RenovaBio ainda passa por análise técnica, sofre pressão e pode não sair em 2017

Parado no Ministério da Casa Civil desde o início de agosto, o programa de biocombustíveis RenovaBio ainda passa por análises técnicas, enfrenta pressões diversas e não tem prazo para sair, podendo nem ser lançado neste ano. A informação foi divulgada em comunicado à Reuters pelo próprio governo e por fontes com conhecimento do assunto.

Ministério da Fazenda, Petrobras e distribuidoras defendem aprimoramentos no projeto, enquanto as fontes afirmam que a equipe econômica, a petroleira e os integrantes do setor distribuidor de combustíveis têm reservas em relação ao projeto. Via assessoria de imprensa, a Casa Civil informou apenas “que o tema está em análise no governo e não há previsão de envio (para o Congresso)”.

Uma fonte que participou de uma reunião recente para discutir o programa entre representantes do setor de biocombustíveis e importantes autoridades do governo, incluindo o presidente Michel Temer, disse que o RenovaBio ainda carece de alguns estudos de impacto e que é improvável que algo seja enviado ao Congresso neste ano.

Lançado em dezembro do ano passado, o RenovaBio é um programa do governo federal para expansão dos biocombustíveis no Brasil, incluindo metas de uso desses produtos e negociações de créditos de descarbonização (CBios), semelhante ao modelo utilizado nos Estados Unidos.

O programa foi à consulta pública no primeiro trimestre de 2017, teve suas diretrizes aprovadas pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) em junho e depois foi enviado à Casa Civil para formatação como medida provisória (MP) ou projeto de lei (PL).

O próprio Ministério da Agricultura esperava que ainda em agosto aconteceria uma definição sobre o programa, cuja proposta é estimular a demanda por combustíveis renováveis e estabilizar a indústria, potencialmente impulsionando fusões e aquisições que consolidariam um setor que enfrenta endividamento elevado, com muitas empresas em recuperação judicial.

Mas as pressões sobre o RenovaBio só aumentaram desde então, afirmaram à Reuters as fontes que acompanham o tema, acrescentando que as discussões sobre o programa ainda estão “em aberto”. Segundo as fontes, ouvidas sob a condição de anonimato, já que o assunto é sensível, o Ministério da Fazenda é um dos que têm receios quanto ao programa.

“Eles (Fazenda) queriam promover algum mecanismo de arrecadação com esse RenovaBio e também avaliam os possíveis impactos inflacionários”, disse uma das fontes, lembrando que a pasta estaria inclusive estudando eventuais taxas sobre a gasolina, de modo a “agradar” o setor de etanol e garantir mais recursos para os cofres do governo, “desmobilizando o RenovaBio”. Uma fonte da equipe econômica, contudo, negou que haja qualquer busca de ganhos de arrecadação, mas que há debates sobre o impacto inflacionário.

O temor quanto à inflação deve-se à eventual negociação de CBios, que terão de ser comprados por distribuidoras e empresas que comercializarem menos biocombustíveis do que as metas que serão definidas para elas. Quando um distribuidor comprar etanol, por exemplo, receberá certificados para a redução de emissões. Caso não tenha todos os CBios necessários ao final do período, terá de recorrer a um mercado secundário. As metas de uso de CBios ainda não são conhecidas.

No Ministério de Minas e Energia, a avaliação é de que os CBios teriam um valor inicial de R$ 50,50 por tonelada de gás carbônico equivalente, possivelmente na BM&F, o que poderia elevar os preços da gasolina nas bombas dos postos de combustíveis em R$ 0,07 por litro, um impacto relativamente pequeno perto dos benefícios ambientais.

São esses possíveis custos com compras de CBios que deixam as distribuidoras receosas quanto ao RenovaBio, enquanto a Petrobras teme perda de mercado da gasolina e do diesel. A oposição da petroleira, por sinal, vem desde a fase de consulta pública do RenovaBio.

Outro lado

Sem expressar uma posição contra o RenovaBio, o Ministério da Fazenda admitiu que potenciais impactos com a inflação têm de ser avaliados, enquanto a Petrobras citou que o programa precisa ser aprimorado, sem indicar um caminho.

Por meio de nota, o Ministério da Fazenda disse que, “junto a outras áreas, vem participando de discussões” sobre o projeto e que “todos os impactos de um programa como o RenovaBio devem ser avaliados tecnicamente, inclusive os potenciais impactos sobre os preços dos combustíveis e a inflação”.

Já a Petrobras, também em nota, disse que “de forma alguma se posiciona contra o uso de combustíveis renováveis”, mas ponderou que as “propostas atualmente em discussão no âmbito do RenovaBio podem ser aprimoradas para que gerem os melhores incentivos para o equilíbrio do mercado de combustíveis no país”.

O Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e Lubrificantes (Sindicom) afirmou que “apoia o RenovaBio e tem participado de forma colaborativa de todas as discussões envolvendo o programa”, ao ser também questionado sobre as pressões citadas.

“O Sindicom tem a expectativa de que o processo de regulamentação do programa (…) garanta uma visão equilibrada que considere os efeitos positivos de usar um combustível renovável”, disse em nota. “A discussão consistente (…) é fundamental para que sejam conhecidos, de forma transparente, todos os benefícios do programa para sociedade, setor, governo e, principalmente, consumidor.”

Apoio

A União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica), principal associação sucroenergética do país e uma das maiores apoiadoras no RenovaBio, afirmou que “o que falta para que o RenovaBio seja lançado é a decisão política que, esperamos, deva estar já muito próxima de acontecer”.

“O programa foi plenamente discutido com a sociedade durante mais de um ano. O projeto atual é resultado da construção de um consenso entre agentes da cadeia de produção e consumo de biocombustíveis (…) Podemos afirmar que ele está totalmente estruturado e pronto para sair”, destacou a entidade.

O horizonte do RenovaBio é 2030. A intenção é permitir ao Brasil cumprir suas metas, acertadas na COP 21, de Paris, quanto à redução de 43% das emissões de gases do efeito estufa até aquele ano, tendo por base 2005.

 

Fonte: Reuters

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp