Carne suculenta, café amargo e cana aguada

Por Gustavo Porto/

O ministro da Agricultura, Blairo Maggi, reassumiu ontem o cargo após retornar do México, 11º país visitado por ele em menos de sete meses no cargo. Logo em sua primeira agenda oficial no Brasil, teve uma audiência com Arnaldo Manuel de Souza Machado Borges, presidente da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ). O encontro, emblemático, mostra que as carnes, principalmente a bovina, foram eleitas por Maggi como a prioridade em suas andanças pelo planeta.

A avaliação é que o ministro optou pelo assunto mais plausível para defender lá fora. Ao contrário da soja, açúcar, milho, café, fumo, celulose, suco de laranja e outros produtos agrícolas que dominam a pauta de exportação do agronegócio brasileiro, as carnes sofrem com barreiras comerciais sanitárias. A tentativa de derrubá-las cabe principalmente a Maggi, enquanto barreiras comerciais, como tarifas e taxas, são da alçada inicial dos ministros da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, Marcos Pereira, e das Relações Exteriores, José Serra.

Por isso, sem exceção, em todos os países visitados, Maggi propôs a abertura ou ampliação da compra de carnes como contrapartida aos pedidos de ampliação do comércio de produtos brasileiros e à transferência de tecnologia agropecuária nacional. A euforia pela carne trouxe, no entanto, alguns contratempos e até mesmo ciúmes de outros setores agrícolas alijados da pauta priorizada por Maggi no exterior.

Na semana passada, o Ministério da Agricultura chegou a anunciar, equivocadamente, que o mercado japonês seria aberto às exportações de carne bovina in natura brasileira. Quem conhece um pouco do setor saberia que um acordo desse porte não seria anunciado apenas pela imprensa mas, no mínimo, em uma visita oficial ou em um evento bilateral.

Nem mesmo uma correção divulgada no sábado foi suficiente para evitar a alta nas ações de frigoríficos na abertura dos mercados na segunda-feira. A euforia foi freada apenas após o secretário-executivo e ministro interino da Agricultura, Eumar Novacki, esclarecer ao Broadcast que o Brasil abriu o mercado para a carne in natura da raça japonesa wagyu e que, em troca, esperava a reabertura daquele país asiático à carne termoprocessada brasileira.

Conhecido pelas explosões de sinceridade em suas declarações, Maggi desagradou produtores de café e ainda o poderoso setor sucroenergético. Aos cafeicultores, defendeu o livre mercado e a importação do grão de outros países, um tabu no setor. Aos produtores de cana, açúcar e etanol criticou a estagnação da produtividade agrícola por décadas e, apesar da melhoria do rendimento industrial, afirmou que a cultura andou para trás no País em termos agronômicos. Disse, ainda, ser contra a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), classificada por ele como subsídio ao etanol.

Dois empresários de usinas e um líder setorial, que viajaram com Maggi ao Japão e à China, tentaram apaziguar os ânimos amargos e convidaram o ministro para uma visita a um centro de pesquisas de cana e uma unidade produtora de açúcar e etanol no interior paulista. Ele chegou a confirmar a ida, mas sua agenda externa cheia adiou a visita, que deve ficar apenas para 2017.

 

*Gustavo Porto é repórter do Broadcast do Estadão

Fonte: Broadcast Agro/Estadão

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp