As mudanças nas regras de emissão das letras de crédito do agronegócio (LCA) e imobiliário (LCI) estabelecidas pelo governo há pouco mais de duas semanas já afetam a captação dos bancos. Até 15 de junho, o volume de emissões dos títulos recuou 36% em relação a igual período em maio, para R$ 14.1 bilhões de acordo com informações da BM&FBovespa e da Cetip, responsáveis pelo registro das operações.
A retração foi puxada pela LCA que sofreu as maiores mudanças. Para as duas letras, o governo aumentou o prazo mínimo para resgate das aplicações para 90 dias – para a LCI esse prazo era de 60 dias e para a LCA não havia limitação.
O governo também “carimbou” a aplicação dos recursos captados pelos bancos com a LCA, que agora terão que ser aplicados em operações de crédito rural. Antes da alteração, os bancos podiam usar como bem entendessem os recursos, desde que os títulos contassem com lastro em financiamentos para o agronegócio. A nova regra, válida desde 2 de junho, prevê um período de transição de um ano, durante o qual os bancos ainda poderão usar livremente 50% dos recursos captados com a emissão das LCAs. A partir de junho de 2016, o direcionamento obrigatório sobe para 100%.
No mês passado, a média diária de emissões de LCA foi de R$ 1.4 bilhão. O pico ocorreu no dia 29, pouco antes das mudanças, quando o registro bateu em quase R$ 2 bilhões. A partir de 2 de junho, sob as novas regras, o volume médio diário caiu para R$ 677 milhões, uma queda de 54%. No mercado de LCI, a queda dos registros foi de 5% nos primeiros 15 dias de junho.
As letras de crédito vêm sendo usadas em larga escala pelos bancos, em particular pelas instituições públicas e de médio porte, como a forma mais barata da captação. Os títulos têm isenção de imposto de renda para as pessoas físicas, mas parte desse ganho fica com os bancos, que emitem as letras a uma taxa inferior em relação a outros instrumentos, como os tradicionais Certificados de Depósito Bancário (CDB).
O estoque de LCI e LCA encerrou o mês passado em R$ 371 bilhões, 46% acima de maio de 2014. Para efeito de comparação, o saldo dos CDBs, principal instrumento de captação bancária e que não possuí o benefício fiscal, registrou uma queda de 11% no mesmo período, para R$ 511 bilhões.
A recente queda na captação com as letras de crédito tem relação direta com as mudanças das regras de emissão, segundo Carlos Ratto, diretor-executivo comercial e de produtos da Cetip. “Foi uma soma das duas medidas, mas também um reflexo da situação econômica, que reduziu a necessidade de captação dos bancos”, disse.
O crescimento das letras despertou críticas de que a isenção de imposto provoca uma distorção em relação a outras modalidades de aplicações. A Anbima defende a extensão do benefício aos fundos que compram LCI e LCA.
A expectativa de mudança na tributação das letras ajudou a reforçar a demanda pelos títulos nos primeiros meses do ano, segundo Fábio Dutra, diretor comercial e de desenvolvimento de mercados da BM&FBovespa. “Mesmo com a queda, as emissões neste mês ainda seguem em um patamar semelhante ao do ano passado”, disse. Além do apetite do investidor, ele afirmou que a velocidade das captações daqui para frente dependerá da estratégia de cada banco.
Na visão do menos executivo de um grande banco, a recente queda na emissão das letras está mais ligada a questões de demanda do que de oferta. “De uma maneira geral, as pessoas estão com menos recursos para investir, o que tem afetado as emissões de letras em geral”, disse.
“Na LCA, havia uma oferta de títulos com liquidez diária, que acabou quando o BC determinou o prazo mínimo de 90 dias para o resgate”, afirmou o executivo, para quem o direcionamento dos recursos da LCA teve um papel secundário na queda das emissões. Na letra imobiliária, o impacto da mudança no prazo foi menor porque os títulos já não contavam com liquidez diária. Ele espera alguma recuperação nas emissões quando as mudanças forem absorvidas pelos investidores.
Fonte: Valor Econômico