Para entender aquela que poderá ser a maior aquisição já feita por uma companhia da China, não é preciso olhar além das mudanças na dieta da população do país.
Uma proposta de compra bem-sucedida da estatal China National Chemical (ChemChina) pela suíça Syngenta poderia ajudar a China a combater ervas daninhas e pragas com menos mão-de-obra, já que os trabalhadores rurais trocam cada vez mais o campo pelas zonas urbanas, onde os salários são melhores. E a área de terras cultiváveis caiu ao mesmo tempo, enquanto a crescente classe média chinesa está consumindo mais carne, elevando a demanda de cereais para alimentação de rebanhos.
A oferta inicial de US$ 42 bilhões da ChemChina pela Syngenta foi rejeitada, mas fontes a par do assunto disseram que a lógica do negócio permanece sólida. A compra também transformaria a ChemChina em uma desenvolvedora de organismos geneticamente modificados (OGM), colocando-a em competição direta com a Monsanto, a líder do mercado.
Há mais de um ano o presidente Xi Jinping vem exortando seu país a assumir a liderança no desenvolvimento de lavouras geneticamente modificadas. Segundo disse ele em pronunciamento no ano passado, a nascente indústria de sementes do país deveria “pesquisar e inovar com ousadia” na área dos OGMs e impedir que companhias estrangeiras dominem o mercado. O uso da biotecnologia no setor agrícola foi enfatizado no mais recente Plano Quinquenal da China.
“O interesse da ChemChina está nas pesquisas de sementes”, afirma Jonas Oxgaard, analista da Sanford C. Bernstein, em Nova York. “Esta é indiscutivelmente a principal razão estratégica do negócio”.
A Syngenta, maior produtora mundial de defensivos, é também uma das poucas companhias não chinesas que dominam a produção de lavouras transgênicas – as demais incluem a Dow Chemical, DuPont e Bayer. Antes mesmo do interesse da ChemChina, a indústria dos transgênicos já passava por transtornos.
A Monsanto fez uma mal sucedida proposta de aquisição pela Syngenta este ano e disse ontem que ainda está interessada em aquisições, enquanto Dow e DuPont admitiram negociar possíveis vendas ou compras em seus negócios de insumos agrícolas.
A ChemChina entrou na briga para que não fique alijada de uma eventual consolidação do setor, e provavelmente negocia com a Dow a aquisição de sua unidade AgroSciences nos EUA, segundo Oxgaard. A divisão já desenvolveu sementes transgênicas conhecidas e, com isso, poderia conseguir um terço do preço oferecido pela Syngenta, acrescenta o analista. A ChemChina fez uma oferta pela Dow AgroSciences quando ela esteve à venda em 2009, segundo informou o jornal “South China Morning Post” na época.
“Seria inconcebível eles fazerem uma oferta pela Syngenta, mas não pela unidade da Dow”, continua Oxgaard. A Dow disse que não faria comentários com base em especulações. Ninguém na ChemChina respondeu a telefonemas e e-mails enviados pela Bloomberg.
Apesar de seu tamanho gigantesco – a ChemChina tinha 160.000 funcionários no fim de 2013, segundo dados compilados pela Bloomberg -, só 12% de suas receitas vêm da agricultura. A obtenção de tecnologia em sementes permitiria pular o caro e longo processo de desenvolvimento de suas próprias sementes transgênicas, e também ir além dos pesticidas genéricos produzidos por sua unidade em Israel, a Adama Agricultural Solutions, adquirida em 2011.
A Syngenta tem um dos maiores portfólios de sementes do setor, incluindo 6.800 variedades de seus próprios organismos geneticamente modificados. As sementes responderam por cerca de um quarto das vendas no ano passado e a maioria de suas pesquisas em GMOs ocorre na Research Triangle Park, na Carolina do Norte (EUA).
A compra da Syngenta também daria à ChemChina o know-how para conseguir aprovações reguladoras de futuras tecnologias, disseram analistas do Deutsche Bank. A Syngenta também tem alcance global, com unidades nos EUA, Europa, América do Sul e China.
Fonte: Valor Econômico