Os Estados Unidos continuam a elevar o tom das reclamações contra políticas agrícolas de parceiros comerciais. Dias depois de denunciar a China na Organização Mundial do Comércio (OMC) pelos subsídios bilionários concedidos por Pequim a produtores de arroz, trigo e milho, o país voltou a reclamar, em reunião do Comitê de Agricultura do órgão, das políticas de apoio do Brasil para milho, algodão e trigo. E a ofensiva não para por aí. Em pleno período eleitoral, o governo Obama não está poupando sequer um apoio de não mais de US$ 15 milhões oferecido pela Costa Rica a seus agricultores.
No caso do Brasil, Washington insiste em cobrar informações sobre o destino dos produtos beneficiados pelo Prêmio para Escoamento do Produto (PEP) e pelo Prêmio de Equalização pago ao Produtor (Pepro). Os EUA notam que o Pepro foi usado para milho, algodão e trigo até 2014. Nos últimos anos, as informações são de que o programa beneficiou, sobretudo, os produtores de milho. Em reuniões anteriores do Comitê de Agricultura, o governo brasileiro já havia informado que o PEP estava suspenso para reavaliação.
E as respostas brasileiras continuaram a ser evasivas. Ocorre que Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que gerencia o Pepro, diz que ainda precisa adequar seu sistema de informática para obter as respostas que os americanos querem. Até agora, após inúmeras reuniões em Brasília, tudo continua na mesma. O que mantém vivas as suspeitas de Washington de que produtores brasileiros podem estar se beneficiando de subsídios domésticos para turbinar exportações.
Mas, ao mesmo tempo, a delegação brasileira aproveitou a reunião do Comitê de Agricultura da OMC para voltar a questionar os EUA sobre os subsídios que o país concede a seus produtores de soja. E, diga-se de passagem, também ficou sem resposta. Há tempos os produtores brasileiros de soja ameaçam pedir ao Itamaraty que o Brasil denuncie os EUA na OMC por conta desse apoio. A Aprosoja Brasil calcula que os produtores brasileiros perdem cerca de US$ 1 bilhão por ano em razão de dois programas bancados por Washington – um de seguro climático e outro também de seguro, que é considerado como uma garantia de renda.
A soja é o carro-chefe do agronegócio brasileiro tanto em Valor Bruto da Produção (VBP) quanto em exportações. Para os sojicultores brasileiros, sem o socorro de Washington aos produtores americanos o Brasil estaria produzindo mais e com preços melhores. Os dois países têm disputado nos últimos anos a liderança na produção e nas exportações de soja em grão – sempre de olho na China, que responde por mais de 60% das importações mundiais do produto. Até agora, no entanto, as rusgas não motivaram uma disputa na OMC.
Com a China, os EUA agiram de forma diferente, e a denúncia apresentada pelo governo Obama vai na “jugular” da agricultura do país asiático, como definiram alguns negociadores. Washington acusa Pequim de subsidiar produtores de arroz, trigo e milho com mais de US$ 100 bilhões, o teto permitido pelos acordos da OMC. A disputa certamente concentrará as atenções na organização nos próximos meses.
De um lado, a China não pode – e provavelmente não vai – alterar seus programas tão cedo. Mas essa postura deixa margem para que os EUA argumentem que não podem cortar a ajuda oferecida a seus agricultores porque os chineses não se movem. Pela dimensão do caso e dos produtores alvejados, é de se esperar que o Brasil peça para participar dessa disputa, como terceira parte com interesses comerciais no caso.
Outro país que parece pouco confortável com o crescente questionamento de suas práticas no comércio agrícola mundial é a Índia. Na reunião do Comitê de Agricultura da OMC, a delegação indiana ficou novamente na defensiva, e insistiu que seu programa de subsídios às exportações de açúcar já foi desmontado. Nessa frente, o Paquistão também foi alvo de queixas, mas garantiu, sem convencer os parceiros, que a ajuda foi concedida apenas uma vez com o objetivo de corrigir “distorções” do mercado. E a Tanzânia, acusada de restringir importações de açúcar desde a Tailândia – segundo maior exportador da commodity, atrás do Brasil – sequer apareceu na reunião da OMC para dar sua versão.
Fonte: Valor Econômico