Escalada tarifária afeta exportação do agro brasileiro para os EUA

As taxas de importação dos EUA, de acordo com o estudo sobre a escalada tarifária da CNA, vão de zero a 131,8%, variando conforme o produto agropecuário brasileiro que é comercializado com o mercado norte-americano. Foto: Divulgação

As escaladas tarifárias impostas pelos Estados Unidos a vários produtos do agronegócio brasileiro afetam a competitividade das exportações da agropecuária para aquele país. É o que aponta do documento “As Escaladas Tarifárias no Comércio do Agronegócio com os Estados Unidos”, elaborado pela Superintendência de Relações Internacionais (SRI), da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).

De modo mais amplo, a escalada tarifária, cujas taxas de importação sobre componentes e/ou matérias-primas são mais baixas e aumentam progressivamente para bens semifinais ou finais, estimula a importação de produtos primários em detrimento dos processados. E é exatamente isso que indica o estudo da SRI/CNA.

“Nosso estudo selecionou mais de 1.550 produtos do agronegócio para essa análise. Após a aplicação de uma série de cortes, a avaliação se restringiu àqueles produtos que o Brasil teria potencial de exportar, e que são os mais afetados pelas barreiras tarifárias”, explica Pedro Henriques Pereira, assessor de Inteligência Comercial da SRI/CNA, em entrevista à equipe SNA/RJ.

De acordo com o especialista, dentre os setores analisados, “podemos destacar as frutas, como limas, limões e melões; oleaginosas, como amendoim e óleo de soja; grãos e cereais, como milho e arroz, e preparações alimentícias contendo esses itens; produtos lácteos e tabaco”.

 

TARIFA DE IMPORTAÇÃO

Para mudar o cenário, a CNA sugere a redução da tarifa de importação pelos EUA, como forma de tornar os produtos agropecuários brasileiros mais competitivos. Segundo Pereira, ainda há diversas medidas que podem ser adotadas para elevar ainda mais essa competitividade e também fortalecer a renda do produtor e do exportador brasileiros.

“Algumas dessas medidas são internas – como o investimento na infraestrutura de transporte e logística do nosso país – e outras externas, envolvendo nosso parceiro comercial. A redução de tarifas pode ser discutida em uma negociação, conforme a liberalização de comércio”, destaca.

O assessor salienta que “a CNA acredita que isso seria benéfico para o produtor brasileiro, mas no momento não há uma negociação desse tipo em curso entre Brasil e EUA”. “No entanto, a Confederação já mapeou as oportunidades e as dificuldades que nossos produtos enfrentam naquele mercado, como forma de subsidiar as autoridades nessa negociação”, acrescenta.

 

EXPORTAÇÃO DE INSUMOS

O documento da CNA, divulgado no último dia 12 de abril, ainda apresenta uma crítica: o Brasil concentra grande parte de seus esforços na exportação de insumos, ao invés de desenvolver e/ou priorizar diferentes elos da cadeia de produção agropecuária. Algumas frutas, especialmente limas e limões, além do café industrializado e do óleo de soja bruto ou refinado, são alguns dos produtos prejudicados pelas escaladas tarifárias aplicadas ao Brasil pelos EUA.

Pereira explica que “o caso da lima e do limão é diferente, porque o mercado norte-americano está fechado para esse produto brasileiro por conta de uma medida fitossanitária dos EUA”.

“A escalada tarifária tem dificultado a exportação de produtos processados do limão, como doces, geleias, marmeladas, sucos, etc. As altas tarifas sobre os produtos processados fazem com que o Brasil concentre suas exportações em produtos de menor valor agregado. A redução das tarifas, investimentos em infraestrutura e uma política industrial que aumente a eficiência brasileira podem ajudar a mudar esse cenário”, sugere o assessor de Inteligência Comercial da SRI/CNA.

 

“As altas tarifas sobre os produtos processados fazem com que o Brasil concentre suas exportações em produtos de menor valor agregado”, diz Pedro Henrique Pereira, assessor de Inteligência Comercial da SRI/CNA. Foto: Divulgação

Diretor técnico da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA) e conselheiro da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), Marcio Sette Fortes concorda com o fato de que a escalada tarifária dos EUA “atinge, em cheio, os produtos de maior valor agregado do Brasil”.

“Se não é possível impedir o sobrepreço gerado pela tarifa lá fora, é possível escoar o produto com mais eficiência. A produção já é eficiente, mas falta melhorar o escoamento dessa produção. Isso evitaria o sobrepreço aqui dentro. Mais investimentos em modais que barateiem o frete dentro do Brasil é uma sugestão”, aponta Fortes, que também é conselheiro da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).

 

OUTROS ENTRAVES

Conforme o documento da SRI/CNA, as elevadas tarifas aplicadas no comércio exterior não são o único fator que afeta a competitividade das exportações brasileiras para os EUA.

“As barreiras não tarifárias, como as barreiras técnicas, sanitárias e fitossanitárias, os problemas de escoamento da produção e as dificuldades operacionais nos EUA são outros entraves às exportações brasileiras”, comenta o assessor de Inteligência Comercial da SRI/CNA, Pedro Henrique Pereira.

Na visão do diretor da SNA, o problema relacionado à perda de competitividade da agropecuária nacional começa dentro das fronteiras do Brasil, “entre a porteira da fazenda e o porto”.

“Nesse trajeto, o preço do produto nacional poderá até dobrar e o responsável por isso é o chamado Custo Brasil, que é o somatório das ineficiências que roubam a competitividade do produto brasileiro. Nele também estão: a logística ineficiente, a infraestrutura inadequada, a corrupção, a burocracia e a carga tributária”, critica Fortes, em entrevista à equipe SNA/RJ.

Ele ainda comenta que “quando o câmbio ajuda, o exportador comemora, mas é preciso lembrar que o câmbio não é fator de competitividade”. “Se o exportador fez a sua parte, o setor público deve fazer a sua também, atraindo investimentos que priorizem a melhoria da logística e da infraestrutura, além, é claro, de combater a corrupção e desmantelar a extensa teia burocrática do comércio exterior.”

 

VARIAÇÃO DE TARIFAS

As taxas de importação dos EUA, de acordo com o estudo sobre a escalada tarifária, vão de zero a 131,8%, variando conforme o produto agropecuário que é comercializado com o mercado norte-americano. O assessor de Inteligência Comercial da SRI/CNA, Pedro Henrique Pereira, salienta que, realmente, essas taxam podem oscilar bruscamente dentro de um mesmo setor.

“Algumas frutas brasileiras são beneficiárias do Sistema Geral de Preferências (SGP) dos EUA, o que garante tarifas reduzidas, mas outros, como o melão, sofrem com picos tarifários sazonais, com taxa de até 12,8% entre agosto e setembro, justamente no período de maior produção no Brasil. O setor brasileiro de frutas sofre com a elevada concorrência de países com os quais os norte-americanos possuem acordos de livre comércio, como o México e outras nações latino-americanas”, informa Pereira.

 

PRODUTOS ESPECÍFICOS

O documento da SRI/CNA indica, por exemplo, que café não torrado, não descafeinado, tem tarifa zero de importação. Já outros itens do grupo deste mesmo grão (preparações à base de extratos, essências e concentrados de café) vão de zero a 12,9%.

Segundo Pereira, essa variação tem um motivo: “A tarifa zero é dada pelos EUA a produtos que eles têm grande interesse em importar, como é o caso do café. A taxa para o produto processado do café é maior, porque o mercado norte-americano opta por processar, internamente, o café verde. Por isso, eles dificultam a entrada do nosso produto industrializado”.

Considerando os produtos exportados do complexo soja, o grupo apresenta uma análise de variação que vai de zero a 131,8% (no caso de “amendoins descascados, mesmo triturados”). A taxa do óleo de soja bruto também é muito alta (19,1%).

“Os EUA são o maior produtor mundial de soja e o Brasil é o segundo. Os norte-americanos possuem uma forte indústria processadora dessa oleaginosa para a fabricação de óleo. A alta tarifa para esse produto desestimula a importação”, analisa Pereira.

O especialista também avalia a variação da taxa de importação do milho brasileiro em território norte-americano, que vai de zero a 33,6% (no caso, o grupo de “preparações para alimentação de crianças acondicionadas para venda a retalho”).

“A participação brasileira no comércio mundial de milho é de 17,4%. Os Estados Unidos, apesar de serem grandes produtores, ainda importam quantidades significativas desse cereal. E o Brasil aproveita dessa oportunidade, respondendo por 23% das importações norte-americanas. Essa é uma participação expressiva e é possível, principalmente, porque a tarifa imposta a esse produto brasileiro é zero”, destaca Pereira.

 

HORA DE NEGOCIAR COM GOVERNO TRUMP

Levando em conta o atual governo do presidente norte-americano Donald Trump, apontado como excessivamente protecionista, fica a dúvida se será possível a celebração, no futuro, de um acordo de livre comércio entre Brasil e EUA.

Para o assessor de Inteligência Comercial da SRI/CNA, “apesar da retórica protecionista, em contraposição à negociação de acordos multilaterais, Trump já anunciou que negociações bilaterais farão parte de sua agenda”.

“Esse pode ser um momento oportuno para uma ofensiva brasileira. Além de possuir uma balança comercial equilibrada com os norte-americanos, o Brasil possui muitos investimentos nos EUA, que geram milhares de empregos. Sob essa perspectiva, a CNA defende maior aproximação entre os dois países, ampliando as complementariedades e trazendo novos benefícios para as economias e sociedades brasileira e norte-americana”, comenta Pereira.

Diretor da SNA, Marcio Sette Fortes também concorda: “O momento é propício para que o Brasil aproveite para se aproximar dos países que almejavam tornar-se sócios dos EUA, enquanto membros do TTP (Tratado do Transpacífico)”.

 

“O momento é propício para que o Brasil aproveite para se aproximar dos países que almejavam tornar-se sócios dos EUA, enquanto membros do TTP (Tratado do Transpacífico)”, salienta o diretor da SNA Marcio Sette Fortes, conselheiro do Funcex e da AEB. Foto: Arquivo SNA

“Mesmo com a saída dos Estados Unidos do TTP e o temporário fim desse bloco, mercados como o do milho devem ser priorizados. Já o mercado norte-americano, por seu turno, não vai se abrir em um passe de mágica”, alerta.

Na opinião de Fortes, “é preciso oferecer contrapartidas: a esfera negocial é complexa, mas existem, no Brasil, fatias apetitosas de mercados que interessam aos exportadores norte-americanos”.

Para download gratuito do documento “As Escaladas Tarifárias no Comércio do Agronegócio com os Estados Unidos”, acesse http://ow.ly/yhoa30b8J7I (link encurtado).

 

Por equipe SNA/RJ

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