Professor Xico Graziano

Foto/Sérgio Lima

Francisco Graziano Neto é Engenheiro Agrônomo, formado na ESALQ/USP e Doutor em Administração pela FGV/SP. Ocupou vários cargos públicos, destacando-se os de Secretário Estadual do Meio Ambiente e Secretário Estadual de Agricultura, em São Paulo. Consultor em sustentabilidade, tem 12 livros publicados sobre a questão agrária, agricultura e política.

Nesta entrevista, ele aprofunda alguns dos temas que aborda em seus artigos, publicados em diversas mídias, assim como no Portal SNA, tais como a imagem do agronegócio perante a opinião pública, o pouco preparo técnico e acadêmico da classe política, além das tensões no campo e sua visão para o futuro sustentável da agropecuária brasileira. Confira:

SNA: Seus textos com frequência abordam aspectos do agronegócio pouco explorados pela grande imprensa. A pujança do setor é apresentada como um entrave de natureza política, quando em circunstâncias normais seria motivo de orgulho nacional. Em sua visão, qual a origem e as consequências dessa “má vontade”?

Graziano: Há várias razões, que começam pelo desconhecimento. Nós do agro não temos conseguido nos comunicar corretamente coma sociedade, contando a nossa história, ficando sujeitos às interpretações equivocadas. Existe também uma vertente política dessa “má vontade”: alguns setores da esquerda, principalmente o PSOL e parte do PT, batem no agronegócio por serem anticapitalistas, e o agro brasileiro é o maior sucesso de uma transformação capitalista no mundo. Então, embora vivam do capitalismo, eles não gostam. Nossa formação histórica também não ajuda, pois o passado escravocrata e latifundiário ainda mantem forte marca na cultura nacional, contaminando a educação das crianças e jovens até hoje. É como se pagássemos um preço pelo nosso condenável passado.

SNA: O senhor exerceu cargos públicos de relevância e possui formação acadêmica sólida. Acredita que falta aos gestores uma visão pragmática a respeito da agropecuária brasileira, além de quadros mais qualificados e técnicos, sem indicações políticas para funções–chave?

Graziano: Confesso que sinto essa fraqueza da melhor formação acadêmica das nossas lideranças políticas e gestores públicos; por isso defendo tanto, em minhas aulas e palestras, que nós precisamos entender de sustentabilidade, dominar a agenda, para sermos proativos, e não apenas reativos nessa matéria.Competência técnica e profissionalização fazem parte da equação de sucesso do agro nacional.

SNA: No comando do INCRA, o que mais lhe chamou atenção no longevo problema das tensões agrárias no Brasil, e de que forma o cenário evoluiu desde sua passagem?

Graziano: Nossa, já escrevi tanto sobre isso. A reforma agrária que foi idealizada nos anos 1960 era um exemplo de planejamento agrário, mas lamentavelmente se transformou, pelas invasões de propriedade, em uma fábrica de sem-terra despreparados, de baixa aptidão, desaguando numa receita certa de fracasso. Se tivéssemos conseguido selecionar jovens, filhos de pequenos agricultores, prepará-los pela tecnologia, treinados na gestão, poderia ter sido um exemplo para o mundo de democratização da terra. Mas, infelizmente, o MST impediu esse processo organizado e descambou para a violência. A reforma agrária brasileira é o maior exemplo mundial do fracasso de uma política fundiária, um baita desperdício de dinheiro público.

SNA: O agro brasileiro enfrenta os mesmos desafios há décadas, tais como o gargalo logístico, legislação ambiental rigorosa e restritiva, além de novos cenários como clima instável e o imperativo da sustentabilidade. Qual a melhor forma de vencer os velhos e novos obstáculos?

 Graziano: Eu não gosto do discurso vitimista muitas vezes brandido por gente do agro, utilizado como se fôssemos uns coitados sendo espoliados, sofredores e tristes. Penso que nossos desafios fazem parte de nosso negócio, que não é fácil, portanto, sendo um teste de sucesso. Também não penso no governo como nosso salvador, como se fôssemos depender eternamente das bênçãos do poder. Então, creio que nossa organização e nossa capacidade empreendedora são os fatores essenciais. O governo só não pode atrapalhar, tem que fazer a parte dele, claro. E, na política, sermos fortes para participar do desenvolvimento nacional, não ficando a reboque de ninguém.

 SNA: O Brasil é apontado como protagonista da transição para uma economia verde, entre os países do chamado cinturão tropical agrícola, que serão líderes de uma produção sustentável, com matriz energética limpa e baixa emissão de carbono. O senhor compartilha desse otimismo?

 Graziano: Sim, trabalho para isso há décadas, para ver o agroambientalismo prevalecer, colocando a fotossíntese no centro do debate ambiental. Proteger a biodiversidade, os recursos hídricos e a vida do solo, mais que obrigação, deve ser o deleite do agricultor, pois somos ligados à terra e à natureza mais que ninguém. Nós, agropecuaristas, devemos ser os ambientalistas de amanhã, e não ficar tomando lição de moral de riquinho urbanoide, uns ecologistas mequetrefes, ideológicos, que não entendem nada da história e da importância da produção de alimentos para a civilização. Temos que ir para cima e mostrar nosso valor.

Por Marcelo Sá – jornalista/editor e produtor literário (MTb 13.9290) marcelosa@sna.agr.br

 

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