O Brasil e os outros países do Mercosul estarão entre os mais afetados se prosperarem na Organização Mundial do Comércio (OMC) propostas de um grupo liderado pela China e Índia para facilitar o aumento de tarifas para frear importações agrícolas.
O embate entre exportadores agrícolas e o G-33, o grupo protecionista presidido pela Indonésia, mas controlado por Pequim e Nova Délhi, intensificou-se na última semana com o ressurgimento de propostas de 2014 que já resultaram em forte impasse no passado. O G-33 relançou a ideia de criar um mecanismo de salvaguarda especial (SSM, na sigla em inglês) para que países em desenvolvimento possam elevar temporariamente tarifas a fim de frear aumentos súbitos de importações ou declínio de preços.
Embora o G-33 argumente que o objetivo é usar o mecanismo contra exportações subsidiadas, que viriam de países ricos e afetariam seus produtores, eles querem de fato que seja aplicada a todos os países. Para o Brasil e outros exportadores, o impacto negativo sobre o comércio Sul-Sul seria significativo, ainda mais quando estão avançando nesses mercados onde a renda melhorou e a demanda tende a continuar crescendo.
No caso do Brasil, as exportações de açúcar seriam logo afetadas por sobretaxas. Basta ver a salvaguarda normal que a China já está usando para frear a entrada do produto importado em seu mercado. Também as exportações brasileiras de milho seriam prejudicadas pelo protecionismo do G-33. No caso de Argentina e Uruguai, os produtos mais prejudicados seriam trigo e arroz.
O G-33 insiste também agora que os programas de estoques públicos de alimentos, por razões de segurança alimentar, não tenham limite de gastos. O instrumento é aceito pelos países em geral. Mas os exportadores não escondem a inquietação com o endurecimento da postura da China, Índia e de outros membros do G-33. A preocupação é que, quando o governo insiste em comprar dos produtores a preços fixos ou com subsídios, esses programas podem ter consequências inesperadas para a segurança dos outros países.
A Austrália exemplificou que a China já é o maior produtor mundial de trigo e a Índia o maior exportador de arroz, e que os programas de garantia de preços nesses dois gigantes têm impacto no mercado global. Isso, sobretudo quando os estoques são despejados no mercado internacional derrubando preços. Países exportadores, como o Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai, Colômbia, Austrália, Tailândia, Estados Unidos, Canadá e também a União Europeia, constatam que a reforma agrícola que um bom número de países em desenvolvimento quer é para manter, na verdade, proteção de seus mercados.
A proposta de salvaguarda especial deve causar mais impasse nas discussões sobre o que pode resultar em compromisso na conferência ministerial da OMC, no ano que vem em Buenos Aires. Quanto à solução permanente sobre estoques públicos de alimentos, há menos resistência dos exportadores, desde que atenuada. O Paquistão sugere que a questão de segurança alimentar seja tratada com transferência direta de dinheiro para os agricultores, em vez de o governo acumular estoques.
No entanto, a receptividade a compromisso por parte de Pequim e Nova Délhi parece estar próxima de zero, no momento. O aumento do protecionismo agrícola, agora em grandes mercados em desenvolvimento, deve resultar em novos contenciosos na OMC.
Os EUA planejam pedir a abertura de painel (comitê de investigação) contra a China ainda este ano, devido a programas de subsídios internos para a produção de milho, trigo e arroz. O Brasil tem contenciosos contra a Indonésia por causa de barreiras às carnes bovina e de frango, e contra a Tailândia, envolvendo o açúcar.
Fonte: Valor Econômico