Se a recente queda de preço das commodities agrícolas e metálicas se prolongar ao longo de 2015, a economia brasileira poderá crescer ainda menos que o previsto no ano que vem, segundo análise de economistas ouvidos pelo Valor .
A Nomura Securities, por exemplo, estima em relatório divulgado semana passada que o recuo prolongado de preços faria o Produto Interno (PIB) do Brasil crescer 1,8% no próximo ano, em vez de 2,1%, estimativa que é o cenário-base da instituição. De acordo com a Nomura, 70% das exportações do Brasil são commodities, com minério de ferro, soja e petróleo bruto sendo os três principais produtos.
Sílvio Campos Neto, economista-sênior da Tendências Consultoria Integrada, destaca que, embora as matérias-primas em geral sejam relevantes na pauta exportadora, o Brasil seria mais sensível à queda dos preços dos minérios. A previsão da consultoria é que os preços do minério fechem 2014 com queda de 10%. Para Campos Neto, os preços não devem se recuperar no ano que vem, porque há excesso de oferta no mercado global. “Isso certamente não favorece uma recuperação dos preços, o que limita a possibilidade de melhora da balança comercial no curto prazo.”
A queda nas cotações das commodities piora também a relação entre a evolução do preço das exportações e das importações, os chamados termos de troca, que têm sido favoráveis ao Brasil nos últimos anos, diz Rafael Bacciotti, da Tendências. O avanço dos termos de troca na última década estimulou o acúmulo de recursos vindos do exterior para financiar o aumento das importações no país, o que permitia o crescimento da absorção doméstica (consumo, investimento e gastos públicos) em ritmo mais rápido que o do PIB.
“Esse crescimento explicável pelo acúmulo de poupança externa não deve acontecer nos moldes que acontecia antes”, diz Bacciotti. Segundo ele, o cenário mudou. A perspectiva de que a China em desaceleração comprará menos commodities do que antes transformou o que até agora foi estímulo externo em limitador do crescimento brasileiro. “A renda deve se expandir de maneira mais alinhada ao PIB nos próximos anos. Isso é um desafio, porque não teremos mais o boom de commodities e o fluxo de capitais também deve se reduzir”, diz.
O cenário de menos recursos externos entrando no país ajuda a explicar a previsão da Tendências de desvalorização do câmbio nos próximos meses. A moeda americana deverá terminar 2015 em R$ 2,79, depois de fechar este ano a R$ 2,58. “Isso tem como fundamentos tanto a alta global do dólar, com expectativa de início de ajuste da política monetária americana, quanto a questão das commodities e dos termos de troca que não serão tão favoráveis como nos anos anteriores”, diz Campos Neto.
A Nomura prevê o dólar a R$ 2,70, impulsionado pela necessidade de compensar a queda dos termos de troca. “Se um choque de preços de commodities leva a um menor fluxo de recursos para o Brasil, forçando déficit em conta corrente menor, então a moeda teria de se desvalorizar ainda mais”, observa.
O cenário para as matérias-primas agrícolas, como soja e milho, também é desanimador do ponto de vista das exportações brasileiras, avalia Fábio Silveira, da GO Associados. Segundo ele, a cadeia produtiva agrícola já começa a sentir os efeitos da desvalorização dos preços. Só a soja -o Brasil exporta entre US$ 25 bilhões e US$ 35 bilhões por ano – acumulou queda em torno de 50% em apenas cinco meses de 2014. “Começou no segundo trimestre e caiu como um paraquedas”, diz Silveira.
Para ele, a principal causa da baixa nos preços dos alimentos vem do comportamento do mercado financeiro, e não de questões de oferta e demanda global. A baixa é influenciada, principalmente, pela percepção dos investidores de que os juros americanos subirão em 2015, em um momento em que as safras agrícolas ao redor do mundo oferecem excedente de produção.
“Temos o mundo financeiro interferindo bastante na formação dos preços agrícolas. É, sobretudo, a fuga de investidores desse mercado migrando para títulos de renda fixa”, diz Silveira. Ele prevê que os preços da soja caiam 15% em 2014 e outros 15% no ano que vem.
A baixa nos alimentos pode, por outro lado, favorecer o processo desinflacionário no Brasil. Na avaliação da Nomura, preços menores nas chamadas soft commodities (basicamente agrícolas) poderiam ter impacto positivo na inflação, criando espaço para uma resposta contracíclica a uma eventual desaceleração da economia. Já uma queda prolongada nos preços dos metais teria um impacto relativo maior no crescimento e no nível do câmbio, projeta a consultoria. De forma geral, “os preços das commodities têm impacto direto nas exportações e nos níveis de investimentos”, diz o relatório.
A Nomura, nas suas previsões, usa o índice CRB, que mede a variação de uma cesta de 19 commodities, entre alimentos, energia e metais. No cenário montado pela consultoria, após o recuo de quase 10% no terceiro trimestre, o CRB cairia mais 10% no quarto trimestre (até agora caiu 3%) e ficaria nesse nível ao longo de 2015, o que implica queda de 12% no ano que vem, na comparação com 2014.
Para o minério de ferro, Silveira prevê que os preços continuem em queda ao longo de 2015 e cheguem à faixa de US$ 90 a tonelada, após fechar 2014 em torno de US$ 95. “O biênio 2014-2015 será o fundo do poço de várias commodities, ainda tem uma pressão que vai se propagar para o ano que vem”, diz Silveira, que explica que a queda nos metais é reflexo da baixa nos preços das outras commodities, além de uma ampliação da oferta australiana.
Os preços do petróleo, prevê a GO Associados, devem cair 7% na média em 2014, fechando em torno de US$ 100, e sofrer nova queda, de mais 10%, no ano que vem. Apesar disso, o óleo deve influenciar positivamente a balança comercial em 2015, segundo Silveira, já que há expectativa, no Brasil, de aumento da produção e da exportação e de alguma redução da importação.
“O petróleo começou a ter aumento de produção no Brasil e já está em ritmo mais acelerado”, diz. Mesmo com a queda dos preços do óleo, o efeito do petróleo tende a ser positivo para o comércio exterior brasileiro. A projeção da GO Associados, em fase de revisão, é de superávit comercial de US$ 3 bilhões em 2014 e US$ 6 bilhões em 2015.
Fonte: Valor Econômico