Embora os preços das terras agrícolas tenham continuado a apresentar oscilações expressivas em algumas regiões do país em 2017, as incertezas políticas e econômicas que marcaram a cena nacional frustraram a expectativa de retomada de negócios. É o que aponta o “Agrianual 2019 – Anuário da Agricultura Brasileira”, publicação da IEG/ FNP que começou a circular esta semana.
Ao Valor, Márcio Perin, analista em terras da Informa FNP, Roberto Souza, diretor técnico da consultoria, e Victor Carvalho, gerente do Agrianual, afirmaram que o comportamento desse mercado não mudou em 2018, mas que esperam uma retomada de transações a partir de meados do próximo ano, desde que a economia confirme as expectativas e apresente reação mais palpável.
“No início de 2018 havia a expectativa de que o mercado de terras poderia iniciar um processo de recuperação, com melhora de liquidez dos negócios e aumento dos preços. Entretanto, o que se observou no primeiro semestre do ano foi o agravamento da instabilidade política, reforçada por incidentes como a greve dos caminhoneiros, que desencadeou deficiências de abastecimento por todo país”, informou a publicação.
Em tempos de conjuntura nebulosa, lembrou Márcio Perin, normalmente a terra se torna um “ativo de segurança, a última coisa que um produtor rural vende”. Daí as poucas notícias de negócios efetivamente fechados em 2017 e 2018. Mas também não houve transações com grandes descontos como algumas observadas em 2015 e 2016. “Havia um temor de que essa tendência fosse se generalizar, e apesar de o setor agrícola ter navegado por águas turbulentas a espiral negativa não aconteceu”, disse ele.
Particularmente no segmento de soja, observou Perin, os bons preços e a rentabilidade produtiva no campo diminuíram a pressão por negociações forçadas, aliviando a sensação de que haveria uma multiplicação de pedidos de recuperação judicial por parte de empresas de produtores rurais. Houve alguns casos, é verdade, mas a marola não se transformou em uma onda. “Foram mais raios e trovões do que chuvas,” comparou o analista.
Mas, apesar das raras compras e vendas, os valores das terras agrícolas continuam a subir e descer. Segundo o Agrianual, a maior valorização de 2017 foi registrada em áreas de média capacidade de produção de café em Barra da Estiva, na Bahia, onde o hectare alcançou, em média, R$ 5.583, 40% mais que em 2016. Áreas de pastagens nos municípios de Castanhal, no Pará, e Gaúcha do Norte, em Mato Grosso, e áreas de grãos em Boa Vista e Bonfim, em Roraima, também registraram valorização de mais de 30% (ver infográfico abaixo).
Também houve fortes quedas. Áreas de cerrado em Vilhena, em Rondônia, tiveram desvalorização de 19% em relação a 2016, para uma média de R$ 2.000,00 por hectare. Pastagens em Janaúba, em Minas Gerais, Crateús, no Ceará, e Pimenta Bueno, em Rondônia, além de uma região de floresta amazônica em Ariquemes, também em Rondônia, perderam entre 14% e 17% de seus valores nominais, conforme levantamento que consta na publicação.
Na maioria dos casos, disse Perin, o valor nominal da terra agrícola acompanha os preços das commodities, reflete a repetição de boas ou más condições climáticas e “precifica” a infraestrutura logística à disposição em uma determinada região. Mas há correções e ajustes que independem desses fatores. Podem ser provocados, por exemplo, pela construção de um condomínio residencial próximo ao perímetro urbano de um polo de produção agropecuária. Ou simplesmente por um banho de realidade.
No balanço parcial da FNP sobre o comportamento dos preços nos dez primeiros meses deste ano, a maior valorização em outubro foi registrada em uma área de produção de café arábica em Vitória da Conquista, na Bahia: 33,3% em relação ao mesmo mês de 2017, para R$ 8.000,00 o hectare. No polo de grãos de Unaí, em Minas Gerais, houve alta de 26,7%, para R$ 19.000,00 o hectare, e o terceiro maior avanço, de 25%, para R$ 5.000,00, foi numa região de olericultura em Irecê, na Bahia.
Na contramão aparecem áreas de pastagem formadas em Alagoinhas, na Bahia (com queda de 12,5% em outubro, para R$ 3.500,00 o hectare), e de Cerrado em Tangará da Serra e Pontes e Lacerda, em Mato Grosso, com baixas de 12,5% e 12%, respectivamente, para R$ 3.500,00 e R$ 2.200,00 o hectare. “Em 2019, será página virada. A expectativa do mercado é de continuidade das reformas nos primeiros meses do próximo governo, o que pode ajudar a destravar o mercado de terras. Mas também será preciso entender quais serão as políticas voltadas ao setor e à infraestrutura”, afirmou Perin.
Outro ponto que ajuda a conter as transações e que poderá ter alguma definição na era Bolsonaro é a compra de terras por estrangeiros. “Há novos rumores de flexibilização, só que também precisamos esperar um posicionamento mais claro do presidente eleito e do novo Congresso sobre a questão. Há grande expectativa, mas também muita gente já cansada de esperar”, disse o analista. Bilionário, o mercado de terras agrícolas carece de dados consolidados sobre transações efetivamente realizadas, uma vez que as transações são registradas em cartórios espalhados por todo o país.
Fonte: Valor Econômico