Segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), os negócios em biotecnologia devem contribuir com 2,7% do PIB dos países mais ricos, em 2030, principalmente por meio da oferta de novos produtos industriais para a saúde e o agronegócio. A OCDE estima que 50% da produção global de alimentos e ração animal virão de organismos manipulados geneticamente.
Em relação ao cenário brasileiro, ainda há um bom caminho a ser percorrido. É o que revela Katia Aguiar, diretora da Sociedade Nacional de Agricultura. “O Brasil precisa aprender a lidar com a indústria da bioeconomia com estratégia e investimento. Também precisa de estímulos no mercado biocompetitivo. Estive recentemente com a Braskem, por exemplo, e eles já produzem plástico a partir de etanol. Mas é preciso ampliar os incentivos e fortalecer o mercado.”
Katia afirma que o mundo vive atualmente a era da biotecnologia, da agricultura de base biotecnológica, e que o Brasil tem um papel relevante nesse processo. “O país é líder de pesquisa na área de desenvolvimento de biocombustíveis, especificamente o etanol, e mostra ao mundo capacidade de oferecer soluções tecnológicas limpas para a adequação da matriz energética por meio de uma ótima fonte de energia renovável.”
Pesquisas
No campo das pesquisas em biotecnologia com aplicação agrícola, os avanços, em nível global, são notáveis. Uma busca no Pubmed – banco de dados da área médica – com a expressão “plant biotechnology” identifica duas mil publicações nas últimas décadas, com clara progressão na taxa de aumento anual de publicações.
“As novas metodologias de transformação genética de plantas vão contribuir de forma muito importante para a redução dos requerimentos regulatórios e dos custos de desenvolvimento. No âmbito das novas plantas que chegam ao mercado, sem dúvida aquelas com aumentos de produtividade e com tolerância a estresses abióticos, todas fruto de pesquisas ainda da década anterior, vão provavelmente mudar o cenário agrícola do país”, prevê Paulo Paes de Andrade, professor do Departamento de Genética da Universidade Federal de Pernambuco e ex-membro da CTNBio.
Segundo ele, os projetos em biotecnologia precisam ultrapassar a esfera governamental. “A pesquisa de ponta na área, aquela que traz novas descobertas, está sendo desenvolvida na Embrapa e nas universidades e centros públicos, e não nas estações experimentais das multinacionais no Brasil. Esta situação, contudo, tende a mudar rapidamente, com o investimento cada vez maior das grandes empresas em laboratórios de pesquisa no país”, observa o professor. “O investimento da iniciativa privada na biotecnologia agrícola seguramente chega à centena de milhão de reais por ano, mas em grande parte os estudos estão voltados para o desenvolvimento de um produto e não para a descoberta”, ressalta.
Produção x área
Mesmo assim, a adoção da biotecnologia continua a servir como parâmetro para a construção de um mundo sustentável. “Pesquisas indicam que até 2050 a população mundial deverá alcançar onze bilhões de pessoas, o que vai exigir que, no mínimo, seja dobrada a produção de alimentos e, de preferência, sem aumentar drasticamente a área plantada, minimizando assim o impacto sobre nossa biodiversidade. Não há outro caminho senão o uso de tecnologias que permitam maior produtividade por unidade de área”, conclui Katia Aguiar.
Gargalos
Por outro lado, de acordo com Paulo Andrade, há obstáculos a serem superados. “O Brasil até agora tem sido majoritariamente um importador de biotecnologia moderna para o setor agrícola. A razão principal disso é o elevado custo para o desenvolvimento e aprovação comercial de um produto novo no Brasil, que só pode ser bancado por grandes empresas ou pela Embrapa. Assim, o país está quase sempre atrás da fronteira da biotecnologia, com algumas exceções notáveis, como o feijão GM da Embrapa resistente ao vírus do mosaico dourado. Além disso, o Brasil não reconhece de fato a biotecnologia como atividade econômica. Também faltam agências certificadoras dos produtos do setor, que encontram grandes dificuldades de exportação para os mercados mais exigentes. Ainda assim, o país avançou tremendamente na adoção da biotecnologia agrícola moderna, com enormes ganhos.”
Na avaliação do professor, o mercado de milho e soja, na atualidade, é quase dominado pelas sementes GM, e a adoção do algodão transgênico vem crescendo bastante. “O produtor conta, por enquanto, apenas com plantas tolerantes a herbicidas e resistentes a insetos, mas isso já representa uma enorme vantagem e os ganhos têm sido significativos”.
Desafios
Porém, onde é preciso avançar? “Na redução dos custos regulatórios, na organização dos múltiplos esforços para apoiar o setor, por meio de uma política coerente e discutida com os vários atores e, claro, num aumento importante dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Poderemos seguir como importadores de tecnologia, mas sempre seremos, no máximo, o segundo lugar do mundo, a reboque dos detentores do conhecimento”, finaliza Paulo Andrade.
Na opinião da diretora da SNA, um dos desafios será “usar a biotecnologia para retirar etanol do bagaço e da própria biomassa da cana por meio de reações catalisadas por diversas enzimas conhecidas na natureza”.
Para Katia Aguiar, a biotecnologia vai precisar assumir cada vez mais sua importância no processo produtivo. “É a ferramenta tecnológica adicional para a agricultura. Impulsiona o crescimento do agronegócio nos países onde já são produzidos alimentos com essa técnica e tem exercido um papel relevante para aumentar a produtividade e atender a demanda por alimentos de uma população em contínuo crescimento.”
Por Equipe SNA/RJ