Dia da Apicultura: abelhas têm papel estratégico na conservação da biodiversidade, aponta A Lavoura

No Dia da Apicultura, comemorado em 17 de outubro, a Revista A Lavoura divulga reportagem publicada na edição nº 712/2016.

Diminuição das populações de abelhas, assim como de muitas outras espécies de animais, tem sido registrada e causado preocupação pública crescente. Foto: Divulgação A Lavoura – Edição nº 712/2016

* Texto escrito por Ana Lucia Delgado Assad e Denise de Araújo Alves

Os polinizadores têm um papel crucial na conservação da biodiversidade. Quase 90% das plantas com flores são dependentes de animais para a transferência de grãos de pólen em quantidade suficiente para a fertilização dos óvulos e a consequente formação de frutos e sementes, permitindo sua multiplicação.

A maioria das pessoas pensa nas abelhas como insetos exclusivos da polinização, contudo, existem muitos outros que fazem parte desta cadeia, a exemplo de pássaros, morcegos, besouros, borboletas e mariposas. Das 115 culturas agrícolas que lideram a produção global, 70% se beneficiam da ação destes polinizadores, o que representa 35% do suprimento alimentar para a população humana.

O benefício é refletido na produção de frutos maiores, mais pesados e vistosos, com maior número de sementes, maior teor de nutrientes e valor de mercado mais elevado, o que se traduz em lucro direto para o agricultor.

No Brasil, cerca de 60% das culturas agrícolas de importância econômica – para alimentação humana, vestuário, pecuária, biocombustível – dependem, em algum grau, de polinizadores, que contribuem com quase 30% do valor anual da produção agrícola nacional.

Por sua relevância, vale se concentrar nas abelhas, que são elementos e elos importantes nas cadeias produtivas e reprodutivas mundiais. Formam um grupo numeroso de insetos, com cerca de 20 mil espécies descritas no mundo. O alto número de abelhas também reflete na diversidade de tamanhos, cores, preferências florais e locais para fazerem seus ninhos.

Ao contrário do que muitos pensam, a maior parte das abelhas é solitária. Isto significa que uma fêmea faz todas as tarefas: procura um local apropriado para fazer seu ninho, defendendo-o, busca material para construir as células de cria, coleta alimento para sua cria e, por fim, põe seus ovos no ninho.

SOCIEDADES AVANÇADAS

Entre as abelhas com sociedades avançadas, aquelas que formam colmeias, estão as conhecidas melíferas (abelha africanizada, africana, europeia) e as sem ferrão. Elas produzem o mel, a própolis, a cera, e também atuam diretamente na polinização de plantas, sejam elas de ambientes naturais ou interesse agrícola (frutas, legumes, fibras, castanhas). Enfim, prestam um importante serviço, cujo valor econômico é desconhecido para a grande maioria das pessoas.

No Brasil, são mais de 1.830 espécies identificadas, mas, com certeza, existe na natureza um número muito superior a este, distribuído nas florestas, pantanal, cerrados, caatinga, pampa, etc. Possuem diferentes tamanhos, cores e formas de organização – solitárias e sociais. Entre as abelhas sem ferrão (apenas no Brasil, são 240 espécies conhecidas), as mais comuns são a jataí, a uruçu, a mandaçaia.

A mais conhecida, entretanto, ainda é a Apis melífera (abelha africanizada), muito utilizada para a produção de mel, própolis, geleia real e para polinização dirigida. Ela não é nativa do Brasil. Trata-se de um híbrido das subespécies europeias (A. mellifera carnica, A. mellifera ligustica), introduzidas pelos jesuítas no século 19, com a subespécie africana (A. melífera scutellata), que entrou no país em 1956, com a finalidade de alavancar a apicultura nacional.

REDUÇÃO DA POPULAÇÃO

A diminuição das populações de abelhas, assim como de muitas outras espécies de animais, tem sido registrada e causado preocupação pública crescente. Várias discussões estão sendo divulgadas e muitos cientistas estão se dedicando a este assunto, apontando os principais fatores:

* A alteração da paisagem: fragmentação, degradação ambiental, perda de áreas naturais;

* A intensificação agrícola: extensas monoculturas, uso abusivo de agrotóxicos e de fertilizantes inorgânicos, redução de margens com flores nas plantações;

* A disseminação e a transmissão de parasitas e doenças, que podem ocorrer dentro da mesma espécie e, ainda mais preocupante, entre espécies diferentes;

* As mudanças climáticas causam incompatibilidades espaciais e temporais entre as abelhas e as plantas que fornecem seu alimento;

* A introdução de espécies em ambientes onde elas não ocorriam antes.

AÇÕES AMIGÁVEIS

Assim, muitos estudos apontam não se tratar de um evento único, mas de uma interação entre eles. Ao conhecer os impactos ambientais e econômicos da redução das abelhas, medidas de mitigação devem ser implantadas e estimuladas, a fim de garantir serviços de polinização sustentável em um planeta que está em constante e acelerada mudança.

Estas medidas precisam ser realizadas por toda a sociedade: cidadãos, produtores rurais, criadores de abelhas, cientistas, professores e políticos. São medidas simples, que tanto podem ser utilizadas no campo como nas cidades.

Ações como plantar flores e árvores nos jardins e praças do bairro e fazer a manutenção destes espaços urbanos são essenciais para fornecer continuamente alimentos para as abelhas.

Na área rural, um conjunto de ações é essencial para a conservação delas e de outros polinizadores promovendo melhorias nos serviços ecossistêmicos.

São elas:

* Conhecer e identificar as abelhas nativas e os locais que elas habitam nas propriedades rurais, como troncos, solos, barrancos, orifícios abandonados por outros insetos;

* Manter áreas naturais que abriguem o máximo possível uma diversidade de espécies de plantas, fornecendo uma variedade de alimentos aos insetos, e próximas às áreas de cultivos;

* Recuperar a vegetação nativa, utilizando plantas que atraiam e mantenham os polinizadores e criando mosaicos/áreas de refúgio;

* Cultivar plantas atrativas aos polinizadores próximas às lavouras e nos jardins, plantas estas que irão fornecer e enriquecer a oferta de alimentos às abelhas;

* Colocar e manejar os ninhos de abelhas perto das áreas de culturas que necessitam de polinização, melhorando a qualidade e rendimento da lavoura;

* Não aplicar defensivos agrícolas nos horários de visitas das abelhas aos cultivos. Para tanto, é importante conhecer o processo da polinização;

* Adotar práticas agrícolas amigáveis aos polinizadores, como minimizar o uso de inseticidas;

* Adotar sistema de manejo de solo que diminuam seu revolvimento, como plantio direto;

* Aumentar a oferta de alimentos aos polinizadores por meio do cultivo de plantas atrativas próximas às culturas e, principalmente, promover o diálogo contínuo entre os criadores de abelhas (apicultores e meliponicultores) e agricultores, em busca de práticas sustentáveis e de respeito à produção.

Os estudos e pesquisas sobre as abelhas e outros polinizadores não estão concluídos (considerando as informações publicadas na edição nº 712/2016 da Revista A Lavoura). Ainda há muito para se conhecer, mas todas as propostas indicadas acima visam melhorar e promover a conservação da biodiversidade dos polinizadores e os serviços ecossistêmicos associados que, além da polinização, incluem a ciclagem de nutrientes, a qualidade dos corpos d’água, a formação de solos, a decomposição de matéria orgânica, o controle biológico de pragas e a resistência a doenças e patógenos.

Muitas delas são ações que demoram a apresentar resultados e dependem da paisagem local, da variedade de culturas e de mudanças nas práticas agrícolas. No entanto, são essenciais para a manutenção dos polinizadores e produção de alimentos e da diversidade vegetal.

* Ana Lucia Delgado Assad é economista, doutora em Política Científica e Tecnológica pela Unicamp, diretora Executiva da Associação Brasileira de Estudos das Abelhas (A.B.E.L.H.A).

* Denise de Araújo Alves é bióloga, doutora em Ecologia pelo Instituto de Biociência da Universidade de São Paulo e pós-doutora da Universidade de São Paulo.

Fonte: Revista A Lavoura – Edição nº 712/2017

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