Investir em sustentabilidade oferece ganhos econômicos no campo, revelam três estudos

À mesa de debates, durante Simpósio “Dimensão Econômica da Sustentabilidade na Agropecuária Brasileira”, estão (da esquerda para direita) Luiz Fernando Amaral (Rabobank), Vitor Osaki (Mapa), Luís Carlos Guedes Pinto (ex-ministro da Agricultura), Carlos Eduardo Vian (Esalq/Cepea), Nelson Ananias Filho (CNA), Annelise Vendramini (FGV-CES) e Roberto Rodrigues (ex-ministro da Agricultura). Foto: Divulgação/Daiana Braga
À mesa de debates, durante Simpósio “Dimensão Econômica da Sustentabilidade na Agropecuária Brasileira”, estão (da esquerda para direita) Luiz Fernando Amaral (Rabobank), Vitor Osaki (Mapa), Luís Carlos Guedes Pinto (ex-ministro da Agricultura), Carlos Eduardo Vian (Esalq/Cepea), Nelson Ananias Filho (CNA), Annelise Vendramini (FGV-CES) e Roberto Rodrigues (ex-ministro da Agricultura). Foto: Divulgação/Daiana Braga

Contrariando a ideia de que sustentabilidade no campo é apenas um custo a mais para o setor agropecuário brasileiro, especialistas mostram, por meio de estudos, que há uma relação direta entre investimentos em boas práticas – de gestão, produção agrícola, conservação de recursos naturais e condições de trabalho – e a melhora dos ganhos para o produtor rural.

Esta foi a conclusão de três pesquisas baseadas em dados primários, apresentadas no Simpósio “Dimensão Econômica da Sustentabilidade na Agropecuária Brasileira”. O encontro ocorreu em Piracicaba (SP), no último dia 12 de abril, no campus da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, vinculada à Universidade de São Paulo (Esalq-USP).

Os profissionais envolvidos nas pesquisas pertencem ao Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora); ao Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), que integra a Esalq-USP; ao banco Rabobank; e ao Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Minas Gerais (Sebrae-MG).

Para debater o assunto, sentaram-se à mesa representantes da iniciativa privada (banco, empresas e produtores rurais), do governo, de universidades, além de consultores e representantes do agronegócio nacional, como o ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues, atual coordenador da FGV Agro e membro da Academia Nacional de Agricultura da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA); Luís Carlos Guedes Pinto, também ex-ministro da Agricultura e membro da Academia/SNA; Luís Fernando Guedes Pinto, gerente de Certificação Agrícola do Imaflora; Vitor Osaki, diretor de Crédito, Recursos e Riscos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa); Nelson Ananias Filho, coordenador de Sustentabilidade da Confederação Nacional de Agricultura (CNA); e Carlos Eduardo Vian, professor da Esalq e pesquisador do Cepea.

 

RABOBANK

Apresentado por Dienice Bini, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Economia Aplicada (PPGEA/Esalq-USP), o primeiro estudo traz uma avaliação das políticas de sustentabilidade do Rabobank, considerando o resultado econômico de agropecuaristas, com base em 1.056 avaliações de crédito de 596 produtores rurais do Distrito Federal e dos Estados de Bahia, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e São Paulo. Avaliadas entre os anos de 2009 e 2013, as atividades envolveram, além do setor pecuário, os segmentos produtivos de soja, milho, algodão, cana-de-açúcar e café.

A análise feita por profissionais do Cepea/Esalq, do Imaflora e do Rabobank combinou o uso de três metodologias aplicadas aos dados criptografados do cadastro de clientes do banco, com variáveis de saúde financeira, de receita e patrimônio e socioambientais.

Segundo este estudo, quanto maior o desempenho socioambiental maior tende a ser a saúde financeira do produtor, e vice-versa. “A política, os incentivos e o acompanhamento do banco teriam o efeito de produzir uma melhoria contínua socioambiental para os seus clientes”, analisou Dienice.

Ela afirmou, no entanto, que a maior parte do crédito destinado ao setor agropecuário brasileiro ainda considera, “de maneira marginal”, os aspectos socioambientais. “Resumindo, constatamos uma relação positiva entre sustentabilidade e desempenho financeiro.”

 

CAFÉ

As outras duas pesquisas, realizadas em propriedades de café, se complementam. Uma delas analisa o impacto da certificação socioambiental no desempenho financeiro dessas fazendas.

Apresentando os resultados, o gerente de Certificação Agrícola do Imaflora, Luís Fernando Guedes Pinto, destacou que a amostra comparou 78 fazendas do Cerrado mineiro, com e sem certificação socioambiental, que aderiram ao Programa Educampo, do Sebrae-MG, no período de 2006 a 2010.

De acordo com o estudo realizado por pesquisadores do Cepea/Esalq, do Imaflora e do Sebrae, a certificação resulta em melhorias na gestão e na eficiência do negócio, elevando a rentabilidade. “Analisando o biênio 2011-2013, as fazendas de café certificadas apresentaram produtividade e receita bruta maior, tendência de custo menor e preço de café igual”, ressaltou o gerente do Instituto, acrescentando: “Os resultados sugerem que essas fazendas são mais eficientes, o que mostra como vantagem a certificação, independente de ter prêmio ou não”.

 

GESTÃO

Já o estudo desenvolvido por pesquisadores do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola e da Universidade de Oxford (Inglaterra) analisa a contribuição e a importância da gestão na melhoria contínua de fazendas.

Segundo Alessandro Rodrigues, também integrante do corpo técnico do Imaflora, a pesquisa teve como base informações de 435 auditorias realizadas em 80 fazendas individuais e 23 grupos de propriedades de café, certificadas pelo Instituto, por meio do sistema de certificação agrícola da Rede de Agricultura Sustentável (RAS)/Rainforest Allian­ce Certified™, entre os anos de 2006 e 2014.

“O resultado sugere que um sistema efi­ciente de gestão contribui para o bom desempenho ambiental e social de uma fazenda. Também concluímos que um sistema de gestão eficiente e um consequente alto desempenho é possível, tanto para grandes quan­to para pequenos e médios produtores, podendo ser implementado por meio de ações coletivas, o que permite ganhos de escala”, comentou Alessandro Rodrigues.

De acordo com ele, existe uma relação positiva entre o cumprimento de critérios de gestão e critérios sociais e ambientais para fazendas individuais e de grupo, sendo que as correlações são maiores para os grupos.

“Também percebemos que há uma lacuna de políticas que colaboram para o fortalecimento da gestão dos produtores, especialmente àquelas relacionadas à assistência técnica. Também vemos que o setor privado atua como protagonista na transferência de tecnologia para a agropecuária, mas geralmente está ligada aos insumos, o que nem sempre atende à real necessidade do produtor”, destacou.

 

POLÍTICAS PÚBLICAS

Uma das tônicas dos debates, realizados no último dia 12 de abril, girou em torno da necessidade de extensão rural, de crédito e de outros instrumentos de gestão, além de políticas públicas que possam estimular o produtor, ao invés de “puni-lo”.

Na opinião do ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues, é inegável a correlação entre sustentabilidade e renda, mas considerando que esta correlação é anterior e tem a ver com a educação do produtor rural.

“Estes trabalhos apresentados devem gerar demandas para políticas públicas na área de crédito e de assistência técnica. Temos de usar muito as novidades do Código Florestal, temos de premiar mais que castigar. O CAR (Cadastro Ambiental Rural), que é uma coisa fantástica, é usado mais como castigo. Por outro lado, precisamos regulamentar os Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA), que são uma oportunidade para a melhoria da renda do ponto de vista da sustentabilidade”, sugeriu o ex-ministro.

 

Membro da Academia Nacional de Agricultura da SNA, o ex-ministro Roberto Rodrigues diz ser inegável a correlação entre sustentabilidade e renda, mas considerando que "esta correlação é anterior e tem a ver com a educação do produtor rural". Foto: Divulgação Imaflora
Membro da Academia Nacional de Agricultura da SNA, o ex-ministro Roberto Rodrigues diz ser inegável a correlação entre sustentabilidade no campo e renda do produtor rural, mas considerando que “esta correlação é anterior e tem a ver com a educação do produtor rural”. Foto: Divulgação Imaflora

Ainda segundo ele, “é necessário desenhar uma nova política agrícola no Brasil, em que crédito, seguro rural, tecnologias sustentáveis, regras de comércio e certificação sejam articulados”.

“O caminho é esse: é vantagem certificar, a gestão é fundamental, assim como o crédito, mas é preciso combinar um número enorme de variáveis”, observou o também ex-ministro da Agricultura Luís Carlos Guedes Pinto, completando: “Concordo com Roberto Rodrigues: este estímulo tem de ser mais de premiação do que de medidas punitivas”.

 

ESTUDOS RELEVANTES

Para Luís Carlos Guedes, os estudos apresentados por profissionais do Imaflora, Cepea/Esalq-USP, Rabobank e Sebrae-MG são relevantes e oportunos, mas precisam ser divulgados e também aprofundados.

“Temos de divulgar intensamente este trabalho, nas mais variadas instâncias, juntos às instituições (Mapa, Ministério do Desenvolvimento Agrário, Ministério da Fazenda, Banco do Brasil, BNDES e outras instituições financeiras). Temos de divulgar na formação das pessoas, nas escolas, inclusive de nível médio, por meio do Senar, do Sebrae, dos encontros de associações de produtores. Estas recomendações têm de passar a ser uma rotina para o produtor e, para isto, é preciso qualificar”, recomendou o ex-ministro.

Ainda de acordo com ele, “nós podemos utilizar o crédito rural de forma a induzir o produtor a incorporar os conceitos discutidos no seminário”. Mas com uma ressalva: “O produtor médio está desemparado, não tem o benefício e o alcance do grande nem os privilégios dos pequenos”.

Na visão de Nelson Ananias Filho, coordenador de Sustentabilidade da CNA, desenvolvimento sustentável, para quem está dentro da porteira, é muito relativo no Brasil, que tem dimensões continentais. “É difícil comparar sustentabilidade de quem planta em terra roxa, de quem planta na caatinga no Cerrado ou em cima da pedra, quem vive disso lá na ponta”, salientou.

“Muito do que a gente faz aqui é empecilho, dificuldade ou barreira para que a gente possa exportar nossos produtos e mostrar o quão nós somos eficientes dentro da porteira”, afirmou Ananias.

 

ABERTURA

Na opinião do coordenador de Sustentabilidade da CNA, o produtor brasileiro nunca esteve tão aberto para incluir estas tecnologias no seu dia a dia como está hoje. “Vivemos e sofremos uma política de comando e controle muito incisiva, nos últimos anos, com questões de multas expropriatórias, por falta de governo. Portanto, não adianta a gente desenvolver tecnologias de ponta se isto não chegar ao produtor”, avaliou.

“Comando e controle são assim: se eu não faço, sou multado, autuado e até embargado, mas pergunta se algum produtor rural recebeu alguma visita de um órgão ambiental para informar que precisa de uma licença, precisa recuperar sua APP.”

Também presente à mesa de debates, o professor da Esalq e pesquisador do Cepea Carlos Eduardo Vian comentou que os estudos apresentados precisam se fazer do ponto de vista interdisciplinar: “Temos de trabalhar e internalizar toda esta discussão, avançar neste processo, levar isto para o dia a dia e formar profissionais que já chegam ao campo com esta visão”.

“Nossa ideia é levar a política agrícola para uma visão de gestão integrada de risco, em que o crédito faça parte disto, assim como a sustentabilidade. Segue a linha de que o produtor, investindo em práticas agrícolas, possa ter no final a garantia de faturamento necessário para cobrir o investimento que ele fez, afinal, ninguém investe em uma situação de risco, é preciso ter um risco controlado”, comentou o diretor de Crédito do Ministério da Agricultura, Vitor Osaki.

 

Por equipe SNA/SP

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp