Estadão: ‘Produtores estão estimulados a plantar’, diz presidente da SNA

Apesar de o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) projetar, em seu primeiro prognóstico para 2016, uma queda de 1,9% na safra, o presidente da Sociedade Nacional da Agricultura, Antonio Alvarenga, acredita que as próximas estimativas apresentarão números mais otimistas. Para ele, a produção agrícola no País continuará crescendo no ano que vem.

Em entrevista ao Broadcast, da Agência Estado, justificou sua avaliação com base nas intenções favoráveis de plantio e no câmbio em alta, que, apesar de elevar o custo de produção, torna as commodities brasileiras mais competitivas no exterior.

O presidente da SNA é favorável à venda de terras a estrangeiros, mas defendeu um limite de área e a exigência de um projeto de produção como contrapartida. Na entrevista também afirmou que a atual greve dos caminhoneiros pode ser o prenúncio de uma paralisação maior.

“Os caminhoneiros descobriram em abril que eles podem parar o Brasil, e acaba tendo desabastecimento total. O governo tem que tomar muito cuidado, pois é extremamente perigoso”, diz ele, afirmando que a saída mais viável seria baratear o preço do diesel.

A seguir, os principais trechos da entrevista:

O IBGE anunciou que a colheita de grãos em 2016 deve ser 1,9% menor do que neste ano. O Brasil deve interromper a sequência de recordes na produção?

Antonio Alvarenga: Os produtores estão estimulados a plantar. Eu acho que a produção vai continuar crescendo, não sei se a 8%, mas vai continuar crescendo. A intenção de plantio não é ruim não, apesar de todo o clima econômico que a gente tem. Na verdade, acho que o produtor vai comprar menos equipamento, que é um investimento mais pesado, mas vai continuar investindo em tecnologia, em sementes, etc. Então, a gente deve produzir uns 5%
a mais (de grãos ante 2015), mas isso é um chute, porque você tem o problema do clima, da cotação (do produto), de alguma praga… tem tantas variáveis ainda até chegar o ano que vem que acertar uma estimativa de safra é muito difícil. Mas a intenção é de plantar mais, algo em torno de 5%. Tem dinheiro, tem recursos, o crédito rural ainda é subsidiado. O dólar está beneficiando bastante a produção. Claro que o produtor está preocupado com o preço dos insumos, fertilizantes, herbicidas, tudo isso é dolarizado. Mas a diferença é positiva para a área de grãos. Ele ganha com o dólar mais alto.

O dólar valorizado pode inibir investimentos em insumos e, consequentemente,
ganho de produtividade?

Ainda é difícil de prever. É claro que quando você tem aumento no preço dos insumos a tendência é você economizar um pouco nesses itens, como fertilizantes, defensivos. Mas não vai ser uma coisa significativa, não. Enquanto o mercado estiver favorável, absorvendo, comprando, não vai ter problema de produção.

Hoje o setor tem menos previsibilidade?

O agricultor tem um problema grande que é essa insegurança em relação ao clima, às pragas, à cotação do produto dele no mercado internacional, ao dólar. Ele é um malabarista, e a rentabilidade nem é tão alta que pague o prêmio desse risco que ele corre. Mas é o setor que está bombando no Brasil. Salva os outros setores da economia. Essa é a saída. O Brasil só vai se recuperar pelo mercado externo, e o agronegócio pode ajudar nisso. O que falta é agregar valor. No caso do café, por exemplo, uma das coisas mais absurdas é a gente exportar café em grão e depois nós mesmos importamos cápsulas de café. O que ainda falta fazer é exportar um produto industrializado do agronegócio brasileiro.

A greve atual dos caminhoneiros preocupa?

É uma greve anunciada. Essa greve de caminhoneiros não vai parar por aqui, ela vai continuar por muito tempo. A origem dessa greve de caminhoneiros foi dois ou três anos atrás, quando o governo subsidiou a compra de caminhões a juros baixos. Então, a oferta de frete aumentou. Por outro lado, a logística é péssima, mas está havendo algumas pequenas melhorias, o que reduz a demanda. Então, o preço do frete cai. Além disso, o governo passou anos e anos vendendo diesel baratinho e agora resolve fazer o ajuste, aumentando o preço do diesel. E ainda veio a Cide em cima do diesel. Isso é uma coisa de difícil solução. A única coisa que o governo pode fazer é reequilibrar o preço do diesel e retirar a Cide, deixar só na gasolina.

O movimento atual pode ser prenúncio de algo maior?

Eu acho que sim. O que eles descobriram em abril (quando os caminhoneiros também entraram em greve) é que eles podem parar o Brasil, e acaba tendo desabastecimento total. O governo tem que tomar muito cuidado, pois é extremamente perigoso, inclusive para o agronegócio. Os caminhoneiros descobriram a força que eles têm. Uma força talvez muito maior que passeata na Av. Paulista.

Como o sr. vê o Brasil no cenário do agronegócio mundial em alguns anos?

Não tenho dúvida nenhuma de que em poucos anos o Brasil será o principal player no mercado exportador de produtos agrícolas. Quem investir no agronegócio pode ter alguns problemas no caminho, mas no médio prazo vai deslanchar. O Brasil vai ser protagonista nisso durante muito tempo. O crescimento da população mundial vai aumentar a demanda por produtos agrícolas, e o Brasil vai surfar nessa onda, porque os outros países não têm como aumentar a produção num primeiro momento. Então, o Brasil vai responder por boa parte dessa nova demanda que vem por aí.

A Parceria Transpacífico pode prejudicar as exportações do agronegócio
brasileiro?

Esse acordo pode atrapalhar um pouquinho o Brasil. A gente não sabe ainda qual é o potencial impacto sobre o agronegócio brasileiro. Pode ser que tenha um impacto, não só em cima do agronegócio, mas das exportações brasileiras. O Brasil tem que se descolar do Mercosul, fazer acordo em separado. Em termos de comércio exterior, o Brasil está atrelado a países atrasados.

Como o sr. avalia a gestão da ministra da Agricultura, Kátia Abreu?

A ministra da Agricultura está fazendo um trabalho muito bom. Ela está o tempo todo viajando. Veja bem, tem muito espaço para o Brasil ocupar no mundo em termos de exportação de produtos do agronegócio, e a gente tem que aproveitar essas oportunidades. Acho que a Kátia está fazendo um trabalho excepcional como ministra, está organizando a casa, apesar das imensas dificuldades que a pasta tem, e tentando abrir mercados lá fora.

O sr. é favorável a liberar a compra de terras no Brasil por estrangeiros?

Os proprietários de terra estão loucos (para que seja aprovado), até porque o ativo valoriza. Eu tenho uma opinião um pouco diferente do que a maior parte do agronegócio, que quer uma liberação quase que geral. Eu acho que tem que ter limite. Acima de um determinado limite, que não deve ser muito grande, deve ter um projeto. Quer dizer, o estrangeiro quer comprar 50 mil hectares, 100 mil hectares, tudo bem. Desde que ele apresente um projeto. Você teria uma aprovação de projetos de investimento estrangeiro, e não para comprar o que quiser.

Por Idiana Tomazelli 

Fonte: Estadão (I) e Estadão (II) 

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp