Pela primeira vez, desde sua edição inicial em 2003, o Rio Info – evento dedicado à Tecnologia da Informação (TI), abriu espaço para o agronegócio.
O tema ‘Conectividade e Inteligência no Campo’ foi debatido por instituições como Embrapa, Ministério da Agricultura, Sociedade Nacional de Agricultura (SNA) e Secretaria de Agricultura do Rio de Janeiro. Na ocasião, entidades e empresas mostraram suas ideias inovadoras com um objetivo em comum: oferecer melhorias ao agro.
A SNA, com apoio do Ministério da Agricultura e da Embrapa, promoveu quatro paineis no dia 17 de setembro, no Centro de Convenções Sul América, abordando os temas ‘Caminhos para inovação no agro’,’Revolução das agtechs’, ‘Desafios são oportunidades no campo’ e ‘Agricultura 4.0 em busca de parceiros’.
O primeiro painel,“Caminhos para Inovação no Agro”, foi mediado por Jorge Ávila, diretor técnico da SNA e pró-reitor de Extensão da UniRio. Presente à mesa, José Carlos Polidoro, pesquisador da Embrapa, celebrou a oportunidade de colocar o agro em evidência no RioInfo. “Há muito o que se descobrir neste tema voltado para conectividade no campo”, comentou.
Digitalização da economia
Luiz Claudio de França, diretor do Departamento de Apoio à Inovação para a Agropecuária do Ministério da Agricultura, conversou sobre os principais projetos para a digitalização da economia no campo e falou sobre a era de transição para a Agricultura 4.0, que tem por objetivo gerenciar dados em tempo real.
Para França, entre os principais entraves para a tecnologia estão a baixa cobertura de redes; a escassez de linhas de crédito para investimento em pesquisa e desenvolvimento (P&D) de serviços de TI; o desconhecimento do uso da agrobiodiversidade e a necessidade de investimentos em cloud e data centers. “O ministério une esforços para tentar combater esses entraves, além de fomentar a inovação no campo”, disse o palestrante.
Ele revelou ainda que o Ministério da Agricultura fez um estudo com o propósito de encontrar os melhores lugares para a implantação de linhas 3G e 4G, com o objetivo de promover melhorias e conectividade no campo. As informações devem ser divulgadas na próxima semana.
Arranjos Produtivos Locais
Felipe de Abreu Cáceres, subsecretário de Indústria e Comércio, Serviços e Ambiente de Negócios do Estado do Rio de Janeiro, explicou aos participantes como funcionam os Arranjos Produtivos Locais, que são aglomerações de empresas localizadas em um mesmo território, com especialização produtiva, interação, cooperação, competitividade e aprendizagem entre si e também em relação a outros atores locais.
“O principal objetivo dos APLs é promover e fomentar o desenvolvimento regional de acordo com as vocações econômicas locais”, comentou Cáceres. O subsecretário também revelou que a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Emprego e Relações Internacionais (SEDEERI-RJ) e a Secretaria de Agricultura do Rio já atuam em parceria com APLs no setor de agronegócio nos segmentos de cachaça, cerveja artesanal e café do noroeste fluminense.
Ainda durante o primeiro painel, Petula Nascimento, pesquisadora da Embrapa, recebeu homenagem de Alberto Blois, diretor geral da Rio Info, pela idealização e realização do painel Agrotic na edição 2019 do RioInfo.
Tecnologia e crédito
Adriano Martins Carneiro Lopes, subsecretário Adjunto de Agricultura Familiar do Estado do Rio de Janeiro, ressaltou a importância do programa Cidades Rurais, em que a Embrapa, as universidades e secretarias atuam como parceiras. “O conceito geral é que a gente tenha regularidade produtiva com acesso à crédito e uma viabilidade de preços. Pensando nisso, a gente precisa trabalhar capacitação e uso da tecnologia associada ao crédito para gerar acesso à mercado. São pressupostos básicos que falar é muito fácil, mas fazer é extremamente difícil”, disse Lopes.
Conectividade
Alexandre Dal Forno, Head de Produtos B2B e Soluções IoT da Tim Brasil, falou sobre seus objetivos de levar conectividade ao campo e sobre a constante busca para entender as necessidades do agronegócio a fim de que o setor possa evoluir.
“Sem conectividade não é possível se ter Agricultura 4.0. A conectividade é o grande habilitador ”, disse Dal Forno. “Nosso objetivo é nos tornarmos os maiores parceiros de conectividade e soluções IoT no agronegócio brasileiro”, complementou o palestrante, que também apresentou o projeto Conectar AGRO, uma iniciativa de oito grandes empresas em prol da conectividade no campo, com a utilização da tecnologia 4G em 700 megahertz.
Cada empresa que integra essa iniciativa está contribuindo com suas expertises para viabilizar um ambiente mais digital nas áreas rurais.
TICs
Silvia Maria Massruha, chefe geral da Embrapa Informática Agropecuária, traçou um panorama sobre a evolução das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) na agricultura, apresentou algumas das ferramentas da empresa voltadas para a edição de genes e aplicativos mobile, e destacou projetos de políticas públicas como o ZARC, RenovaBio, Pronasolos e Plano ABC.
“Há 30 anos, a Embrapa já pensava em tecnologia no agro”, disse Massruha. Para ela, “a principal ruptura no mercado não é a tecnologia, mas o consumidor”. A especialista explicou que cada vez mais os consumidores querem ter informações daquilo que consomem e exigem produtos de qualidade. “Para o Brasil continuar sendo protagonista no agronegócio, ele vai precisar agregar a tecnologia”.
Massruha também falou sobre o conceito de Sociedade 5.0 adotado pelo Japão, que ela acredita ser o próximo foco da tecnologia no Brasil e que deverá merecer atenção especial. “A Sociedade 5.0 está centrada no homem, que equilibra o avanço econômico com a resolução de problemas sociais por meio de sistemas que integram o espaço físico e o ciberespaço”.
Agtechs
O segundo painel dos debates sobre tecnologias voltadas para o agro abordou a revolução das Agtechs, e foi coordenado por Ronaldo Oliveira, pesquisador da Embrapa Solos.
Roberto Miyano, diretor de Tecnologia da Ceptis Agro, apresentou o case da companhia. A Ceptis Agro é uma divisão estratégica da Ceptis dedicada ao desenvolvimento do agronegócio e que tem como missão elaborar soluções tecnológicas de segurança para garantir a proteção da origem e da qualidade das sementes produzidas no Brasil.
“A plataforma é a ponte que capta a informação de tudo o que acontece no campo e passa para a mão do consumidor da cidade”, definiu Miyano.
Para transmitir a informação sobre sementes de forma clara e com credibilidade para o consumidor, Miyano mostrou sua estratégia baseada em criar a identidade do produto para autenticá-lo, criar seu histórico e elaborar uma estratégia de inteligência empresarial.
Bioinsumos
James Waterhouse, diretor técnico da Santos Lab, chamou a atenção para o uso exagerado de bioinsumos em infestações no campo, que não ocorre de forma uniforme e sim por meio de pontos específicos.
“Nós temos de melhorar a sustentabilidade do agronegócio”, disse o especialista, que realiza pela empresa onde atua o sensoriamento aéreo para a avaliação da qualidade da cultura nos campos. Os resultados são apresentados por aplicativo ao agricultor. “Transformamos dados em recomendações precisas que garantem o melhor resultado para o produtor”, explicou Waterhouse.
O trabalho realizado, segundo ele, favorece o aumento da produtividade; a redução do uso de insumos caros e de impacto ambiental; o aumento do sequestro do carbono no solo e o aumento considerável da sustentabilidade na atividade agrícola.
Polo de inovação
Maurício Guedes, diretor de Tecnologia da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), defendeu a necessidade de melhorias no campo da inovação e revelou algumas ações que serão realizadas pelo órgão.
Entre as novidades, Guedes anunciou um convênio assinado em maio pela Embrapa e pela Secretaria de Ciência e Tecnologia do Estado do Rio de Janeiro, que prevê a instalação de um polo de inovação do agro no Jardim Botânico. “Esse pólo será uma rede envolvendo uma série de instituições, unidades da Embrapa, universidades e empresas para desenvolver soluções para o agro”, revelou.
Preservação dos solos
No painel “Desafios são oportunidades no Campo”, coordenado por José Carlos Polidoro, chefe geral da Embrapa Solos, os palestrantes abordaram temas relacionados à preservação dos solos e à recuperação de pastagens, com foco no uso de tecnologias.
Silvio Bhering, pesquisador da Embrapa Solos, disse que a agricultura tem como desafios “aumentar a produção e preservar os recursos naturais” e ressaltou que, com a ajuda da tecnologia, tornou-se possível o desenvolvimento do Programa Nacional de Solos do Brasil (Pronasolos). Segundo Bhering, o programa é uma plataforma tecnológica que garante o mapeamento dos solos no País, com a inserção de áreas protegidas e áreas de expansão agrícola (troca de pastagens por agricultura), permitindo ainda a adoção de práticas de conservação ambiental, incluindo a preservação de recursos hídricos.
Guilherme Chaer, pesquisador da Embrapa Agrobiologia, apresentou um software para o cálculo dos Índices de Qualidade do Solo (IQS). “A qualidade está relacionada ao uso e ao tipo de solo”, afirmou Chaer, que destacou entre as vantagens deste software a produção e edição de índices de monitoramento ambiental e agrícola, a indicação de práticas de manejo e a avaliação de fatores como sustentabilidade e qualidade do solo.
“A ferramenta também pode ser usada como incentivo para que o produtor preserve os solos”, disse o pesquisador. O sistema, que já dispõe de 210 indicadores ambientais, ainda está em processo de desenvolvimento. Seu lançamento no mercado está previsto para março de 2020. No entanto, uma versão mais simples, online (para desktop), deverá ser lançada em outubro desse ano.
Classificação
Outro programa do gênero foi apresentado pelo pesquisador Luis de França Neto, da Embrapa. O Smart Solos é uma plataforma voltada para a classificação automática dos solos, a partir da coleta manual de dados e análises de laboratório. Além disso, possibilita a criação de perfis de usuários, a padronização de formulários, o processamento em nuvem e pode ser utilizado offline. Segundo França Neto, até o final do ano deverá ser entregue um protótipo do programa em duas versões. A meta, de acordo com o pesquisador, é disponibilizar a plataforma para o consumidor final em sistema Android e iOS.
O pesquisador chamou a atenção para o fato de que o desenvolvimento do programa visa a suprir, de certa forma, a dificuldade de obtenção de dados sobre solos, a escassez de técnicos especializados e a carência de uma base única de informações.
França Neto destacou ainda como desafios das novas funcionalidades da plataforma, a capacidade de se comunicar com outros aplicativos da Embrapa, a identificação visual dos padrões do solo com o uso de câmera e a possibilidade de acesso à realidade virtual.
Sensores
Ao abordar aspectos relacionados a sensores de solo e Internet das Coisas (IoT), Geraldo Cernichiaro, pesquisador do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), defendeu o desenvolvimento de sensores mais acessíves, a qualificação de usuários e um sistema inteligente de suporte à agricultura. “Existe uma carência de automação e de sensores inteligentes no setor”, afirmou o pesquisador, acrescentando que a automação “é uma questão estratégica e fundamental”.
Pastagens degradadas
Em seguida, Margareth Simões, pesquisadora da Embrapa Solos, chamou a atenção para a importância do uso da tecnologia na localização de pastagens degradadas e em sua posterior reinserção no sistema produtivo.
“No Brasil, há um grande desperdício de solo e água”, declarou Simões, enumerando como desafios ao processo de recuperação a utilização da tecnologia agronômica – como por exemplo o sistema de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) para melhorar a qualidade das pastagens; o uso da tecnologia de informação espacial destinada à localização, qualificação e reintegração de áreas; a adoção de ferramentas como o Big Data para o sensoriamento remoto, permitindo a geração de informação e conhecimento, e, por fim, a adesão à tecnologia Reinsentec, que permite verificar os níveis de degradação do solo para criar soluções.
“O que é melhor? Reinserir áreas degradadas ou criar novas fronteiras agrícolas?”, questionou a pesquisadora, que se mostrou favorável às parcerias público-privadas para o financiamento de projetos tecnológicos. “É preciso sistematizar o conhecimento e levá-lo ao produtor por meio da tecnologia”, concluiu.
Serviços ecossistêmicos
Finalizando o painel, Raquel Prado, pesquisadora da Embrapa Solos, falou sobre os desafios da Tecnologia de Informação (TI) no âmbito dos serviços ecossistêmicos (benefícios que o homem recebe dos ecossistemas) na agropecuária.
Prado citou, entre as demandas na área de TI, a automação da coleta de dados para a redução de custos e obtenção de informação em tempo real (com acesso do produtor a técnicas locais); a adoção de um sistema digital integrado para facilitar a gestão da água, além de sistemas de certificação e rastreamento e de alerta e transmissão de dados para conferir maior eficiência à irrigação, entre outros.
A pesquisadora também falou sobre a necessidade de criação de uma plataforma para subsidiar os mercados de serviços ecossistêmicos, com o mapeamento de investidores, e mencionou algumas iniciativas sustentáveis de start-ups (cleantechs) focadas na melhoria da produtividade, na eficiência e na diminuição do desperdício nas cidades.
Agricultura de precisão
O último painel dos debates – coordenado por Luis Carlos de França, diretor do Departamento de Apoio à Inovação para Agropecuária do Ministério da Agricultura, foi dedicado à Agricultura 4.0.
O pesquisador da Embrapa Solos, Ronaldo de Oliveira, abordou aspectos da agricultura de precisão, que foi definida por ele como um sistema de “monitoramento intensivo para uma gestão localizada” e também como uma “estratégia de manejo onde o planejamento é um fator essencial”.
Oliveira mencionou que a agricultura de precisão no País tem crescimento médio anual de 13,6% e que a previsão global de investimentos no setor para 2021 gira em torno de 4,2 bilhões de euros. O pesquisador explicou ainda que o sistema possui duas vertentes: “tecnológica” (citando como exemplo o uso de drones e nanodrones), e “agro”, voltada para a definição de áreas prioritárias, identificação das zonas de manejo do solo, verificação da variabilidade espacial e de culturas e utilização de sensores. “Atualmente, a agricultura de precisão é aplicada em mais de 50% das grandes fazendas do País”, informou Oliveira.
Processamento de dados
Gustavo Vasques, também pesquisador da Embrapa Solos, explicou o processo de condutividade elétrica do solo com sensores, com o objetivo de melhorar a coleta e o processamento de dados, e falou sobre a questão da conectividade limitada no campo.
Regiões serranas
Renato Linhares, da Embrapa Agrobiologia, ressaltou as principais características da agricultura praticada em regiões serranas, apontando demandas para a sua eficiência, entre elas, a expansão da produção, a atração de investimentos e capitais e ganhos de produtividade e competitividade, além de fatores como inovação e desenvolvimento sustentável.
Nesse sentido, Linhares defendeu a implementação de “um novo modelo de produção baseado na economia de baixo carbono, na preservação ambiental, no uso sustentável dos recursos naturais e na responsabilidade social”. O pesquisador também chamou a atenção para alguns desafios inerentes ao desenvolvimento da agricultura em áreas montanhosas, destacando, entre outros, o monitoramento climático para irrigação; a análise da fertilidade dos solos; o uso de Veículos Aéreos não Tripulados (VANTs); a opção por uma produção diferenciada; a educação no campo adequada à realidade local, e investimentos em internet rural e tecnologias da informação e comunicação.
Controle biológico
Em termos de inovação, Alessandra de Carvalho Silva, pesquisadora de controle biológico da Embrapa Agrobiologia, apresentou um novo aplicativo para o reconhecimento dos ‘inimigos’ naturais das pragas agrícolas. O InNat, segundo Silva, “é uma ferramenta para reconhecer e obter informações sobre os agentes naturais de controle de pragas”.
A especialista explicou que, ao usar o aplicativo para reconhecer os agentes presentes nos sistemas de cultivo agrícola – neste caso, insetos e aranhas, “o agricultor pode avaliar se as práticas agrícolas adotadas em sua propriedade estão adequadas, pois se houver muitos inimigos naturais na área de produção significa que as práticas estão corretas, preservam os agentes naturais de controle e os problemas provocados pelas pragas serão menores”.
O reconhecimento de inimigos naturais com o aplicativo também pode ser usado para quem já adota o Controle Biológico Aplicado ou o Manejo Integrado de Pragas. Até o momento, o app está disponível apenas no sistema Android.
Embalagens
O pesquisador da Embrapa Agroindústria de Alimentos, Antonio Gomes Soares, mostrou como a TI pode ser útil no desenvolvimento de embalagens para alimentos, como forma de aumentar sua vida útil e reduzir o desperdício. Na ocasião, ele enfatizou que “o Brasil precisa criar softwares para o desenvolvimento de modelos virtuais de embalagens, que posteriormente poderão se transformar em protótipos”, e acrescentou que “os modelos existentes são importados e de alto custo”.
Soares também falou sobre a importância das embalagens ativas e inteligentes. As primeiras, segundo ele, preservam a qualidade e a vida dos produtos, como aquelas que eliminam o gás etileno para evitar a continuidade do amadurecimento após a colheita, no caso das frutas, hortaliças e legumes; ou as que contam com emissão de etanol, para preservar pães e bolos.
Já as embalagens inteligentes fornecem informações sobre alterações químicas, oscilações de temperatura e a qualidade do produto. Para isso, disse o pesquisador, essas embalagens contém sensores que monitoram fatores que podem alterar a qualidade do produto, como as temperaturas da central de distribuição até o consumidor final. A embalagem também possui um selo que mostra as modificações na qualidade do produto.
OGMs
No campo da biossegurança, a pesquisadora Edna Maria Oliveira, da Embrapa Agroindústria de Alimentos, apresentou biossensores utilizados para a análise de alimentos, com aplicação na rastreabilidade e detecção de Organismos Geneticamente Modificados (OGMs). Oliveira explicou que, por meio de um teste de fita, é possível saber se em determinado alimento transgênico ocorreu a síntese de proteínas. Caso contrário, disse ela, “é necessário localizar sequências específicas de DNA para corrigir o problema”.
Os biossensores, produzidos com cristais de quartzo, também podem ser aplicados na localização de fontes de glúten para celíacos e na detecção de adulterantes em cafés.
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