Empresa precisa enxugar a burocracia e reduzir a máquina para avançar no processo de inovação do agro
Políticos têm um gosto especial em construir obras para chamar de suas. Essa vaidade, que atrapalha o bom funcionamento da administração pública, afeta também a Embrapa. É lamentável.
Um sonho de consumo de governadores é ter uma Embrapa em seu território, pouco importa se tecnicamente justificadas. Assim foram surgindo unidades espalhadas pelo país: em Alagoas, Renan Calheiros (MDB-AL) não descansou enquanto não conseguiu a sua; Kátia Abreu (PP-TO), então ministra da Agricultura, não pestanejou para instalar uma no seu querido Tocantins. Inauguradas, viram troféus políticos.
Agora, o deputado estadual Lúdio Cabral (PT-MT) está articulando levar uma Embrapa para Cuiabá (MT). Segundo ele, “o cultivo de frutas é uma vocação da baixada cuiabana”. Será mesmo? Carlos Fávaro (PSD-MT), atual ministro da Agricultura, que é senador pelo Mato Grosso, disse que apoia integralmente a proposta.
Além de refletir uma horrenda politização dos destinos da Embrapa, a ideia reflete um pensamento antigo, de quando se construía edifícios para expandir atividades produtivas, públicas ou privadas. Na era digital, sabemos, prédios perderam importância frente aos sistemas tecnológicos. Atividades de inteligência substituem o concreto das instalações.
O Mato Grosso, Estado líder da agropecuária brasileira, certamente poderá incrementar sua fruticultura utilizando o saber produzido na Embrapa e em demais centros de pesquisa agronômica, sem necessariamente gastar milhões em novos prédios. Que demandarão manutenção….
A Embrapa padece há anos por falta de recursos para pesquisa, vivendo um drama pela falta de pessoal de apoio nos laboratórios e em seus campos de experimentação. A Embrapa está precisando de um choque de gestão, não de expansão. Precisa enxugar a burocracia e reduzir a máquina, para avançar no processo de inovação do agro.
Esse governo é curioso. Logo ao tomar posse, convidou um grupo de elevada competência para realizar um diagnóstico sobre a crise da Embrapa. Compunham o grupo Sílvio Crestana, Ana Célia Castro, Roberto Rodrigues, Luís Carlos Guedes Pinto e Pedro Camargo Neto. As recomendações foram entregues ao ministro da Agricultura em 25 de abril de 2023. Jamais tiveram retorno….
Basta ler o relatório (PDF – 1 MB) do grupo de trabalho para verificar o absurdo de, para agradar aos políticos, continuar aumentando a estrutura física sem cuidar do essencial: o propósito da Embrapa no século 21.
Elefantes brancos existem. Em São Paulo, é famoso o caso protagonizado pelo deputado Renato Cordeiro, um médico que, de 1982 a 1983, virou secretário estadual da Agricultura por 3 meses. Ao saber que a Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo) implantaria um programa de expansão de armazéns, mandou instalar uma grande unidade em Birigui (SP), sua terra natal. Mandou e foi obedecido.
Acontece que naquela região de Araçatuba, no oeste do Estado, imperava no campo as pastagens da pecuária. Não se produzia grãos por lá. É claro que o grande armazém permaneceu ocioso e acabou desviando sua função….
Expansão política também acometeu a Unesp (Universidade Estadual Paulista), conceituada universidade paulista onde lecionei por 16 anos, no campus de Jaboticabal (SP). Obrigada a instalar vários campi espalhados pelo Estado, a Unesp paga até hoje o elevado preço de servir aos interesses políticos, sem obedecer a um planejamento estratégico e orçamentário adequados. Os políticos tiram fotos felizes e deixam a bucha para os pesquisadores e professores.
É o que está ocorrendo com a Embrapa. Com curto cobertor orçamentário, a burocracia interna puxa a maior fatia para seu lado, sobrando pouco para a inovação tecnológica. Falta mão de obra nos laboratórios e nos campos experimentais, mas em vez de enxugar, vai se expandir….
Vamos ser francos: esse clientelismo político arrebenta o DNA da Embrapa….