*Por Evaristo de Miranda – Doutor em ecologia, ex-pesquisador da Embrapa e membro da Academia Nacional de Agricultura da SNA (www.evaristodemiranda.com.br)
“Fora da longa lista de presentes da natureza para o homem, nenhum talvez é tão essencial para a vida humana quanto o solo”. Hugh Bennett
A terra, o chão, o solo, é um dos maiores patrimônios. O solo é o recurso natural mais fundamental à produção de alimentos. Vive-se sobre ele, vive-se dele e ao morrer, de uma forma ou outra, a ele retorna-se (Gn 3,19).
O meado de abril é marcado por datas comemorativas: dia do Exército, do índio, da voz, do hemofílico, do livro infantil, do hino nacional brasileiro e… do patrimônio mundial. A raiz latina de patrimônio evoca os bens herdados ou transmitidos pelo pai. O patrimônio deve ser cuidado, preservado, por vezes restaurado, e sempre ampliado, nunca delapidado. É assim para o patrimônio histórico, cultural, econômico e financeiro. É assim para os solos.
Coincidência ou não, 15 de abril é o Dia Mundial da Conservação do Solo. Nessa data nasceu, em 1881, o norte-americano Hugh Hammond Bennett, pioneiro nas ações de conservação do solo. Seu trabalho levou a criação do Serviço de Conservação do Solo, do Departamento de Agricultura dos EUA.
No Brasil, agricultores, técnicos e agrônomos trabalham para impedir a perda de solos por erosão, sobretudo sob a ação do vento e das chuvas. Tentam evitar a perda de nutrientes, insumos e o assoreamento de rios e reservatórios. Máquinas e tecnologias evoluíram na conservação física do solo;mantêm-no protegido sob palhada, restos vegetais e adubos verdes; evitam sua movimentação na aração pelo plantio direto na palha, cultivos em curvas de nível, terraceamento; gerenciam o escoar da água em estradas rurais.
Na parte química, muito se evoluiu na correção da fertilidade dos solos, do equilíbrio entre seus nutrientes e micronutrientes, com calagem, gesso e adubações. Agricultores retornam ao solo resíduos sólidos e líquidos, como a vinhaça na cana de açúcar, tortas de filtros, compostagens e até lodo de esgoto. Com tecnologia, o mundo rural transformou os solos dos cerrados, pobres em nutrientes e com elementos tóxicos, como o alumínio, em terras produtivas. Práticas sustentáveis sob clima tropical foram e seguem sendo desenvolvidas, como os remineralizadores de solos, o uso de pó de rocha etc.
Na conservação biológica dos solos, a biodiversidade é favorecida pela boa gestão da matéria orgânica, ampliada com a dos resíduos agrícolas, o uso de biocondicionadores de solo e outros bioinsumos, produzidos nas fazendas;por rotações, consórcios, mix de adubos verdes, técnicas de agricultura regenerativa; integração lavoura-pecuária; cuidados com a biota edáfica etc.
Muito por fazer. Muito sendo feito. Um todo integrado. Nas festividades da Conservação dos Solos, cuidados e ações da agricultura com esse patrimônio deveriam inspirar áreas industriais e urbanas a cuidar melhor de seus solos, impermeabilizados em ampla escala sob asfalto e cimento, removidos, contaminados, transformados em locais de deposição, disposição, descarga, infiltração, acumulação, injeção ou enterramento de substâncias e produtos poluentes. Na conservação de solos, os ambientes urbanos são um desastre e têm muito a aprender com a agricultura.
Os trabalhos de conservação, restauração e regeneração dos solos e da biodiversidade pelo mundo rural poderiam inspirar e mobilizar a sociedade a cuidar de seu patrimônio moral, tão atacado e delapidado nos últimos tempos pelas mais altas hierarquias públicas e privadas.
Sem patrimônio moral, destrói-se o patrimônio público e privado, pela erosão de valores, princípios constitucionais, restrições à liberdade, censura,roubo e mau uso dos impostos. Triste ver o dinheiro público esbanjado em gastanças luxuosas,por quem deveria ser e dar o exemplo. A ser seguido e não combatido. Na Semana da Conservação do Solo e do patrimônio mundial cabe perguntar: Quem defenderá a Pátria e seus patrimônios?