Passado o período do pré-custeio de safra, marcado pela escassez de crédito “subsidiado” nos bancos, e recém-iniciada a nova temporada agrícola, em julho, produtores rurais de todo País já se queixam de dificuldades para acessar os financiamentos para custeio com os juros controlados do Plano Safra 2015/16, ainda que os desembolsos tenham começado em ritmo forte. Essa taxa foi fixada em 8,5% ao ano até junho do ano que vem, ante os 6,5% que vigoraram em 2014/15.
As reclamações dão conta de que os bancos estão mais seletivos e criteriosos na análise de crédito. Nesse sentido, dizem produtores, algumas instituições passaram a exigir garantias adicionais para a tomada de valores mais elevados e não é difícil se deparar com taxas derivadas do uso de um “mix” de recursos – parte com juros controlados e parte com juros livres, para os quais os patamares cobrados normalmente superam a Selic (14,25% ao ano).
Almir Dalpasquale, presidente da Aprosoja Brasil, associação que representa sojicultores do País, afirma que essas adversidades são localizadas, mas “coleciona” relatos dando conta de dificuldades de negociação com gerentes bancários, demora nas liberações de crédito e, com isso, atraso na compra de insumos.
“De uma forma geral, o produtor que tem liquidez financeira e não tem débito nenhum consegue acesso mais facilmente. Neste ano, até pela dificuldade que temos, com menos recursos com juros controlados, os bancos estão levando as exigências mais na ponta do lápis e os produtores estão tendo mais problemas para tomar crédito”, diz.
Dalpasquale descreve que no Paraná e em Mato Grosso do Sul é possível contratar financiamentos para custeio com recursos controlados com razoável normalidade, principalmente no Banco do Brasil. Mas realça que há mais aperto nas análises de crédito em geral no Rio Grande do Sul, onde muitos produtores já têm dívidas a quitar, e na Bahia, Goiás e Mato Grosso, por conta de casos de inadimplência.
“Nessas regiões ouvimos de vários produtores que só estão conseguindo tomar crédito no sistema de ‘mix’, até no Banco do Brasil”, acrescenta. Ao Valor, Clênio Teribeli, diretor de Agronegócios do BB, negou “peremptoriamente” que a instituição esteja usando “mix” de fontes de financiamento, como ocorreu no pré-custeio.
Rodrigo Bilibio, produtor de Vera, município do médio-norte de Mato Grosso que planta soja, milho e arroz em uma área de 4.000 hectares, tem empréstimos para custeio de safra em três bancos. No Bradesco, diz ele, 60% do montante que tomou foi com taxas controladas e 40% a juros livres. Segundo Bilibio, a Caixa, mais exigente, está inclusive pedindo a hipoteca da propriedade rural como garantia para financiamentos acima de R$ 500.000,00. A instituição confirma e diz que esse é seu comportamento padrão.
No BB, Bilibio diz haver crédito disponível a juros controlados, mas relata muita pressão que esse crédito saia acompanhado de um seguro rural e, às vezes, de um seguro de vida, o que eleva os juros finais. O banco nega. “Meu custeio do ano passado foi 100% financiado. Nesta safra 2015/16, 20% dele foi com financiamento, 50% por meio de tradings e o restante com recursos próprios”, analisa Bilibio.
O governo responde com números e argumenta que o ritmo de contratações de crédito rural desde o mês passado está forte e assim deverá permanecer em agosto, quando há grande demanda para o custeio uma vez que o plantio de grãos terá início em meados de setembro no Centro-Oeste. Em julho, primeiro mês da safra 2015/16, os bancos emprestaram R$ 11.4 bilhões em crédito rural, 32% mais que no mesmo mês de 2014, de acordo com dados do Banco Central.
O BB, líder desse mercado com uma participação que gira em torno de 65% das operações, já concedeu R$ 4 bilhões somente entre o início de julho e 8 de agosto, 34% acima do valor liberado em igual intervalo do ano passado.
A Caixa contabiliza R$ 1.08 bilhão em crédito para custeio e investimento contratados em julho de 2015 contra R$ 240 milhões em julho de 2014. “Até R$ 1.2 milhão, estamos ofertando o recurso controlado. Acima disso, podemos fazer o “mix” com recursos livres a taxas de 16,5% e 17,5% ao ano. Na safra 2014/15, eram 14,5%”, afirma Fábio Lenza, vice-presidente de Negócios Emergentes da Caixa.
Wolney Romano, diretor do Banco Sicreed, uma das principais cooperativas de crédito do País, demonstra preocupação com os depósitos à vista, fonte tradicional de recursos para o crédito rural, até o fim da safra 2015/16. “Se continuar assim, deveremos fazer um ‘mix’ com depósito, poupança e juros livres.
Para o secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, André Nassar, “ainda não acendeu nenhum farol vermelho para nós [governo]”; mas ele destaca que o que preocupa é “o financiamento da safra ficar mais caro para o produtor e isso pesar no fluxo de caixa dele, embora não haja nenhum sinal de que isso ainda é sério”.
Fonte: Valor Econômico