Representantes do Ministério de Relações Exteriores e do Ministério da Defesa não chegaram a um consenso, nesta quinta-feira, 14 de julho, sobre a proposta que modifica regras para a aquisição de imóveis rurais por estrangeiros no País – Projeto de Lei 4059/12. O tema foi debatido em audiência da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural.
Representando o Ministério da Defesa, Paulo Cézar Brandão criticou o dispositivo do projeto que não prevê restrições para compra ou arrendamento de terras por pessoas jurídicas brasileiras que sejam controladas direta ou indiretamente por estrangeiros.
Brandão disse que essa falta de restrição representa uma ameaça à soberania nacional. “Em síntese, esse dispositivo retira do Estado a prerrogativa de monitoramento e controle sobre aquisições indiretas de terras por estrangeiros”, disse Brandão.
O representante do Ministério da Defesa também questionou o trecho do projeto que revoga a legislação atual (Lei 5.709/71) e regulariza todas as compras de terras já realizadas até o momento por empresas ou cidadãos estrangeiros no País.
“Convalidar ou ratificar as aquisições anteriores é uma ameaça, pois o Estado brasileiro não possui hoje um controle efetivo sobre as reais transações realizadas por empresas nacionais com capital predominantemente estrangeiro”, completou.
REGRA ATUAL
Advogado da União, Joaquim Modesto Pinto Júnior explicou que, mundialmente, a compra de terra por estrangeiros é tratada na forma de lei específica. No caso brasileiro, a legislação atual prevê que, para pessoas jurídicas, a aquisição de até 3 módulos rurais é livre, sem necessidade de autorização do Estado brasileiro.
Já pessoas físicas ficam dispensadas de autorização para aquisição de até 20 módulos rurais. Nos demais casos, a lei impõe restrições à aquisição de terras por estrangeiros, sobretudo em áreas de fronteira. “A lei cria excepcionalidades, mas não impedimentos”, disse Pinto Júnior.
Pelo Projeto de Lei 4059/12, não poderão comprar terras rurais no Brasil, ainda que indiretamente: fundos soberanos constituídos por outros países; organizações não governamentais ou fundações particulares com sede no exterior. O texto também proíbe o arrendamento de imóvel rural a estrangeiros e a venda ou doação a estrangeiros de terras da União, dos estados ou dos municípios. Por outro lado, continuam autorizadas a comprar imóveis rurais companhias de capital aberto.
ACORDOS INTERNACIONAIS
Ao analisar o projeto, o Itamaraty entende que o texto pode aproximar o Brasil de eventuais acordos de investimento firmados com outros países no âmbito da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). “A proposta vai na direção de não discriminação entre empresas brasileiras ou controladas por estrangeiros”, disse Norberto Moretti, que representou o Ministério das Relações Exteriores na audiência.
“A consequência prática é que o investidor estrangeiro, sob a forma de uma empresa nacional de capital estrangeiro, terá o mesmo tratamento que uma empresa brasileira”, disse Moretti.
O deputado Heitor Schuch (PSB-RS), que propôs o debate, se disse contrário à proposta. “Não podemos nem permitir falar que agricultor familiar esteja correndo o risco de perder sua terra para estrangeiros. Estaremos realimentando a indústria dos sem-terra. Portanto, o Brasil precisa antes cuidar bem dos brasileiros”, disse. “Pode até trazer gente de fora, mas não entregando a terra”, finalizou.
Também contrário ao projeto, o representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Guilherme Delgado, disse que o texto é completamente inapropriado.
“O projeto vai na contramão dos regimes fundiários instituídos pela Constituição de 1988. Precisamos entender que a terra não é mercadoria, mas um bem intergeracional de uso múltiplo e com uma função social clara”, defendeu Delgado, para quem o texto põe em risco comunidades tradicionais, como índios e quilombolas, e a soberania nacional.
Fonte: Agência Câmara de Notícias