Acordo entre União Europeia e Mercosul encerra fase de negociações

Para o Mercosul, os ganhos seriam de aumento do PIB de até 11,4 bilhões de euros (R$ 72,6 bilhões), mesmo com um comércio administrado na parte agrícola, ou seja, cotas (volumes quantitativos com tarifa menor).. Foto: Pixabay

 

 Agora começa a revisão legal e posterior apreciação pelos países – membros

Após 25 anos de tratativas, os representantes do Mercosul, reunidos na cúpula do bloco em Montevidéu nos dias 5 e 6 de dezembro, anunciaram que entraram em consenso com a União Europeia a respeito do acordo comercial entre os grupos. A visita de Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, que prestigiou o encontro de líderes no Uruguai, marcou o fim da fase de negociações. Agora, o documento deverá ser traduzido para as dezenas de idiomas dos países de ambos os continentes, revisado juridicamente e votado pelo parlamento europeu, além de chancelado pelos legislativos das nações envolvidas.

A assinatura, portanto, ainda deve demorar. Isso porque, além dos trâmites burocráticos, o acordo enfrenta forte resistência de alguns países, tendo a França como principal opositora. O país sofre com os protestos de agricultores locais, e costura apoios de Polônia, Bélgica, Holanda e Itália para tentar barrar a implementação da parceria. A votação no parlamento europeu requer a adesão de países que perfaçam pelo menos 65% da população do continente. O portal SNA vem acompanhando a relutância dos produtores europeus em enfrentar a concorrência sul-americana, em especial a brasileira. Confira = aqui

Com efeito, empresas como Danone e Carrefour, ambas francesas, levantaram dúvidas sobre o rigor sanitário da cadeia produtiva nacional, respectivamente de soja e carne. Também questionaram o compromisso brasileiro com boas práticas de sustentabilidade e preservação ambiental. Diante da repercussão negativa, recuaram, mas ficou demonstrado que o protecionismo agrícola europeu não será fácil de combater. O clima geral, no entanto, é de otimismo, como ficou claro nas declarações dadas na coletiva de imprensa em Montevidéu.

O presidente uruguaio, Lacalle Pou, anfitrião do encontro, disse: “Foram 25 anos de negociações. Hoje volto para casa mais tranquilo. A soma dos acordos frustrados gerava incerteza. Não é só um acordo comercial. Um acordo desse tipo não é solução, mas não há soluções mágicas”. Já Ursula von der Leyen enalteceu o êxito das negociações, parabenizando os profissionais que se empenharam por anos a fio. Ela destacou os números do novo livre mercado criado pelo acordo, abrangendo um contingente de 700 milhões de pessoas. Em suas palavras: “Demonstramos que as democracias podem se apoiar mutuamente. Esse tipo de acordo não é apenas uma oportunidade econômica, mas uma oportunidade política”.

Números e efeitos para o Agronegócio

A Comissão Europeia tem cálculos prontos para mostrar ganhos do acordo com o Mercosul: um aumento do Produto Interno Bruto (PIB) de até 15 bilhões de euros na UE, com as empresas europeias tendo acesso privilegiado (tarifa menor e outras vantagens) no Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai comparado a concorrentes chineses, americanos e outros. Para o Mercosul, os ganhos seriam de aumento do PIB de até 11,4 bilhões de euros (R$ 72,6 bilhões), mesmo com um comércio administrado na parte agrícola, ou seja, cotas (volumes quantitativos com tarifa menor).

Pelo acordo, a União Europeia se compromete a isentar 82% das importações agrícolas do Mercosul e dar acesso preferencial com menor tarifa para 97% dos produtos. Os membros do Mercosul, por sua vez, darão acesso aos europeus a 98% do comércio e 96% das linhas tarifárias. Produtos como suco de laranja, café solúvel, frutas, peixes, crustáceos e óleos vegetais terão suas tarifas eliminadas. Já carne bovina, de aves, de porco, arroz, açúcar, mel e etanol terão um valor estipulado por cotas para cada categoria.

No panorama geral do que foi acertado até agora, 92% dos produtos originários do Mercosul e 95% das linhas tarifárias devem ficar livres de taxações na União Europeia, segundo as preferências previstas no capítulo de bens. Para efeito comparativo, sem o acordo, apenas 24% das exportações que chegam à Europa são isentas de tarifas. A UE vai eliminar 100% de suas tarifas industriais em até dez anos. Já por parte do Mercosul, a previsão é liberar 91% das importações originárias da UE das cobranças. Na área industrial, a meta é cortar 91% das linhas tarifárias em até 15 anos.

Os envolvidos estimam que até meados de 2025 os trâmites de efetivação podem ser concluídos, mas a resistência de alguns países, como já foi dito, pode atrasar a entrada em vigor do acordo. Para o Brasil, é a oportunidade de ser o grande beneficiado entre os que integram o Mercosul, justamente num período de incertezas como alta do dólar, transição política nos EUA e perspectiva de guerra tarifária da gestão de Donald Trump com a China.

Também é um marco para o Mercosul, que, mais de três décadas após ser criado, tinha dificuldades de estabelecer parcerias mais robustas e duradouras. Agora, o bloco ganha em mercado, competitividade e relevância geopolítica, sobretudo num momento em que outras grandes potências buscam protecionismo e guerras tarifárias, como Estados Unidos e China. Também é uma alternativa às parcerias dos BRICS, bloco que o Brasil também integra.

Por Marcelo Sá – jornalista/editor e produtor literário (MTb 13.9290) marcelosa@sna.agr.br

 

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