de volatilidade alta, planejamento, observação constante do mercado, vendas parceladas e controle de custos são ainda mais importantes”, disse Camilo Motter.
Ainda segundo o analista da Granoeste, os produtores brasileiros que venderam boa parte da sua safra 2015/16 com um dólar elevado e conseguiram bons preços, também fecharam a compra de alguns insumos com a moeda americana mais elevada e, por isso, agora temem uma receita menor com essa recente queda da divisa frente ao real.
“A oscilação do câmbio, que trouxe renda para o campo neste período de alta, pode trazer alguma decepção se continuar caindo, ou quando cair de forma mais consistente. Aí sim, a renda será afetada, sobretudo naquele período em que os custos continuarem altos, em descompasso com o preço de venda”, disse.
Um recente levantamento do IMEA (Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária) mostrou que a safra brasileira 2016/17 de milho no estado pode registrar seu maior custo de produção da história, alcançando algo na casa dos R$ 2.553,87 por hectare. Para a soja, o esperado passa de R$ 3.300,00/hectare.
Ao mesmo tempo, um estudo da Agri Benchmark aponta que os custos operacionais da produção de trigo do Brasil são os mais caros do mundo, enquanto a produtividade não acompanha. “Se a questão fosse avaliada apenas pelo viés econômico, a cultura seria inviável”, diz Antônio da Luz, economista-chefe do Sistema FARSUL (Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul) em entrevista ao portal Cenário MT.
Plano Safra 2016/17
Há meses ainda de seu lançamento, o Plano Safra 2016/17 – o novo orçamento deverá ser divulgado em junho – já gera especulações no cenário internacional. No ano passado, o plano trouxe um volume menor de recursos a juros subsidiados e, ainda segundo Michael Cordonnier, isso poderia acontecer novamente. Porém, destaca ainda que as autoridades já iniciaram as suas reuniões na busca de um mecanismo que evitasse cortes no crédito disponibilizado pelo do Plano Safra.
“Dada a difícil situação em que se encontra a economia brasileira, eu esperaria que o Plano Safra 2016/17 fosse ainda menos amigável para os produtores brasileiros do que foi o 2015/16. No final, os agricultores, provavelmente, terão menos crédito e a um custo mais elevado”, disse.
Fonte: Notícias Agrícolas