Soja sofre redução no teor de proteína ao longo do tempo

soja
FOTO – Vladimir Moreira

 

 

O recebimento de lotes de soja com teores de proteína cada vez menores tem sido uma reclamação frequente dos fabricantes de ração animal, que usam o farelo da leguminosa como matéria-prima. O pesquisador Antonio Eduardo Pípolo, da Embrapa Soja (PR), conta que até o final da década de 1990, o Brasil produzia facilmente o farelo de soja com 46% de proteína, e em algumas regiões o farelo com 48%. Devido à queda da qualidade da matéria-prima, esses teores de proteína no farelo não são mais facilmente conseguidos. “Se os teores de proteína no farelo não atingem os valores contratuais a carga pode ser devolvida ou sofre deságio”, explicou o cientista.

Para avaliar as alterações observadas empiricamente nos teores de proteína, na safra 2014/2015, a Embrapa Soja coletou 867 amostras de soja em diferentes municípios de nove estados brasileiros (RS, SC, PR, MS, MT, MG, GO, SP, BA). “Agrupamos os municípios e fizemos as médias das mesorregiões e dos estados”, disse o pesquisador José Marcos Gontijo Mandarino, da Embrapa Soja.

O levantamento revelou que a média de proteína (em base seca) é de 36,22% no Rio Grande do Sul; de 37,23%, em Santa Catarina; de 36,29%, no Paraná; de 36,46%, em Mato Grosso do Sul; de 35,47%, em São Paulo; de 35,83%, em Minas Gerais, de 35,56%, em Goiás, de 35,63%, em Mato Grosso e de 36,13%, na Bahia. “O desejável é que o grão de soja tenha, ao menos, 36% de proteína e 14% de umidade para garantir a produção de farelo com teores de proteína adequados”, revela Mandarino. “No entanto, observamos por esse levantamento que, nessa safra, de fato, os índices brasileiros estão no limite e em alguns estados abaixo do ideal”, explicou.

Carlos Arrabal Arias, pesquisador do mesmo centro de pesquisa da Embrapa, afirma que um dos fatores mais importantes para essa queda nos teores de proteína seria o fato de as empresas de melhoramento genético, nos últimos 40 anos, terem priorizado a produtividade, característica que tem uma relação inversa com o teor de proteínas. “Por isso, quanto mais soja se produz por hectare, menor o teor de proteínas que estará presente no grão”, disse.

Na avaliação de Pípolo, a variação nos teores de proteína e óleo é determinada principalmente por fatores genéticos, mas também tem forte influência ambiental. “As empresas de melhoramento de plantas têm trabalhado principalmente para o aumento da produtividade da soja, mas o grande desafio é aumentar o rendimento sem reduzir o teor de proteína e de óleo”, relatou.

Só para se ter uma ideia, a média de rendimento nacional da soja subiu de 1.250 kg/ha, no início da década de 1970, para 2.800 kg/ha, nos anos 2000 e, atualmente a média nacional está em torno de 3.000 kg/ha. “Houve uma mudança de patamar porque os programas de melhoramento genético foram selecionando cultivares para rendimento e naturalmente ocorreu redução nos teores de proteína”, esclareceu.

Menos água, menos proteína

Além da questão genética, os fatores ambientais também merecem atenção, como a disponibilidade de nitrogênio (N). “Esse elemento acumulado durante o ciclo da soja é utilizado durante o período de enchimento de grãos”, explica Pípolo. “Entre as fontes de nitrogênio que a planta utiliza, a principal é o nitrogênio da fixação biológica, que é dependente de água. Portanto, as condições climáticas durante o cultivo da soja interferem na concentração de proteína nos grãos”, destacou.

A soja é valorizada principalmente por seu alto teor de proteína, média de 36% de proteína na safra 2014/2015, valor superior ao de outras oleaginosas. Por isso, a leguminosa tornou-se matéria-prima indispensável para produção de farelo protéico, utilizado principalmente na fabricação de rações para aves, suínos e bovinos e animais de pequeno porte. No entanto, as indústrias produtoras de farelo vêm alegando que os teores de proteína do grão estão baixos, o que dificulta a produção de farelo e aumenta o custo de produção da ração.

Tradicionalmente os teores de proteína no farelo de soja atendem as especificações da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (ANEC), para o mercado externo, e do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento, para o mercado interno. “Entretanto, a indústria vem enfrentando problemas decorrentes da imprevisibilidade da qualidade da matéria-prima, principalmente, com relação aos teores de proteína e de óleo nos grãos em cada safra”, explicou o pesquisador Cesar de Castro, da Embrapa Soja.

O mercado considera três tipos de farelo: o farelo com 44% de proteína tem um deságio no preço quando comparado ao farelo-padrão, com 46% de proteína. Por sua vez, o farelo com 48% de proteína pode receber um ágio no preço, quando comparado com o farelo-padrão.

Quando não se consegue atingir os padrões estabelecidos, a indústria tem que adotar estratégias para minimizar o problema como retirar as cascas dos grãos. Como essa parte externa contém pouca proteína, retirá-la aumenta a proporção de proteína no lote. Essa é a realidade de indústrias do setor a exemplo da Cooperativa Agroindustrial dos Produtores Rurais do Sudoeste Goiano (Comigo) que esmaga 5.500 toneladas de soja por dia.

Para o responsável pela área de armazenagem da Comigo, Paulo Carneiro Junqueira, o baixo teor de proteína da soja tem implicação direta na produção de farelo. “Muitas vezes, temos que retirar o tegumento da soja, a casca, mesmo tendo pagado pelo volume total do grão”, diz. “Ao descartar a casca temos um prejuízo aproximado de 3%, o que resulta em perda de 50.000 toneladas de soja por ano”, calculou.

Para Wilson Aparecido, gerente de produtos da Comigo, a oscilação nos teores de proteína traz consequências diretas na quantidade de farelo utilizado para se produzir ração. “Uma ração para gado leiteiro que é produzida com farelo com 45% de proteína, por exemplo, necessita de um acréscimo de 1,3% de proteínas na fórmula. Com isso, vou ter uma ração mais cara para o consumidor final”, disse.

A Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e a Associação de Produtores de Soja (Aprosoja-MT), desde 2006, vêm fazendo levantamentos sobre a qualidade da soja produzida no estado. De acordo com a professora Maria Aparecida Canepele, da UFMT, foram avaliadas aproximadamente oito cultivares de soja plantadas no norte, sul, leste e oeste do estado com o objetivo de se verificar a existência de variabilidade nas cultivares quanto aos teores de proteína nas diferentes regiões de Mato Grosso. “Podemos perceber que não houve influência do ambiente nas cultivares nessas diferentes regiões”, disse. “Os teores médios de proteína no grão encontrados no estado estão em torno de 38%”, revelou.

Em uma segunda etapa, o estudo comparou índices encontrados em MT com os de outros estados produtores de soja. “O estudo identificou que os estados mais ao norte do Brasil, como Maranhão, Piauí, alcançaram teores de proteínas mais elevados, o que revela que questões como temperatura, precipitação, altitude, enfim, fatores climáticos têm impacto nos teores de proteína”, ponderou.

 

Fonte: Embrapa

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