Milho: atual cenário força queda de braço entre setor de proteína animal e agricultores

Presidente da ABPA, Francisco Turra garante que a escassez de milho está gerando redução na produção de aves e de suínos do Brasil. Foto: Edi Pereira/Divulgação ABPA
Presidente da ABPA, Francisco Turra garante que a escassez de milho está gerando redução na produção de aves e de suínos do Brasil. Foto: Edi Pereira/Divulgação ABPA

O aumento de preços e a retenção da venda de milho, por parte dos produtores do País, desde o início do ano, vêm preocupando as cadeias de avicultura e suinocultura nacional, que estão sendo obrigadas a importar o produto. Presidente-executivo da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Francisco Turra alerta sobre os efeitos que a retenção das vendas deste grão, somados à importação de países vizinhos, poderão causar aos agricultores.

“Muitos produtores brasileiros estão apostando em elevações de preço ainda maiores, retendo as vendas. A aposta, entretanto, não tem considerado os elevados estoques que grandes produtores, como os EUA e países vizinhos ao Brasil, vêm mantendo. O mundo está abastecido de milho. Se a ‘safrinha’ se consolidar com bom desempenho, o cenário mais provável é a sobreoferta de produto no mercado interno, com queda abrupta de preços. Este não é um quadro desejável para produtores de grãos e para setor de proteínas, já que a oferta excessiva pode influenciar os resultados da safra seguinte”, ressalta Turra.

Segundo levantamento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o Brasil deverá colher em 2015/2016 a segunda melhor safra de milho de sua história: 83,52 milhões de toneladas.

 

PÉ NO CHÃO

Para Turra, “é fundamental mantermos o pé no chão”. “Os custos estão elevados e não devem regredir de forma expressiva nos próximos meses. E não falamos apenas do milho: energia, custos trabalhistas, combustíveis, enfim, são muitas as variáveis.”

Em sua opinião, “cautela deve ser a palavra-chave de nosso trabalho”.  “A crise econômica e a alta nos custos tornaram mais difícil equilibrar as contas de nossa equação.  Diferente de outras cadeias, a avicultura tem uma capacidade de replanejamento mais eficiente, com um ciclo de produção mais curto.  O setor deve aproveitar-se disso para ajustar a relação oferta-demanda da melhor forma possível para manter distância da crise que afeta o resto do País.”

Turra destaca, em especial, o fluxo de grãos que segue para abastecer agroindústrias de aves e de suínos dos Estados Unidos, apesar das boas safras colhidas e da grande oferta existente nos silos daquele país.  Conforme informações do Departamento de Agricultura norte-americano (USDA), circuladas na imprensa internacional, o país deverá importar 1,27 milhão de toneladas de milho, volume 56% superior ao registrado na safra anterior.  Os países da América do Sul serão os grandes fornecedores.

O presidente da ABPA aponta que a escassez de milho está gerando redução na produção de aves e de suínos do Brasil. Frente a isto, como forma de solucionar a escassez momentânea do insumo, empresas do setor estão importando o cereal da Argentina e do Paraguai.

 

O LADO DOS PRODUTORES

O presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho), Alysson Paolinelli, esclarece que há mais de três anos a entidade tenta alertar o governo para o problema. “Há dois anos, contratamos a Embrapa e a Fundação Dom Cabral e fizemos um estudo para mostrar a previsão da demanda interna de milho, que é assustadora, e externa. Constatou-se que o Brasil precisava aproveitar essa chance para manter a sua posição firme no mercado. A demanda de milho no mundo vai suplantar a de todos os cereais cultivados”, afirma.

Paolinelli lembra que a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) realizou um estudo no qual foi detectada a necessidade de o mundo produzir 240 milhões de toneladas de milho até 2050. Ele conta que reuniu uma de profissionais brasileiros, foram até a sede de FAO e mostraram que essa conclusão era falha.

“Refizemos os cálculos e a FAO concordou conosco. Tanto que já existe outro estudo indicando que a necessidade será bem mais do que aqueles 240 milhões de toneladas. A demanda prevista até 2050 é de 380 milhões de toneladas a mais, diz o presidente da entidade.

 

Presidente da Abramilho, Alysson Paolinelli diz que a entidade tem alertado o governo para o fato de que o Brasil precisa produzir mais milho e, para isso, o setor produtivo merece ter maior atenção. Foto: Divulgação
Presidente da Abramilho, Alysson Paolinelli diz que a entidade tem alertado o governo para o fato de que o Brasil precisa produzir mais milho e, para isso, o setor produtivo merece ter maior atenção. Foto: Divulgação

A Abramilho tem alertado o governo para o fato de que o Brasil precisa produzir mais milho e, para isso, o setor produtivo merece ter maior atenção. Ele lembra que, em todos os países considerados grandes produtores de milho, existe uma parceria entre governo, classe produtora e todos os envolvidos.

Paolinelli cita como exemplo os Estados Unidos, a China e a comunidade europeia, que são os maiores produtores do mundo. “O Brasil sempre foi pequeno produtor, está lá em quinto, sexto lugar, mas agora ele está crescendo e vai crescer muito mais. Enquanto o governo não alertar para isso, o problema vai persistir.”

 

DEMANDA

Segundo o ex-ministro, “o milho entrou no mercado de forma excepcional, e tem preferência hoje. A demanda vai continuar a crescer, principalmente a interna. Assim, a indústria de proteína animal importa de outros países. A minha previsão é de que, esse ano, a demanda será maior. Entendo que não podemos perder essa chance”.

“O Brasil tem que aumentar sua produção com esforço coletivo, em parceria entre o governo e a classe produtora, masisso não acontece e o nosso aumento tem sido pouco significativo. É mais um jogo de mercado”, ressalta Paolinelli, acrescentando que “hoje se está produzindo milho de segunda safra, a chamada safrinha, o agricultor espera até agora para ver como é que está e só então acelera”.

Para o dirigente da classe produtora, é necessário um esforço maior, um esquema bem planejado, para o Brasil ter uma boa primeira safra e não deixá-la reduzir, como está reduzindo, por falta de crédito, por falta de preço mínimo, por falta de garantia, etc.. “O governo não entendeu isso até agora, ele está fugindo de uma discussão realista. Está esperando acontecer para ter fé”, acentua.

 

EXPORTAÇÃO

Conforme Paolinelli, os dois lados saem prejudicados. O agricultor não tem o milho para exportar e o produtor de proteína nobre não tem o milho para comprar. “Desejo que o Brasil produza mais e que o milho fique num preço ideal. O milho que queremos exportar, e eu sonho com isso, é aquela espiga que tem duas asas, uma crista, duas coxas bonitas e um peito; ou, então, aquela outra, com focinho, duas orelhas e quatro pernis, destaca, aconselhando o setor de proteína animal”, descreve.

“Vamos produzir, vamos aumentar. O clima no Brasil hoje está de derrota, parece. Não brigue com o mercado, o que o produtor precisa são aquelas ajudas públicas que os outros concorrentes tiveram.”

O ex-ministro afirma ainda que o “precisamos produzir milho e o Brasil é o único capaz de atender a essa demanda. Os EUA hoje são compradores, inclusive do Brasil, a Europa é importadora, a China também virou importadora, e os outros países então, nem se fala. É preciso fazer um grande esforço aqui no Cone Sul para a gente produzir, porque o mundo vai precisar”.

 

DESONERAÇÃO DA IMPORTAÇÃO

Com o objetivo de abastecer o mercado e conter a alta dos preços das carnes de frango e de suínos, que têm no milho sua base de alimentação, a ministra da Agricultura, Kátia Abreu, apresentou à Câmara de Comércio Exterior (Camex), no último dia 13 de abril, uma  proposta para desonerar importação do cereal, cuja alíquota será de 8%. A proposta terá de ser analisada pelo Conselho de Ministros da Camex e, caso seja aprovada, terá validade de ao menos seis meses.

De acordo com o Mapa, a importação de milho proveniente de países membros do Mercosul já é isenta de impostos. Portanto, a medida estimulará a compra do grão produzido em outros países parceiros, como os Estados Unidos. Em 2015, o Brasil importou 272,8 toneladas do grão norte-americano, equivalente a US$ 207,5 mil.

Os principais parceiros brasileiros são os sul-americanos. No ano passado, o Brasil importou 367,3 mil toneladas (US$ 40,6 milhões) do Paraguai e 1,9 mil toneladas da Argentina (US$ 442,4 mil).

 

Por equipe SNA/SP

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