Pragas e doenças da cana estão entre os desafios para as usinas

Lagarta de Diatraea saccharalis com manchas claras e cabeça amarelo-escuro ataca produção de cana-de-açúcar. Foto: José F. Garcia/Divulgação
Lagarta de Diatraea saccharalis, com manchas claras e cabeça amarelo-escuro, ataca produção de cana-de-açúcar. Foto: José F. Garcia/Divulgação

Uma das demandas das usinas de cana-de-açúcar de Mato Grosso do Sul é entender melhor a dinâmica das pragas e doenças da cultura para realizar o controle e melhorar a produtividade. Com esse objetivo, foi realizado o 3º Seminário do 2º Ciclo de Seminários Agrícolas de 2016, na Embrapa Agropecuária Oeste (MS), no dia 18 de agosto. A realização foi da Biosul e da estatal, com organização da TCH Gestão Agrícola, e apoio da Famasul (Federação da Agricultura do Estado de Mato Grosso do Sul), Fundação MS e Sulcanas.

Chefe-geral da Embrapa Agropecuária Oeste, Guilherme Asmus destaca que o levantamento das demandas e os debates gerados nesses seminários contribuem para melhorar os processos produtivos da região. Assessor técnico da Biosul, Erico Paredes ressalta a importância das parcerias para a realização do evento e da presença dos técnicos do Estado nos seminários.

“A rede entre os parceiros para os debates das demandas das usinas é uma forma de atendermos o setor sem sobrepor trabalhos”, comenta Asmus.

 

CONTROLE BIOLÓGICO

O chefe-adjunto de P&D da Embrapa Agropecuária Oeste, Harley Nonato de Oliveira, falou sobre a importância de se conhecer a qualidade dos parasitoides para o controle biológico de pragas a serem utilizados, inclusive dos processos da criação deles. Tal importância recai também sobre as usinas que têm ou vão montar o próprio laboratório, porque precisam conhecer todos os procedimentos para desenvolver e melhorar o desempenho dos organismos benéficos.

“Quem produz cana e utiliza o controle biológico deve ficar atento às recomendações da pesquisa quanto a diversos fatores, como a qualidade e a idade do parasitoide, a forma de transporte e sua distribuição, o horário de liberação desses inimigos naturais na lavoura, a seleção de produtos fitossanitários quando se faz o controle químico, entre outros”, salienta Oliveira.

Entre as maneiras para melhorar o desempenho de organismos benéficos no controle de pragas são a qualidade dos parasitoides criados em laboratório; o cuidado no transporte e nas liberações (confira a publicação pelo link http://bit.ly/SOGG4K); período que a praga está apta a ser controlada pelo parasitoide; uso de produtos fitossanitários seletivos, entre outros.

 

Oliveira também ressalta que é de suma importância que sejam criados laboratórios de qualidade em Mato Grosso do Sul (atualmente, não existem laboratórios no Estado) e que os parasitoides a serem trabalhados sejam adaptados à região.

Pesquisas realizadas pela Embrapa Agropecuária Oeste, com apoio da UFGD, avaliaram efeito de estresse por temperatura sob diferentes parasitoides de Diatraea saccharalis em laboratório. Resultados mostram diferentes comportamentos de inimigos naturais em relação às variações de temperaturas encontradas na região produtora de Dourados (MS). Os inimigos naturais adaptados às condições climáticas conseguem melhor desempenho.

 

PREVISÃO DO TEMPO

O pesquisador Claudio Lazzarotto, da Embrapa Agropecuária compilou informações do tempo a partir de dados de diversos institutos nacionais e internacionais para falar da previsão do tempo até o final do ano.

Ele destaca que o fenômeno El Niño foi forte em 2015/2016, ocasionando excesso de chuva, o que saturou o solo. A partir de julho deste ano, o El Niño perdeu o efeito e a chuva parou o que, segundo o pesquisador, tornou-se interessante para a cana, permitindo o processo normal de colheita. “Para cana de plantio também não foi um período ruim, porque ainda havia umidade suficiente no solo”, avalia Lazzarotto.

A partir de setembro, haverá o estabelecimento da La Niña, com chuvas abaixo do normal. Lazzarotto explicou que para cana, diferentemente da cultura da soja, é bom tanto para a colheita quanto para o plantio, porque a planta armazena mais açúcar. Para o pesquisador, tudo indica que o tempo seja favorável tanto para o final da safra atual quanto para o início da próxima.
FITONEMATOIDES

Pesquisadora do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Leila Dinardo relata que análises de solos cultivados com cana-de-açúcar mostram que 97% das amostras avaliadas têm o nematoide Pratylenchus zeae; 35%, o Meloidogyne javanica; 20%, o M. incógnita; e 35%, o P. brachyurus.

Segundo Leila, os nematoides podem reduzir a produtividade da cana-de açúcar do primeiro corte de 20% a 30%; diminuir a produtividade das soqueiras de 10% a 20% por corte e reduzir a longevidade do canavial em cerca de um corte. No solo arenoso, os danos são mais severos do que em solos argilosos, “provavelmente devido à diferença de capacidade de armazenamento de água que nos arenosos é menor. Mas a população pode ser alta nos dois tipos de solo”, afirma a pesquisadora.

A população de nematoides flutua com o tempo, de acordo com a deficiência hídrica no solo. Em tempo de seca, a população cai, em tempo de maior umidade, aumenta. Para obter amostragens, a pesquisadora recomenda realizá-las nas épocas chuvosas do ano: novembro a abril, em um ou dois pontos por hectare.

Para saber o nível de danos econômicos, é preciso fazer experimentações com cana planta e cana soca de diferentes variedades, tipos de solo, espécies e populações de nematoides, misturas de espécies, entre outros dados. A partir dos resultados, o controle deve ser feito em áreas com média e alta infestação de nematoides. Mesmo com outras formas de controle, como a rotação de culturas a partir da renovação de canaviais, uso de torta de filtro e torta de manona, por exemplo, é necessário usar nematicida.

“A cana é muito sensível. Em qualquer época de plantio, quando a população de nematoide é média ou alta, a cana deve receber nematicida no plantio”, comenta Leila.

 

NUTRIÇÃO COMPLEMENTAR

Engenheiro da Usina Cerradão, localizada no Triângulo Mineiro (MG), Michel da Silva Fernandes traz exemplos da realidade de onde trabalha para os técnicos presentes no evento. Segundo ele, o ATR da cana (Açúcar Total Recuperável, que representa a capacidade da cana-de-açúcar de ser convertida em açúcar ou álcool) tem caído ano a ano. “Depois de alguns anos difíceis, a previsão para 2016 é muito boa.”

Fernandes também lembrou que a nutrição complementar é importante para aumentar a produtividade da planta: calagem, gessagem, fosfatagem, adubação verde, adubação orgânica, adubação mineral no sulco do plantio (potássio e fósforo), adubação com micronutrientes via solo ou via tolete e via aérea.

“A aplicação de micronutrientes auxilia muito e dá muita resposta. Zinco, boro e manganês são indispensáveis”, exemplifica o engenheiro.
O canavial bem nutrido possui um sistema radicular maior, o que, de acordo com Fernandes, contribui para o controle de doenças e pragas, melhora a resistência à deficiência hídrica.

“Os solos da área da Usina, são pobres em micronutrientes. Nos experimentos que realizamos, a média de incremento é de 19 toneladas. A média de adubação no sulco e foliar é de 15 toneladas de incremento, em todos os experimentos”, afirma o engenheiro.
GESTÃO DO MANEJO INTEGRADO DE PRAGAS

Sphenophorus levis (bicudo da cana-de-açúcar), Metamasius hemipterus (besouro-rajado-da-cana), Migdolus fryanus (broca-da-cana) são pragas que atacam a cana-de-açúcar. De acordo com o engenheiro agrônomo José Francisco, da Global Cana, um dos empecilhos no manejo é a identificação correta dessas pragas.

“Em São Paulo, 150 municípios têm foco do Sphenophorus. Em Mato Grosso do Sul, é preciso monitorar. Produzem de quatro a cinco gerações por ano. Na seca, tem acúmulo de larva e no [período] úmido, de adulto”, alerta Francisco.

Um dos problemas do besouro-rajado-da-cana é que, segundo Francisco, o inseto tem se comportado como o bicudo da cana. “É importante conhecer as adaptações das pragas, como vêm se comportando para conseguir fazer o controle”, destaca o engenheiro agrônomo.

Para a broca-da-cana, “o manejo deve ser mais pesado”. “É uma praga de difícil visualização, porque sai para acasalar e volta rapidamente para o colmo”, informa o especialista.

A indicação é realizar o monitoramento das pragas em quatro pontos por hectare (30% de cada talhão em 100% do talhão). No caso de barreira química, ele aconselha o uso de equipamentos com robustez, que atinjam de 30 cm a 60 cm de profundidade para realizar as aplicações de inseticidas.

 

CIGARRINHA-DAS-RAÍZES

Outra praga que acomete a cana-de-açúcar é a cigarrinha-das-raízes (Mahanarva fimbriolata), tema abordado tanto por José Francisco, engenheiro agrônomo da Global Cana, quanto por Leandro Béber, engenheiro agrônomo da Syngenta.

“Hoje, um dos grandes problemas, principalmente em áreas de expansão, é que há banco de ovos por causa das pastagens anteriormente cultivadas também com pastagens. Mas se fizer um controle bem feito, é possível conviver tranquilamente”, orienta Francisco.

Entre as ações recomendadas por ele estão o desenleiramento da palha na linha para permitir que a insolação chegue até os ovos da cigarrinha (não é em toda região que isso é possível), e o uso de variedade de cana precoce e o recolhimento da palha em excesso.

“A metodologia de amostragem da cigarrinha é um desafio. Orientamos fazer a amostragem em quatro pontos de 2 metros por hectare, sendo 30% de cada talhão em 100% do talhão. Se o número de ninfas for acima de duas ninfas por metro é necessário fazer a zona de manejo”, informa Francisco.

Para Leandro Béber, da Syngenta, a aplicação de produtos é necessária para controlar a praga. Mas um dos problemas averiguados é que muitas vezes as aplicações são mal feitas (aplicações em área total, bicos entupidos/desregulados, etc.); com baixa dose de inseticidas; problema na qualidade da água de aplicação, entre outros. “A aplicação mal feita diminui a efetividade do controle”, destaca.

Béber concorda que a amostragem nas usinas é um gargalo. “Tem de haver uma equipe para fazer a avaliação a cada 15 dias no período de maior incidência. O primeiro controle deve ser feito na primeira geração da cigarrinha. A gente sabe que a equipe nas usinas atualmente está reduzida, mas o ideal é ter uma equipe específica para o controle de pragas”, salienta o engenheiro agrônomo.

 

Fonte: Embrapa Agropecuária Oeste

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