IPCA balizará juros de parte do crédito rural

A equipe econômica do governo ganhou a queda de braço que travava com o Ministério da Agricultura desde o ano passado e no próximo Plano Safra (2018/19) vai atrelar os juros de uma parte das operações de crédito para o custeio agropecuário ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Em fase de testes, essa terceira modalidade de financiamento envolvendo crédito rural terá a taxa de juros corrigida pelo IPCA vigente no mês da contratação, mais um percentual ainda a ser definido.

Os outros dois modelos de operações de crédito rural à disposição dos produtores são o que estabelece juros controlados e subsidiados pelo Tesouro, já tradicional, e o que prevê juros livres. A novidade atrelada à inflação, defendida sobretudo pelo presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, começará a valer em 1º de julho, quando o próximo Plano Safra, que deverá ser anunciado esta semana, entrará em vigor.

A medida não depende do Congresso, mas precisa do crivo do Conselho Monetário Nacional (CMN). O Manual de Crédito Rural já permite que linhas do Plano Safra sigam a lógica. É o caso do Prorenova, voltado à renovação de canaviais, cuja taxa é composta por TLP (Taxa de Longo Prazo), variável, mais 3,7% ao ano.

O novo formato de financiamento será opcional. No momento da contratação do crédito, o produtor poderá escolher entre a modalidade com taxa variável ou pelo crédito com juro fixo pré-fixado pelo governo. Na safra atual (2017/18), a taxa de juros das operações de custeio é de 8,5% ao ano, percentual que deverá cair para 7,5% ao ano no ciclo 2019/20.

Segundo uma fonte graduada do governo, o crédito rural com taxa variável deverá representar até 5% do total de recursos destinados ao custeio no próximo Plano Safra. No plano atual, que terminará no dia 30 deste mês, estão previstos R$ 150.2 bilhões para financiamentos de custeio, e a expectativa é que o montante gire em torno desse patamar em 2018/19.

Dessa forma, a taxa variável balizaria empréstimos da ordem de R$ 7.5 bilhões. Em 2017/18, foram disponibilizados R$ 188.3 bilhões para todas as operações de credito rural no país, incluindo custeio, comercialização e investimento.

A nova modalidade será ampliada no futuro apenas em caso de boa aceitação na próxima temporada. “A ideia é fazermos um teste para ver o que faremos nos próximos anos. Se os produtores gostarem da opção, poderemos aumentar o montante de crédito rural com taxa variável à disposição sem problemas fiscais. Mas é importante que, em primeiro lugar, os produtores entendam como essa inovação vai funcionar”, afirmou a fonte.

Até meados do ano passado, nas negociações para definir o atual Plano Safra 2017/18, o Banco Central vinha propondo que taxa básica de juros (Selic) fosse uma espécie de indexador para os contratos de crédito rural. A ideia previa fixar a taxa dos empréstimos para custeio e investimento em 85% da Selic, e para o Pronamp (linha destinada a médios produtores) em 70%.

Desde então, amadureceu no BC a ideia de algumas alas do segmento agropecuário de usar a inflação como referência, de forma a acompanhar custos com mão-de-obra e energia elétrica, por exemplo. Mas alguns segmentos do agronegócio ainda encaram as taxas variáveis com ceticismo.

No começo das negociações em torno do Plano Safra 2018/19, no fim de março, o então secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Neri Geller, chegou a declarar, em evento em Lucas do Rio Verde (MT), que os “juros flutuantes” estavam descartados no crédito rural.

No fim da queda de braço, porém, falou mais alto o argumento do BC de que o espaço no orçamento reservado para a equalização das taxas de juros do crédito rural está ficando cada vez mais apertado, já que o cenário ainda é de déficit fiscal e teto de gastos públicos no país, que pode ser “driblado” com as taxas variáveis.

Nesse contexto, a equipe econômica pressiona para, assim que possível, ampliar a adoção dos “juros flutuantes” no crédito rural. Isso depois de ter conseguido implementar a Taxa de Longo Prazo (TLP) e de editar uma Medida Provisória para aplicar juros variáveis em financiamentos com recursos dos fundos constitucionais.

Para o consultor Ademiro Vian, ex-diretor da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), as taxas flutuantes das operações de crédito rural são pouco atraentes para os produtores e a adesão tende a ser tímida na safra 2018/19. Isso porque sempre haverá o risco de a inflação oscilar ao longo da safra de tal forma a tornar a taxa variável mais pesada que a fixa.

“Esse modelo só faz sentido se a inflação tiver viés de baixa. Se estiver em trajetória de alta, não compensa”, disse Vian. “Hoje não vejo ninguém querendo contratar taxas voláteis no setor agrícola. O produtor quer contratar crédito com taxa fixada para ter mais previsibilidade, principalmente em tempos de turbulência política e de valorizações do dólar do preço do barril do petróleo”, afirma.

 

Fonte: Valor Econômico

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