Mercado de orgânicos: produção de sementes é um dos gargalos do setor

Produção brasileira da maioria das frutas e hortaliças orgânicas utiliza sementes convencionais, não transgênicas e não tratadas. Foto: Divulgação/SNA

A obtenção de sementes orgânicas no Brasil é um dos principais entraves do setor. Atualmente, a produção é restrita, em grande parte, aos agricultores familiares. A Lei nº 10.711, referente ao sistema nacional de sementes e mudas, garante respaldo a essa atividade, mas não permite a comercialização de sementes no mercado.

Compras, vendas e trocas só podem ser realizadas entre os produtores, segundo Sylvia Wachsner, coordenadora do Centro de Inteligência em Orgânicos (CI Orgânicos) da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA).

“O setor de orgânicos no Brasil ainda está em formação, e os requisitos para a industrialização e comercialização de sementes é complicado e oneroso, conforme atestam as empresas que produzem sementes do gênero”, comenta.

 

PESQUISA E DESENVOLVIMENTO

Um dos desafios dessa produção, de acordo com ela, é a utilização de germoplasmas (recursos genéticos) adaptados às regiões brasileiras.

“Devem ser geradas tecnologias ecológicas e adotados métodos orgânicos de manejo dos cultivos. Além disso, é preciso criar métodos de controle de microrganismos associados às sementes”, explica a especialista.

Sylvia salienta ainda que “o melhoramento é uma das iniciativas para incrementar a pesquisa e o desenvolvimento de cultivares de hortaliças adaptadas ao manejo orgânico”.

Como as sementes não podem receber tratamento ou produto químico ou sintético no cultivo, nem no armazenamento, torna-se necessário elaborar tecnologias e pesquisas relacionadas com o uso de produtos alternativos.

“Durante todo o processo, a qualidade sanitária das sementes é muito importante. O local para a produção das sementes deve ser bem escolhido para que se evite problemas como a contaminação cruzada e a criação de barreiras naturais”, relata a coordenadora.

Similar às convencionais, as sementes orgânicas também dependem da aprovação do Registro Nacional de Sementes e Mudas (Renasem) e as empresas que produzem precisam ter unidades de beneficiamento.

 

USO DE CONVENCIONAIS

Existem alimentos anunciados como orgânicos, mas foram produzidos a partir de sementes convencionais? De acordo com Sylvia, a legislação orgânica brasileira só permite o uso de sementes convencionais, não transgênicas e não tratadas, no caso de não haver produção orgânica. Mas o período para a conversão de sistemas precisa ser respeitado.

“O processo de certificação orgânica, nesse caso, exige que os produtores comprovem a não disponibilidade no mercado de sementes orgânicas e também a utilização de sementes convencionais, não tratadas”, diz a especialista.

Em 2014, o governo brasileiro constatou que não havia oferta suficiente de sementes orgânicas para atender à demanda nacional e determinou, dois anos depois, que as Comissões Estaduais de Produção Orgânica publicassem uma relação de sementes orgânicas disponíveis. No momento, essas listas estão em fase de elaboração.

 

FRUTAS E HORTALIÇAS

A coordenadora do CI Orgânicos destaca que a produção brasileira da maioria de frutas e hortaliças orgânicas utiliza sementes convencionais, não transgênicas e não tratadas.

“As autoridades acreditavam que essa contradição poderia acabar no passado, mas essa prática teve de ser prorrogada para adaptar-se à realidade nacional.”

Atualmente, médios produtores de hortaliças orgânicas, que cultivam diversas variedades, recorrem ao mercado convencional, assim como os pequenos agricultores.

“O governo teve de permitir o uso de sementes convencionais, até que possam existir no mercado sementes orgânicas para suprir esse vazio. Caso contrário, o crescimento da produção orgânica seria reduzido”, observa Sylvia.

 

“O governo teve de permitir o uso de sementes convencionais, até que possam existir no mercado sementes orgânicas para suprir esse vazio. Caso contrário, o crescimento da produção orgânica seria reduzido”, observa Sylvia Wachsner, coordenadora do Centro de Inteligência em Orgânicos da SNA. Foto: Arquivo SNA

INICIATIVAS

Aos poucos, alguns centros de pesquisa começam a lançar sementes orgânicas de cultivares com maior demanda, para uso dos agricultores familiares. Dessa forma, a Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, elaborou sementes de milho orgânicas.

Essas opções que já estão na segunda geração e têm ampla adaptabilidade nas diversas regiões do Brasil, com potencial de produção de até oito toneladas por hectare.

Na iniciativa privada, a empresa mineira Grãos Orgânicos produz milho e feijão de porco, e ainda estuda a apresentação de outras cultivares. As sementes de milho são da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e os campos e unidades de beneficiamento são certificados pelo Instituto Biodinâmico IBD (auditoria).

A sede da empresa é uma fazenda localizada numa área de matas, que favorece o controle biológico pelos insetos. “A falta de milho orgânico é um dos gargalos da cadeia orgânica animal brasileira”, aponta a coordenadora da SNA.

Na União Europeia, os orgânicos são produzidos a partir de sementes específicas e, além disso, há um banco de dados que reúne todas as espécies disponíveis para os agricultores de lá.

“Quando um produtor decide cultivar uma variedade não relacionada, ele precisa de autorização para utilizar sementes convencionais”, reforça Sylvia.

 

GREEN RIO

Assuntos relacionados à produção de sementes orgânicas serão debatidos durante a próxima edição do Green Rio, evento programado para o período de 11 a 13 de maio, na Marina da Glória, Rio de Janeiro, com o patrocínio do Serviço de Apoio a Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e de outras instituições.

O CI Orgânicos/SNA e o Planeta Orgânico (organizador do evento) vão promover, no dia 11 do próximo mês, um debate sobre os desafios e oportunidades no mercado de sementes orgânicas, que contará com a presença de pesquisadores e empresas do setor.

“Ao pensar em produtos orgânicos, falamos de um mercado diferenciado e de maior valor agregado. Nosso interesse é justamente debater o desafio para a pesquisa e como atrair empreendedores e empresas dispostas a investir nesse nicho de mercado. São investimentos importantes, que teriam um retorno econômico no médio prazo”, destaca Sylvia.

 

Por equipe SNA/RJ

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