Apesar dos entraves, produzir leite orgânico compensa

João Paulo Guimarães Soares, da Embrapa Cerrados: “Pesquisas indicam que a remuneração do capital, na produção orgânica, é de 5% ao ano, contra 2% no sistema convencional.”
João Paulo Guimarães Soares, da Embrapa Cerrados: ‘Pesquisas indicam que a remuneração do capital, na produção orgânica, é de 5% ao ano, contra 2% no sistema convencional.’

A produção de leite orgânico representa um grande potencial para o produtor, mas esbarra em dificuldades de comercialização e de adequação às normas de produção e certificação. Em 2012, o Brasil produziu 6,8 milhões de litros de leite orgânico, menos de 1% dos 33 bilhões de litros do produto convencional.

Segundo o pesquisador João Paulo Guimarães Soares, da Embrapa Cerrados, estudos revelam que os 240 produtores de leite orgânico do País produzem 6,8 milhões de litros/ano, obtidos de 2.070 vacas ordenhadas com produção de 3.313 litros/vaca/ano, média individual de 11 litros. “Levantamentos sobre a produção orgânica dão conta de que 60% dos animais são mestiços europeu x zebu e 40% zebu. A produção por vaca oscila ao redor de 9,2 kg/dia no período das chuvas, e 8,2 kg/dia na seca”, acrescenta.

De acordo com Soares, produzir leite orgânico no Brasil compensa. “Pesquisas indicam que a remuneração do capital, na produção orgânica, é de 5% ao ano, contra 2% no sistema convencional”, compara. “Mesmo considerando a redução da produtividade por vaca, o custo da mão-de-obra (47%) e o aumento de 50% no custo total do litro de leite, o valor do produto é de 50% a 70% acima do leite convencional”, calcula.

GARGALOS

De acordo com Soares, o consumidor moderno quer um produto de alta qualidade e seguro – portanto, livre de perigos biológicos, de produtos químicos, produzidos com menor uso de insumos artificiais, cuidados em relação ao bem-estar animal e sem degradar o meio ambiente. No entanto, ele aponta como principais entraves para produção a logística, a legislação e a comercialização, que ainda é feita, em pequena quantidade, em pequenos canais de varejo, como padarias, mini mercados, feiras-livres, lojas e cestas em domicílios, face às exigências de legislação sanitária, o que dificulta a colocação em um grande canal de varejo. “São poucos os projetos e iniciativas de sucesso, em grande escala, como os de cooperativas do oeste de Santa Catarina e do Triângulo Mineiro”, cita.

João Paulo Guimarães Soares, da Embrapa Cerrados: “Pesquisas indicam que a remuneração do capital, na produção orgânica, é de 5% ao ano, contra 2% no sistema convencional.”
João Paulo Guimarães Soares, da Embrapa Cerrados: ‘Pesquisas indicam que a remuneração do capital, na produção orgânica, é de 5% ao ano, contra 2% no sistema convencional.’

Outros problemas da atividade, na opinião de Soares, são a produção de forragem e grãos para a alimentação e o controle de ecto e endoparasitas sem a utilização de medicamentos químicos. “Soma-se a isso o pequeno tamanho das propriedades, a escassez de rações orgânicas para suplementação na estiagem, a pouca fertilidade do solo nas áreas de pastagens, a baixa utilização de tecnologias e os problemas climáticos.”

NORMAS DE PRODUÇÃO

Para conseguir a certificação do leite orgânico, o produtor deve seguir a Lei Federal 10831/2003 e Instrução Normativa 46 do Ministério da Agricultura (Mapa). A Lei de Orgânicos estabelece dois tipos de certificação: por auditoria (feita por uma empresa certificadora) e participativa (feita por grupos de produtores reunidos em associação que se inspecionam entre si). Nesse caso, depois de visitar as propriedades, um representante do Mapa credita os organismos participativos.

Em relação ao manejo sanitário, são obrigatórias as vacinas estabelecidas por lei e os exames para as doenças mais comuns em cada região. “Recomenda-se o uso de fitoterápicos e homeopatia”, diz o pesquisador. Ele acrescenta que, além de ureia, é proibido o uso de antibióticos, hormônios, aditivos promotores de crescimento, estimulante de apetite, alimentos obtidos de organismos geneticamente modificados e vacinas fabricadas com a tecnologia da transgenia.

“A maior parte da alimentação deve ser da própria propriedade e cerca de 80% da matéria seca consumida, de origem orgânica”, orienta. Nesse sentido, ele recomenda a formação de pastagens, capineiras, silagem e feno, produzidos, de preferência, com o consórcio de gramíneas e leguminosas, para a fixação de nitrogênio, e os sistemas silvipastoris, com associação de arbustos fixadores de nitrogênio (leguminosas), culturas agrícolas e pastagens”, indica. Além de calcário, para a correção da acidez dos solos, a orientação é para o uso de chorume e a compostagem.

Para a prevenção de ecto e endoparasitos, ele indica a rotação de pastagens e a utilização de compostos de ervas medicinais junto com a ração ou o sal mineral. “Além de manter esterqueiras cobertas e protegidas de moscas, o controle biológico tem apresentado bons resultados na prevenção de bernes e carrapatos”, comenta.

As normas de produção de leite orgânico também incluem a seleção e o melhoramento animal. No manejo reprodutivo, somente a monta natural e a inseminação artificial são permitidas. “É proibida a transferência de embriões e a fertilização in vitro”, avisa o pesquisador. Ele informa que a recomendação é para a utilização de zebuínos leiteiros e seus cruzamentos. “Além de menores exigências nutricionais, os zebuínos produzem bem em condições naturais, sem a utilização de antibióticos, promotores de crescimento e hormônios.”

Na opinião de Soares, os sistemas silvipastoris são os mais adequados para o manejo e o bem-estar animal no sistema orgânico. “Oferece sombra das árvores, melhora a fertilidade das pastagens, diversifica a renda do produtor com a combinação de culturas”. Ainda dentre as normas relacionadas ao bem-estar, ele cita instalações adequadas ao conforto e à saúde dos animais, com acesso facilitado à água, às pastagens e aos alimentos. “É proibido o confinamento total de indivíduos adultos e o isolamento e reclusão de animais jovens”, orienta.
Por equipe SNA/SP

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