Cresce demanda por crédito para armazenagem

A supersafra brasileira de grãos na temporada 2016/17 fez acelerar novamente a tomada de crédito para armazenagem privada no país. Com orçamento inicial de R$ 1.4 bilhão para este ciclo, o Programa para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA), gerido pelo BNDES, recebeu uma complementação de R$ 600 milhões. Mas o banco de fomento já esgotou em março sua capacidade de empréstimo. Com isso, no mês passado, obteve do Tesouro Nacional o sinal verde para um adicional de R$ 100 milhões. E há indicações de que o orçamento já foi atingido.

“Os agentes financeiros já nos sinalizaram que a demanda está aquecida e que precisarão de mais (crédito)”, disse Tiago Peroba, gerente do departamento de relacionamento institucional e gestão de crédito rural do BNDES. “Estamos pleiteando mais dinheiro, em grande parte com o remanejado de outras linhas com demanda inferior à estimada inicialmente”. Segundo Peroba, foi a primeira vez que ocorreu uma suplementação de orçamento no PCA, programa criado na safra 2013/14.

O reaquecimento da procura por crédito para armazenagem vem na esteira da colheita recorde de grãos, o que tem elevado a demanda por financiamento também em outros programas agrícolas do banco de fomento, como o Moderfrota.

Ainda que haja um aumento da oferta de crédito no PCA, o montante ainda é bem inferior ao do ciclo 2015/16, quando havia R$ 2.4 bilhões disponíveis para empréstimos. Esse valor, aliás, já havia sido bem inferior aos R$ 4.5 bilhões disponibilizados na safra 2014/15. Os recuos refletem as medidas de contenção do déficit fiscal a partir de 2015.

A retomada da demanda por crédito para a construção de armazéns pode ser verificada comparando-se o número de operações aprovadas neste primeiro trimestre e no mesmo período de 2016 – 70 e 58, respectivamente. Em valores, foram aprovados R$ 132 milhões entre janeiro-março de 2016, contra R$ 162 milhões neste ano.

Os fabricantes de silos do país confirmam o aumento na procura. De acordo com José Viscardi, diretor comercial de armazenagem da GSI, controlada pelo grupo americano AGCO, no primeiro trimestre deste ano houve crescimento de 30% a 35% na demanda por silos na comparação com o mesmo período de 2016.

Embora haja uma procura maior no segmento, o déficit para armazenagem ainda é crítico e chega perto das 70 milhões de toneladas, estima a Conab. O número considera as safras de verão e inverno. O cenário é preocupante porque, com as projeções de safras abundantes de soja não só no Brasil, mas também nos Estados Unidos, as exportações brasileiras podem caminhar mais lentamente do que o inicialmente previsto. Com isso, pode faltar espaço para o milho safrinha, plantado sobre as áreas antes cultivadas com soja.

 

 

O desequilíbrio entre a produção de grãos e a capacidade de armazenagem no país é evidente. Nos últimos dez anos, a capacidade estática de armazenagem aumentou 27,7%, ao passo que a produção de grãos avançou 58,1% no mesmo intervalo, de acordo com a Conab. “O crescimento da armazenagem está sendo aritmético e a produção cresce em progressão geométrica”, disse Arlindo Moura, presidente da Terra Santa (antiga Vanguarda Agro), uma das maiores companhias de grãos e fibras do país.

Com o lançamento do PCA, na safra 2013/14, o governo tentou reduzir o déficit de armazenagem de grãos, mas a recessão e a descapitalização dos produtores frustraram os planos. “O PCA nasceu como uma grande esperança para o setor”, disse Olivier Colas, vice-presidente da Kepler Weber, líder no mercado brasileiro de armazenagem de grão. Com taxas de juros inicialmente bem atrativas, de 3,5% ao ano no Plano Safra 2013/14, o programa animou muitos agricultores a construírem novos armazéns, segundo ele.

“A nossa empresa aproveitou esse programa e elevou em cerca de 37% a capacidade de armazenagem”, disse Arlindo Moura, da Terra Santa. Com a crise econômica e financeira, o PCA perdeu sua força a partir de 2015. E, em 2016, o programa foi renovado por mais um ano, porém com menos recursos e taxas de juros bem mais altas, de 8,5% ao ano.

Como os novos investimentos não devem levar a um aumento expressivo de capacidade de armazenagem já nesta safra, o cenário é incerto, especialmente porque o ritmo de comercialização da soja no atual ciclo está mais lento. Os últimos dados do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea) mostram que, até o momento, foram vendidas 63,3% da safra estimada de 31 milhões de toneladas no estado – 7,5% abaixo do ciclo anterior.

No caso do milho, a situação é ainda mais preocupante. Foram vendidas 43% da previsão de produção de 26.5 milhões de toneladas no estado. A fatia é quase 40% inferior à de igual período de 2016. Os dados da comercialização no estado podem indicar que nesta temporada sobrará milho para fora dos silos, disse Endrigo Dalcin, presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT). “Em 2013, a gente teve milho a céu aberto, e tudo indica que teremos de novo”, disse.

Nas regiões Sudeste e Sul também poderá haver problema de estocagem. “É que nem cachorro buscando o rabo. A gente aumenta o estoque e os produtores aumentam a área”, disse Luiz Mariotto, gerente administrativo e financeiro da cooperativa paulista de Capão Bonito. Hoje, a cooperativa consegue armazenar no máximo 60 mil toneladas de grãos, o equivalente a 30% da necessidade dos cooperados.

A Cocamar, uma das maiores cooperativas do Paraná, com sede em Maringá, também prevê problemas para armazenar a produção da safra 2016/17. Os últimos investimentos que a cooperativa fez em armazéns foram em 2015. Em três anos, aumentou em 200 mil toneladas a sua capacidade estática, que hoje é de 1.2 milhão de toneladas. “Na toada que vai a comercialização desta safra, porém, seria preciso uma capacidade de ao menos 1.5 milhão de toneladas”, disse José Cícero Aderaldo, vice-presidente da Cocamar.

Enquanto os novos armazéns não se tornam realidade para atender à demanda, a expectativa é de que os silos-bolsa ganhem espaço, segundo produtores. “O problema é que muitos animais podem furam esses silos”, disse Arlindo Moura, da Terra Santa. Embora não seja ideal, esse tipo de armazenagem pode ser a salvação para muitos agricultores. “Para um período curto vai bem, mas não é uma solução de longo prazo”, disse.

 

Fonte: Valor Econômico

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